sexta-feira, 10 de abril de 2020

ALEA JACTA EST


          Nesta Sexta-feira Santa de 2020, mais de 2 mil anos após a morte de Jesus Cristo na Cruz, o coronavirus parece não dar tréguas a esta Humanidade, assustada com a ameaça de morte e com a  desolação que as epidemias normalmente trazem aos homens e às sociedades por ele formadas. A esperança de um fim da tragédia, que nunca mais chega, conduz às previsões mais variadas e fantasistas sobre o futuro desta Humanidade, cuja vivência de séculos está posta em causa pela pandemia. Há quem vaticine o fim do mundo; há os que dizem que, passada a tempestade, tudo volta a ser igual; e há aqueles que, como eu, pensam que a sociedade em que nos habituamos a viver ficará transformada depois da passagem do coronavirus por este mundo. As profundas alterações que o combate à epidemia está a trazer à sociedade em que vivemos são já evidentes: o confinamento obrigatório em casa, o encerramento das escolas e de estabelecimentos comerciais, o uso da internet para trabalhar à distancia ou para comunicar com os outros, o permanente bombardeamento televisivo com as recentes estatisticas de contagiados e de falecidos em Portugal e no mundo inteiro por causa do virus maldito, as primeiras baixas sociais (aumento do desemprego, paragem abrupta da produção, adiamento sine die de espectáculos (nomeadamente do futebol, panaceia intelectual e razão de existir para muitos), redução geral de rendimentos, queda da produção e do preço do petróleo, aumento da volatilidade das bolsas de valores, abaixamento dos niveis de poluição (atmosférica, sonora e intrusiva), constatação da dificuldade em conter a epidemia, etc.etc. Tudo isto e muito mais está a trazer à sociedade um sinal inequivoco de que se está a formar um mundo novo à nossa volta, como quando surgiu a revolução industrial inglesa no seculo 19, a revolução francesa no seculo 18, ou a descoberta do antibiótico ou a vulgarização do uso da informática no seculo 20. A sorte está lançada (alea jacta est, como diziam os romanos), ou seja, há que consciencializar-nos para novos tempos, novas vontades, novos hábitos de vida e até novas prioridades e novas formas de estar no mundo (politicas, sociais, economicas e até financeiras) onde os velhos hábitos de vida (o famoso "take it for granted") estão a desaparecer.

          Nos E.U.A, Trump tem a reeleição garantida em Novembro próximo, desde que Bernie Sanders desistiu da nomeação democrática. Joe Bydon não está à sua altura. Não há que esperar do lado norte-americano, portanto, qualquer desvio à politica do "America first". Quando muito, Trump acabará com Maduro e com o regime cubano de vez, apoiará Bolsonaro e os militares brasileiros e continuará a chatear os mexicanos com o seu famoso muro.  A China, por seu turno, prosseguirá, com o agora eterno Xi, empenhada em ultrapassar a hegemonia norte-americana no mundo, o que está a  conseguir, devagar mas firmemente, como Confuncio ensinou. A crescente influência chinesa, não só na sua área de expansão geográfica natural, mas tambem em África e sobretudo na Europa, vai ser o paradigma do periodo pós-coronavirus (há mesmo quem defenda que a epidemia foi lançada propositadamente pelos chineses para isso mesmo), com as suas ajudas humanitárias cirurgicas, as suas compras de empresas estrangeiras em sectores chave e as suas alianças politicas estratégicas com países em dificuldades. A politica internacional unilateral conduzida pelos EUA dará lugar a uma nova corrida aos armamentos atómicos entre a China e os EUA, numa nova guerra fria de baixa intensidade, com os seus aliados ocasionais e as suas pequenas vitorias e derrotas circunstanciais. E a Europa? Na UE, o cada vez mais visivel desentendimento entre o norte e o sul do continente no que toca às politicas essenciais (que agora é patente) vai continuar até ver, sem solução definitiva à vista, para gáudio de chineses e de americanos.  Afastado o recurso aos eurobonds, com a compreensivel oposição da Alemanha e dos seus seguidores (ninguem quer pagar as dividas dos outros), as soluções que vierem a ser adoptadas serão sempre precárias e limitadas no tempo, empurrando a UE para um destino que ninguem quer, mas que, por este andar, será inevitável.  Os ingleses já viram isso (antecipadamente como sempre) e continuarão sozinhos na sua luta pela sobrevivência dum país que deu mundos ao mundo, espalhando uma civilização milenar que ainda hoje encanta muitos não britânicos.

          E em Portugal? Por cá as coisas são sempre ao ralenti. Eu diria mesmo que chegam sempre requentadas e a más horas. A epidemia foi "descoberta" já depois de instalada; ainda não se chegou a lado nenhum na sua defesa (apesar da colaboração da população em geral, amedrontada); as ameaças repetem-se (fala-se de novo em crise financeira e em resgate financeiro) e os indices de desenvolvimento estão em queda vertiginosa (desemprego galopante, descapitalização das PME, falências em barda, serviços fechados, comercio arruinado, turismo desaparecido, hospitais a rebentar pelas costuras, tribunais fechados, escolas sem alunos, farmacias e primeiros socorros entupidos, enfim, um pandemónio).  O PM Costa anda de Bruxelas para Lisboa e de Lisboa para Bruxelas, a falar aos microfones (como se dele tudo dependesse) como uma barata tonta, despejando sobre os incrédulos concidadãos mentirinhas piedosas sobre o fim da pandemia e a recuperação imediata do poder de compra perdido e a normalização duma situação que já morreu, abatida pelo coronavirus impiedoso que não olha a quem mata, nem a quem destrói os sonhos e o futuro. Numa recente entrevista dada a um jornal nacional, Catarina Martins, a inefável lider do estranhissimo partido esquerdista defensor de fantasias esotéricas, define (sem o saber) o dilema em que Costa se encontra: ou se junta ao PSD (que o tem vindo a namorar escandalosamente para isso) e teremos uma troika de novo em Portugal (desta vez a sério e com policia a vigiar) para evitar gastos excessivos com fantasias (aumentos retroactivos de salarios, aumento de funcionarios publicos, saude e ensino gratuito para todos, segurança social generalizada, abonos para toda a gente, mães, pais, avos, vagabundos e ladrões, etc etc.) a fim de conter a divida publica que não tem parado de subir; ou então apoio do BE no parlamento e no governo (é o que querem há anos, como agora tem a Espanha, que está a cair por aí abaixo) para fazerem nacionalizações de empresas falidas (TAP, Correios, Efacec, Novo Banco, etc etc) sem indemnizações (está claro), um aumento generalizado dos impostos (sobretudo do IRS e do IRC- os ricos que paguem a crise, como Marx dizia) e um controle governamental da banca (esses malandros que nos levaram o dinheiro da Troika em 2008, o qual estamos todos a pagar) para distribuir os lucros do negócio pelo povo faminto e desgraçado. Eis o dilema de Costa, segundo Catarina. O que fará Costa?

                    ALBINO  ZEFERINO                                                     10/4/2020