sábado, 26 de janeiro de 2013

O ACESSO AOS MERCADOS

A recente noticia de que a situação financeira do 
país já estaria em condições de nos proporcionar o recurso normal aos 
mercados financeiros dos quais temos estado afastados há quase dois 
anos na sequencia do pedido de ajuda financeira excepcional que o 
governo Sócrates se viu forçado a pedir em resultado da sua governação 
descuidada e laxista, trouxe aos espiritos lusitanos uma espécie de 
contrição (eu diria até de esperança) relativamente à actual 
governação. Afinal estes gajos (Relvas, Portas, Passos, Gaspar e 
quejandos) não são tão incompetentes como os jornalistas, comunistas e 
socialistas os pintavam, diz a malta em surdina. A ausencia de 
reacções por parte dos habituais denegridores governativos é 
sintomática da surpresa que o anuncio publico de tal façanha lhes 
causou. O próprio partido socialista não conseguiu esconder o 
rebentamento do furunculo que a noticia causou nas hostes cor de rosa, 
estando já anunciados congressos e moções de confiança partidárias 
para breve. Antecipa-se a entrada do vitorioso açoriano Carlos César 
nas lides continentais qual Cipião africano desejoso de unir os 
socialistas tal como o romano Julio César fez há dois mil anos. "Vene, 
vidi, vixit" sussurra-lhe o autarca Costa à espera da saída de Cavaco. 
Os tempos estão a mudar depressa. Tudo isto para significar que Passos 
e Portas ganharam a legislatura, mau grado a espectável derrota do PSD 
nas autárquicas. 
Mas a tal noticia justificará assim tanto alarido? 
A meu ver nem tanto. Sendo o acesso aos mercados um objectivo 
fundamental da politica financeira seguida até agora, não é nem por si 
só suficiente, nem por si só o objectivo único para a solução do grave 
problema estrutural que nos aflige. Há que assegurar que esse acesso 
aos mercados seja consistente (ou seja, uma regra e não uma excepção 
fruto de condicionalismos externos acidentais) e que seja acompanhado 
de uma reforma estrutural do Estado (a famosa refundação) que não 
permita novos sobressaltos como aquele que a recente crise provocou no 
nosso país. Ora para isso ainda falta muito. As privatizações das 
empresas publicas mais problemáticas (TAP, RTP; CGD, Águas de 
Portugal, empresas de transporte publico, etc.etc.), a reestruturação 
de sectores vitais para a economia nacional (função publica, 
tribunais, ensino publico, hospitais, etc.etc.), o desmantelamento de 
tabus constitucionais limitativos do desenvolvimento económico 
(legislação laboral, garantias constitucionais de efeito económico, 
reforma administrativa do país etc.etc.), erradicação dos factores 
favorecedores da corrupção através do fortalecimento dos reguladores 
económicos e da punição rápida e exemplar dos prevaricadores, 
alteração das mentalidades tacanhas no sentido duma maior abertura dos 
espiritos através de politicas culturais e educativas mais modernas e 
abertas e maior contacto entre os agentes portugueses e os seus 
congéneres europeus, são certamente sectores onde ainda há muito que 
fazer e onde os socialistas (unica alternativa viável de governo) 
devem ser chamados a colaborar em prol de um país melhor, mais moderno 
e mais digno. 
A receita parece ser simples. O doente é que se tem 
mostrado rebelde. Será que os médicos não encontrarão meios de curar o 
doente mesmo se ele, por ignorancia ou desatenção, julgar que não 
precisa de tantos remédios nem de tantos cuidados. Há que 
precaver-mo-nos disso. 

ALBINO ZEFERINO 
26/1/2013 

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

A ESTRATÉGIA DA ABELHA

Li esta semana no "Economist" que dos 10 países 
que se prevê registem no mundo maior subida do PNB em 2013, quatro são 
de língua portuguesa. Macau em 1º lugar, Angola em 5º, Timor-Leste em 
8º e Moçambique em 10º. Tirando Macau, todos os outros têm petróleo. 
Dir-se-á que a estratégia de aproximação áqueles "irmãos" passaria 
assim mais pela Galp do que pelo MNE. E tomara a Galp cumprir com as 
obrigações de exploração que se comprometeu no Tupi no Brasil, dirão 
os mais cépticos. A mim parece-me contudo que a coisa vai muito para 
além disso. Tratando-se de países em desenvolvimento acelerado, todos 
eles com necessidades básicas por satisfazer, competiria ao governo 
portugues lançar uma campanha activa de aproximação no sentido de 
estabelecer com as autoridades locais (na mesma lingua e seguindo 
procedimentos comuns a todos) protocolos e acordos de cooperação 
reforçada em todas as áreas onde a tecnologia e o know- how portugues 
fosse mais útil às respectivas populações do que as habituais 
encomendas de chave na mão próprias dos processos neocolonialistas 
europeus. 
Num momento em que Portugal atravessa a maior 
recessão vivida no século, onde o desemprego não cessa de aumentar 
(sobretudo nos jovens licenciados), as falências de empresas 
(sobretudo PME´s) não páram, os sacrificios pedidos aos portugueses a 
atingir o nível do insuportável, o que faz o AICEP e o MNE perante 
isto? Não seria de aproveitar esta abertura para criar grupos de 
trabalho interdisciplinares (onde coubessem produtores, distribuidores 
e vendedores de um lado e compradores, distribuidores e consumidores 
do outro) um por cada país visado, coordenados politicamente pelo MNE 
(através do AICEP) e com o apoio das respectivas embaixadas de 
Portugal (que teriam que ser reforçadas em conformidade) que pudessem 
fazer levantamentos concretos e quantificados das necessidades que os 
portugueses pudessem satisfazer nas depauperadas economias daqueles 
países, para depois se estabelecerem os protocolos de cooperação que 
formalizassem e cobrissem juridicamente o que ficasse negociado? Seria 
bom para eles que já nos conhecem e para nós que poderiamos escoar 
mais facilmente os nossos produtos. 
Dr. Portas deixe-se de politiquices caseiras e 
trate de pôr o seu ministério a trabalhar em prol do país e não em 
prol de si próprio e dos seus agentes. Fixe uma estratégia com os 
líderes desses países, articule com eles a melhor forma de cooperar, 
estabeleça os mecanismos para uma cooperação eficaz e produtiva e 
ponha essa malta a trabalhar para justificar o que recebe do orçamento 
do Estado, cada vez mais reduzido e esburacado. 

ALBINO ZEFERINO 
17/1/2013 

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

ESTAMOS METIDOS NUMA GRANDE ALHADA

Como diz Miguel Sousa Tavares na sua excelente 
crónica do "Expresso" deste fim de semana, "estamos metidos numa 
grandessíssima alhada!" Escreve o analista: "...se foi o Estado que 
pediu dinheiro emprestado porque gastava mais do que tinha, é o Estado 
que tem de cortar nas suas despesas e não a economia civil que tem de 
cortar nos seus rendimentos." E conclui que o Estado faz precisamente 
o contrário: corta nas pessoas e mantém o Estado despesista, enredado 
na teia dos interesses corporativos que na sua ânsia de manter 
privilégios ataca os mais fracos e desprotegidos que não têm 
capacidade de reacção, deixando imunes os fortes e influentes que 
podem derrubar os governos, rematando certeiramente que "...António 
José Seguro, tendo-se deixado de veleidades de "estadista", já só 
parece ter olhos para surfar o tsunami dos descontentes e substituir 
Pedro em S. Bento." Para fazer exactamente a mesma coisa que o outro 
faz, acrescentaria eu. Porque quem manda em Portugal são os nossos 
credores e não o governo. É rigorosamente indiferente para Merkel e 
para os outros quem esteja ao leme em Portugal. Comunagem é que não! 
Mas esses encarregam-se eles próprios de se auto-excluir. 
O relatório do FMI diz exactamente isto sem o 
dizer expressamente. A brutalidade e insensibilidade social (como 
agora se diz em Portugal) com que vem redigido traduz a natureza de 
ultimato do documento: " Ou fazem como aqui está ou acabou-se o 
dinheiro" parece vir lá escrito para quem leia o relatório com 
cuidado. E nós não nos podemos dar ao luxo de recusar empréstimos 
bonificados e certos, nem mesmo quando se diga (será lá para Setembro) 
que já estaremos em condições de regressar aos mercados. A 
volatilidade dos mercados e a instabilidade económica que ainda 
apresentaremos nessa altura não darão garantias a ninguem de que 
pagaremos pontual e integralmente os compromissos a que nos 
obrigarmos. Não teremos outro remédio senão prolongar o prazo de 
intervenção estrangeira nas condições que nessa altura os nossos 
credores julgarem adequadas. A vida é como é e não como gostariamos 
que fosse. 
Antevejo assim (como Sousa Tavares) um ano 
dificil e sacrificado. Até Março, data previsivel da acordão do TC 
dando razão ás duvidas do reformado Cavaco acerca da 
inconstitucionalidade das normas em análise, viveremos no mesmo limbo 
do ano passado. Portas diz, Relvas desdiz, Passos desfaz. A partir daí 
a batata quente cairá em cima do reformado presidente que convocará 
eleições antecipadas face á intransigencia de Portas em aceitar mais 
impostos para substituir as verbas retiradas do orçamento pela douta 
decisão dos juizes constitucionalistas. Aterrado em S.Bento depois de 
uma previsivel vitória socialista, Seguro vai apressar-se a renegociar 
a dívida e a prolongar o prazo do seu pagamento, conforme tem 
anunciado que o fará. Mais austeridade nos será exigida e mais 
soberania teremos que ceder. Mais tempo de intervenção e menos 
capacidade de manobra. Mais cedências e menos liberdade. Mais 
autoridade e menos democracia. "É a vida!" dirá o provável substituto 
de Cavaco em Belém. Já estamos acostumados, direi eu! 

ALBINO ZEFERINO 
15/1/2013 

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

AINDA O ORÇAMENTO GERAL DO ESTADO

Ratificado pelo chefe do Estado entrou em vigor há 
uma semana o orçamento de Estado para 2013. Apesar da violencia fiscal 
que reflecte e das reacções corporativas que suscita e que a imprensa 
livre fez ecoar estrepitosamente, muitas pessoas respiraram de alivio 
receosas de que um pedido presidencial ao Tribunal constitucional para 
uma apreciação preventiva da sua constitucionalidade causasse um 
terramoto na precária situação financeira em que vivemos. Cavaco 
porem, fazendo jus ao seu conhecido caráter salomónico, resolveu 
prudentemente solicitar ao tribunal uma apreciação constitucional 
sucessiva, não impedindo assim a entrada em vigor na data prevista do 
famigerado documento. Mas afinal porque razão o orçamento é causa de 
instabilidade politica quando deverá pelo contrário constituir um 
instrumento de trabalho governativo que assegure estabilidade à gestão 
da coisa publica? 
Em Portugal as coisas nunca são o que parecem e 
parecem sempre aquilo que não são. De instrumental o orçamento do 
Estado passou a ser um objecto essencial e substancial da governação 
em Portugal, como se sem ele o país parasse ou morresse de inanição. É 
através do orçamento que o governo define as suas opções estratégicas 
e marca o ritmo do desenvolvimento do país. Dá-se porem o caso de que 
Portugal está intervencionado e que é o programa da troika que define 
a acção governativa. O governo limita-se a dar (ou não) cumprimento às 
determinações troikianas sob pena de lhe ser cortado o fluxo 
financeiro necessário para pagar salários e fazer as despesas 
necessárias para a malta sobreviver (pagar subsidios, manter serviços 
publicos a funcionar ou pagar pensões). O orçamento serve em Portugal 
apenas para fixar o ritmo da execução das reformas exigidas pela 
troika. Tendo aderido ao tratado orçamental (com uma rapidez 
estonteante) o governo portugues já não precisa do orçamento para 
definir as suas opções. Até porque as opções já não são suas. Tem é 
que as executar, fingindo que negoceia, que cede, que transige ou 
altera em função das negociações que mantém com os sindicatos e com as 
oposições. De facto, o que o governo faz é tentar executar as reformas 
exigidas pela troika, sem grandes reacções nem obstáculos que 
perturbem o normal funcionamento das instituições. Tudo o resto é 
paisagem. 
Para que os portugueses (nem o seu governo) não se 
esqueçam do que ainda falta ser feito, o FMI publicou, já este ano de 
2013, o relatório sobre Portugal, onde afirma claramente a necessidade 
de diminuir as despesas publicas nos sectores mais gastadores do 
Estado: ensino (despedimento de professores em excesso, concentração 
de alunos e subida dos níveis de exigencia pedagógica, reorganização 
dos programas de ensino no sentido da poupança de recursos,etc.), 
funcionalismo publico (reorganização administrativa do Estado, redução 
drástica dos excedentários,abaixamento das retribuições, aumento do 
nível profissional dos seus agentes, etc.) e segurança social (redução 
dos beneficiários de apoio social, cortes nas pensões, racionalização 
dos beneficios sociais, etc.) entre outros. Não se pense que a 
recuperação do país pode ser feita de outro modo. Quem assim julga ou 
é mentiroso ou ignorante. 

ALBINO ZEFERINO 
10/1/2013