sexta-feira, 29 de junho de 2012

O ALBERGUE ESPANHOL


A preocupante situação da economia espanhola já começou a fazer moça na caminhada salvífica portuguesa. Pela primeira vez o governo Passos-Gaspar encontra-se em risco assumido de chegar ao final do ano com um défice superior aos 4,5% estimados como objectvo pela troika.  Antes de Rajoy ter levantado o véu que escondia o albergue em que as autonomias espanholas transformaram o país vizinho, verdadeiro tutor deste jardim à beira-mar plantado, ainda a Europa podia encarar Portugal como um bom exemplo para os outros na forma como obedientemente seguia os ditames da troika, mesmo fingindo reformar sem o fazer verdadeiramente. Agora já não mais será possivel continuar a fingir. O arrastamento da crise vai minando passo a passo quaisquer veleidades de verdadeira reforma do sistema europeu, deixando cada um entregue à sua triste sorte e nós entregues aos bichos.
                   Os ultimos numeros oficialmente publicados sobre a execução orçamental em Portugal mostram à evidência uma situação de completo falhanço na condução da politica económica. Com menos 3,5% do que o previsto de receita orçamentada, verifca-se o seguinte: Retracção no consumo ( - 2,8% no IVA); aumento das falências ( - 15,5% no IRC); baixa na circulação automóvel ( - 47,7% no imposto sobre venda de veiculos); diminuição da produção industrial ( - 8,4% no imposto sobre produtos petrolíferos); aumento do desemprego ( - 3,1% nas contribuições para a Segurança social). A continuar neste caminho, não será possivel ao governo apresentar no fim do ano um defice orçamental de 4,5% conforme negociado com a troika. Não existindo muito mais espaço para aumentar as receitas por via dos impostos, creio que não restará ao governo outra solução senão mudar de estratégia, renegociando com a troika novos objectivos e um prazo mais alargado para o seu cumprimento. Tratar-se-à de uma derrota em toda a linha com as teses defendidas pelo PS, que desde sempre tem vindo a insistir nesta necessidade e que determinará, no minimo, uma significativa remodelação governamental, sob pena de abertura de uma crise politica séria que levará necessariamente a novas eleições, empurrando Portugal para uma helenização do processo, que ninguem deseja e que há que evitar. 

                                                  ALBINO ZEFERINO                   29/6/2012

domingo, 24 de junho de 2012

OS RICOS QUE PAGUEM A CRISE


   Passado um ano do inicio da implementação do famoso plano de austeridade da troika (que nos tem permitido viver desde então) verifica-se que a sua execução não tem conseguido os resultados esperados. Apesar dos animadores resultados das avaliações periódicas a que a actividade governativa tem sido sujeita, o certo é que as receitas fiscais estão a cair e as despesas a crescer mais do que o previsto. Os numeros da execução orçamental divulgados esta semana não deixam duvidas quanto a isso: a receita fiscal caiu 3,5% nos primeiros cinco meses do ano, quando estava previsto que crescesse 2,8%. Se chegarmos ao fim do ano com a mesma performance dos primeiros cinco meses, o buraco na receita será de 2.170 milhões de euros.  Porque será isto? A explicação é simples: porque o governo não tem conseguido reduzir a despesa. 
                    Confrontado com as reacções dum povo que herdou a manha dos judeus e a vigarice dos mouros seus antepassados, o governo da troika tem sido constantemente toureado pelas organizações de classe e pela pieguice do povinho miserável que se arrasta nas vielas onde antes se cantava o fado. Já Pitágoras dizia nos seus teoremas: o abaixamento da actividade económica produz mais desemprego, que por sua vez determina maior despesa com o apoio social que implica. Comparado com 2011, o défice da Administração central e da Segurança social (sem contar com as autarquias e as regiões) aumentou mais de seis vezes, ou seja de 194,3 milhões para 1.237,6 milhões de euros.
                    Continuando a raciocinar segundo o filósofo, a solução está no aumento dos impostos. Como as receitas provenientes do IVA não crescem (apesar da taxa ter aumentado) resta aumentar o IRS. Mas como a maioria dos contribuintes fica de fora dos aumentos porque o governo não quer prejudicar os pobrezinhos (mesmo os que pagam IRS), resta aumentar a taxa do IRS para os que mais recebem, que cada vez são menos pois aos poucos e poucos passam de riquinhos a pobrezinhos. Os verdadeiros ricos já cá não têm nada, pois os países mais espertos e mais desafogados já se encarregaram de os seduzir com taxas de IRS e IRC mais baixas e eles transferiram para lá as suas fortunas. Suspeito que iremos todos de vitória em vitória até à derrota final. Como a selecção nacional de futebol.

                                                                ALBINO ZEFERINO                           24/6/2012

sábado, 23 de junho de 2012

A UNIÃO BANCÁRIA


 Tudo indica que a próxima etapa a caminho da plena intergração europeia será a união bancária da Europa. Mas o que é isto? Será que todos os bancos europeus se transformarão num só mega-banco? Eu não diria tanto. A débacle espanhola, que se manifestou sobretudo no sector bancário pelo excessivo crédito mal-parado que concedeu na área do imobiliário, vai forçar a União europeia a reforçar os mecanismos da supervisão aplicáveis aos bancos europeus, estabelecendo-lhes regras comuns de actuação e dando mais poderes de supervisão ao BCE. Á primeira vista parece tratar-se de uma medida sensata no sentido de travar a escalada dos juros em Espanha e na Itália, mas enquanto a acção do BCE não repousar numa verdadeira união politica receio que a sua supervisão sobre a banca europeia não passem de meras recomendações, facilmente ignoradas quando for invocado o interesse nacional por parte de um qualquer banco supervisionado. 
                    A subida vertiginosa dos juros da dívida espanhola deixa antever que só muito a custo a Espanha escapará a um regate europeu. Os pormenores da ajuda de 100 mil milhões de euros para a recapitalização da banca espanhola decidida há uma semana em Bruxelas não são ainda integralmente conhecidos. Estima-se que metade desse valor seja canalizado para sanear as cajas de ahorro que, à semelhança dos bancos, emprestaram descontroladamente durante anos a particulares e a empresas, sobretudo para financiamentos na área do imobiliário. A gestão das cajas de ahorro feitas pelas comunidades autónomas sem qualquer critério prudencial mas apenas movida por interesses politicos veio agravar decisivamente a divida espanhola, lançando o país para uma situação desesperada para saneamento da qual alguns analistas estimam ser necessário um minimo de 400 mil milhões de euros. O problema é que o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MME), que se estreia no próximo 1 de julho, só dispõe de 500 mil milhões para acorrer a todos os países em dificuldades. A escassez de dinheiro para acudir a outros países afecta tambem a Itália cujas necessidades de ajuda podem oscilar entre os 300 mil milhões e os 600 mil milhões de euros. Para Chipre, com um desiquilibrio estimado em 4 mil milhões de euros, o problema é a sua dependencia da Grécia.
                    Por enquanto o BCE continua a ser a unica entidade com poder para intervir e controlar a crise do euro. A sua acção é porem limitada. Limita-se a ceder liquidez aos bancos proporcionando uma baixa dos juros e comprando divida publica no mercado secundário. Sem possibilidade de mutualização das dividas dos Estados membros tornando-se credor de ultima instancia da UE, o BCE limitar-se-á a uma supervisão frouxa da actividade bancária europeia, sempre sujeita às contingencias politicas do momento em cada Estado membro e não afasta definitivamente, como seria desejável, o espectro da saída do euro que paira sobre a cabeça de alguns países europeus.

                                                              ALBINO ZEFERINO                     23/6/2012

segunda-feira, 18 de junho de 2012

AS TRES VELOCIDADES DA EUROPA


 Neste momento de viragem na construcção europeia que o eclodir desta persistente crise financeira, social e económica provocou, poder-se-á desde já antecipar a arquitectura que configurará a nova estrutura europeia, depois de ultrapassadas as vicissitudes presentes, elas mesmo origem desta histórica viragem. Começa já a ficar claro para muitos que os 17 países constitutivos da zona do euro configuram um grupo mais integrado do que os que recusaram a pertença a dita zona, podendo dizer-se que os dois grupos em questão progridem a velocidades diferentes no seio da União a que todos pertencem. Não será por acaso que a maioria dos antigos países constitutivos da zona EFTA (simples zona de livre câmbio) fazem parte deste segundo grupo que não aderiu ao euro. Portugal, antigo membro fundador da EFTA, desde que passou a integrar a União europeia, pautou o seu percurso europeu por uma persistente determinação em se colocar no chamado pelotão da  frente, aderindo por principio a tudo o que era novo na construcção europeia e só depois ponderando (quando ponderava) as vantagens dessa precipitação. Como quem quer provar que é capaz de tudo o que lhe é proporcionado apenas pelo facto de lhe ser facultado o acesso. Esta atitude poderá ser psicologicamente explicada pelos chamados 50 anos de isolamento internacional em que viveramos, numa busca de protagonismo internacional que a nossa dimensão como país não justificava. Mas foi assim que chegamos a Maastricht, a Shengen e por fim ao euro e por pouco ao TGV. Eclodida a crise, verificamos que há coisas às quais interessa aderir e outras às quais não interessa tanto.
                    A segunda divisão entre os países membros da UE só agora em plena crise e por causa dela se começa a revelar. Os países que até agora presumiam de igualdade entre si (embora essa manifestação fosse cada vez mais teórica do que prática) passaram a estar divididos entre os países com divida externa descontrolada e os que embora devedores não ameaçavam deixar de poder pagar as suas dividas. Os primeiros foram perdendo para os segundos o seu estatuto de igualdade na exacta medida em que demonstram capacidade (e vontade) para pagar o que devem. Nasceu assim mais uma linha divisória entre países membros da União que não coincide necessariamente com a pertença ou não à zona euro.
                    Temos assim uma Europa com dois grupos de países uns mais integrados do que outros (Shengen, euro, harmonização fiscal e orçamental, you name it) e uns mais organizados do que outros (com deficit orçamental controlado e dívida externa aceitável). Serão dois circulos concentricos. Há países dentro dos dois circulos. países dentro só de um e países fora dos dois. Onde se situará Portugal?

                                                         ALBINO ZEFERINO                              17/6/2012

OLHANDO PARA O UMBIGO


 Enquanto continuarmos a preocupar-nos exclusivamente com as nossas próprias dificuldades resultantes do enorme esforço que nos está a ser exigido pelo governo para cumprir com as determinações impostas no memorando de entendimento assinado com o FMI, a UE e o BCE, não conseguiremos sair da situação crítica em que nos encontramos. Há que entender, sem complexos nem recriminações, que gastamos dinheiro demais durante demasiado tempo e que agora não temos outro remédio que não seja arcar com as responsabilidades desse erro. Tentar fingir que não temos nada que ver com a situação desesperada que atravessamos, mas que, pelo contrário, fomos levados ao engano por aqueles que nos querem ajudar é ridículo, errado, enganoso e próprio de saloios mal-agradecidos, Não foram nem os alemães, nem os especuladores financeiros, nem os banqueiros ou o euro, quem votou em Sócrates e no PS, nem em Soares e sus muchachos, nem em Barroso e Santana ou em Cavaco e Guterres. Fomos nós, os portugueses que, através do voto livre e consciente, pusemos essa malta no poleiro, dando-lhes poder e meios de fazer as trafulhices e as prodigalidades que nos conduziram à triste situação em que nos encontramos. Assumamos as responsabilidades dos nossos erros e colaboremos na dificil tarefa de construir um novo Portugal, mais justo e portanto mais livre, mas ao mesmo tempo mais adulto e mais democrático. 
                    Não é preciso ser-se muito perspicaz para perceber que, sem a União europeia, Portugal não sairá da cepa torta (e mesmo com ela, veremos). É portanto nesse quadro que teremos que pensar e não, como as esquerdas (portuguesas, gregas ou outras) apregoam, exigindo áqueles que nos emprestam o dinheiro para vivermos, que sustentem os nossos vícios que insistimos em não abandonar, resistindo aos esforços reformadores do governo, cujo objectivo principal consiste em sanear as nossas finanças e reestruturar o país para que não voltemos a cair nos erros do passado. Portugal é a Olivença da Europa, como as ilhas gregas são as Berlengas europeias. Para Bruxelas e Berlim, Portugal ou a Grécia são tão importantes como Olivença ou as Berlengas são para Lisboa. Ao contrário do que muitos portugueses pensam, não será o resultado das eleições de amanhã na Grécia que vai determinar o fim do processo europeu ou até a morte do euro. A União europeia está em processo acelerado de integração (ler link deste blog a este respeito) e os espirros gregos ou portugueses não irão incomodar minimamente um trabalho de decadas feito com esforço e determinação, que tem propulsado a Europa, desfeita por duas guerras fratricidas, para níveis de desenvolvimento nunca dantes conhecidos.
                   Deixemos os cães ladrarem e ajudemos a conduzir paulatinamente a caravana da europeização a passar, nesta fase crucial do seu caminho. Não é olhando exclusivamente para o nosso umbigo, como quem faz contas às derrotas e aos empates da selecção nacional de futebol como se sem Portugal o "europeu" acabasse, que colaboramos neste esforço europeu de continuar a lutar por uma vida melhor para todos, portugueses e gregos, italianos e espanhois ou alemães e franceses.

                                                    ALBINO ZEFERINO                      16/6/2012    

terça-feira, 12 de junho de 2012

O INICIO DA COMUNITARIZAÇÃO BANCÁRIA EUROPEIA


    O pedido de ajuda financeira para a banca espanhola feito ontem pelo governo do país vizinho e concedido na hora pela UE foi o arranque para o processo da comunitarização bancária europeia. Ao emprestar através do MEEF o dinheiro necessário para a recapitalização dos bancos europeus falidos, a UE vai paulatinamente entrando no capital e na gestão de grande parte do sistema bancário europeu, começando naturalmente pelo dos países mais débeis e portanto em maiores dificuldades. O processo é simples. O MEEF financia-se junto dos grandes bancos  europeus (e não só) empresta aos Estados intervencionados a juros baixos (mais altos porém do que os que paga) que por sua vez empresta aos bancos em aflição a juros ainda mais altos. Como só muito dificilmente os bancos objecto desta ajuda terão capacidade para pagar estas dívidas, a médio prazo os bancos devedores cairão sob a alçada da UE, credor privilegiado.
                    Em Portugal a coisa começou com o empréstimo de 12 mil milhões (dos 78 mil totais do MoU) distribuidos pelo BPI, BCP, BANIF e algum outro, mas só com os 100 mil milhões para o Bankinter espanhol e para mais algumas Caixas autonómicas é que a coisa se desvendou. Falta agora a Itália e quanto à Grécia teremos que esperar pelo resultado das novas eleições do próximo dia 17 de junho. A Irlanda (que faz parte da zona anglo-saxónica da Europa, que inclui os EUA) já foi socorrida a tempo de fugir desta comunitarização bancária pró-germanica (há que tirar lições da Grande Guerra que devastou a Europa e o Mundo há menos de 70 anos). Uma vez dentro do saco comunitário torna-se mais fácil o saneamento dos bancos, seja através de fusões, seja de encerramentos, desde que obedeçam todos às mesmas regras.
                    A Europa a duas velocidades começa a tomar forma e já está a ficar clara a fronteira entre os países ou grupo de países pró e anti-germanicos. Os do euro terão que escolher entre permanecer na moeda única e ficar subordinados à Alemanha ou abandonar o euro e ficar entregues a si próprios. Ingleses e nórdicos têm como viver por si sós; os latinos já não. Precisam dos alemães (dos seus euros, das suas Auto-europas e dos seus Mercedes) para sobreviverem fingindo que são ricos dentro dos seus esquemas de vida sinuosos e subterraneos. Só que agora já não podem fazer o que querem, quando querem e como querem. Têm primeiro que perguntar aos alemães. Cèst lá vie, como dizia o outro. Paciencia, foi o que se poude arranjar. 

                                              ALBINO ZEFERINO                          11/6/2012   

domingo, 10 de junho de 2012

A SALVAÇÃO DA EUROPA


   Após quase quatro anos de hesitações, intransigências e desentendimentos, medidas tendentes a uma maior integração europeia parece que irão ser anunciadas na próxima cimeira europeia de 28 e 29 de junho, na intenção de dar um rumo certo e mais seguro à Europa comunitária e à sobrevivencia do seu euro. Não se pense porém que com isto tudo voltará ao mesmo como era dantes. Os tempos de profuso esbanjamento e de inconsciente dissipação financeira que caracterizaram o final do século passado e o principio deste, passarão definitivamente à história, dando lugar a um período longo e consistente de contenção financeira e orçamental, teleguiado a partir de Bruxelas e com aval alemão. A crise está para durar e a austeridade vai continuar.
                    Parece estarem em curso negociações que implicam mexidas nos tratados europeus com o objectivo de acelerar o processo de integração europeu e de tornar a UE mais federal, conduzidas por van Rompuy, Barroso, Draghi e Juncker. Estas notícias foram recebidas positivamente pelos mercados financeiros e fizeram Madrid respirar de alívio com a perspectiva de evitar a formalização de um pedido de ajuda financeira à Comissão, ao BCE e ao FMI, à semelhança do que portugueses, gregos e irlandeses foram forçados a fazer. Olli Rehn admite que o MEEF possa ser usado para a recapitalização da banca espanhola, sem necessidade de pedido formal prévio de ajuda internacional. Espanha não é definitivamente nem Portugal nem a Grécia. O banco Santander prevê a necessidade de 40 mil milhões de euros de financiamento à banca espanhola, mas fontes mais realistas falam de um buraco de 184 mil milhões de activos tóxicos, só em investimentos imobiliários.
                    As principais medidas que a UE poderá vir a adoptar passariam pela criação de uma união bancária, implicando a existencia de um fundo europeu de depósitos e de uma maior capacidade de vigilância e supervisão da Autoridade bancária europeia; pela criação de uma união orçamental que garantisse uma maior disciplina e evitasse os défices excessivos, reforçando os poderes do Tribunal europeu de Justiça; pela implementação de reformas estruturais de modo a criar um verdadeiro mercado interno europeu, harmonizando sistemas sociais e laborais; e finalmente pela criação de uma união política, que passaria pela eleição por sufrágio universal de um presidente europeu e de um superministro das Finanças com poderes de supervisão sobre os orçamentos nacionais.

                                                          ALBINO ZEFERINO                 9/6/2012

sexta-feira, 8 de junho de 2012

BALANÇO DE UM ANO DE GOVERNO INTERVENCIONADO


     Decorrido um ano desde que Portugal tem novo governo e vida nova, é altura para fazer um balanço da acção destes novos sacrificados à causa pública e aos seus intervencionados compatriotas. Para o efeito, parece oportuno começar por cotejar a acção de cada um dos inteligentes líderes com as tarefas que lhes couberam na extenuante tarefa da governação, à luz do que nestes tempos é o mais importante: o famoso plano de recuperação economico-financeiro, que nos tem permitido sobreviver nesta persistente borrasca que insiste em não nos abandonar. Vejamos então um por um dos espécimens:
                    VÍTOR GASPAR, ministro das Finanças, não tem poupado esforços na busca de encontrar forma de reduzir as despesas do Estado de forma a adaptá-las às receitas. Os resultados do seu trabalho não têm sido porém brilhantes, pois de buraco financeiro em buraco financeiro vamos descobrindo que afinal as despesas publicas não são assim tão facilmente descartáveis. A solução tem sido aumentar as receitas, o que fatalmente conduz a uma espiral recessiva da economia nacional e a um empobrecimento generalizado das gentes deste pobre país. A função publica não se reestrutura, o Estado não encolhe, os bancos continuam incontroláveis e a despesa publica não cede.
                    PAULO PORTAS, ministro dos Negócios Estrangeiros, tem feito pouco. Diria mesmo muito pouco. Numa pasta irrelevante para a tarefa da recuperação nacional (a derrota sofrida pelo ministro na tentativa de superintender na área das exportações retirou qualquer relevância à pasta) restava ao dinâmico político tentar aquilo que nenhum dos seus antecessores logrou conseguir: domesticar a irrequieta carreira diplomática e esmagar, qual lusa dama de ferro, a influencia comunista do sindicato do pessoal assalariado das embaixadas e dos consulados. Para isso bastaria despolitizar a carreira devolvendo-lhe a dignidade profissional e deixar cair a importancia que os seus demagogos antecessores deixaram que o sindicato conquistasse. Preferiu Portas dar-se a conhecer lá fora, olhando para o futuro incerto que tem pela frente. 
                   MIGUEL RELVAS, ministro adjunto do primeiro deles (que será o último desta análise) cheio de tarefas e de importancia que não tem conseguido justificar. Maçonaria, negócios escuros e incompetência têm travado as ambições deste político deslumbrado que se deixou enredar em trapalhices das quais dificilmente vai conseguir descolar, comprometendo o seu amigo Passos e  até o futuro do próprio governo. Daquilo que se esperava dele, nada fez: privatização da RTP, reforma das autarquias, reforma eleitoral e constitucional, são assuntos de tal forma sérios e importantes que só por si constituem um programa de governo. Foi, como disse Marcelo, um erro de casting.
                   ÁLVARO SANTOS PEREIRA, ministro da Economia, é um emigrante estrangeirado e tenta afanosamente justificar o lugar para o qual foi desafiado, embora a sua falta de jeito para a política seja evidente. As tarefas excessivas que o seu super-ministério envolve têm engolido os esforços honestos que o intrépido ministro tem desenvolvido. Algumas vitórias porém (concertação social, liberalização das leis do trabalho e pouco mais) não chegam para compensar os desaires governativos nas tentativas de desmantelamento das PPP e na luta inglória que o ministro tem travado contra os lobies corporativos instalados. A sua permanencia no governo poderá estar a prazo.
                   PAULA TEIXEIRA DA CRUZ, ministra da Justiça, é uma jurista medíocre e foi catapultada para as altas esferas do partido para preencher a quota feminina pela influencia do marido com quem estava casada na altura. Era previsivel a sua incapacidade para lidar com uma área tão sensivel da politica governativa. Perante a enormidade das tarefas reformadoras que a esperavam e a força desmesurada dos lobies que teve que enfrentar, ainda não conseguiu sequer definir o melhor caminho para iniciar as reformas estruturais que a justiça requer em Portugal. 
                   ASSUNÇÃO CRISTAS, ministra da Agricultura, Ambiente e outras coisas mais, apareceu do nada aureolada como uma nova messias descida dos céus centristas para salvar o partido e o país. Afinal é mais uma deslumbrada, preguiçosa e burocrata, que de concreto ainda nada fez. Anunciou uma reforma definitiva da anquilosada lei das rendas e, até hoje, nada;
prometeu animar a decadente agricultura portuguesa, renegociando ajudas comunitárias e tornando o país menos dependente dos outros e menos gastador e, até hoje, nada. Sem apoio da CAP e dos sindicatos comunistas do sector não vai a lado nenhum, nem ninguem em Bruxelas lhe liga alguma coisa. É mais um fogo fátuo made by Portas para animar a malta.
                   MIGUEL MACEDO, ministro da Administração Interna e dirigente do PSD, veio do Parlamento onde protagonizou uma oposição estruturada a Sócrates. Como ministro deixa porém muito a desejar numa pasta sensível. GNR, PSP e autarcas não gostam dele porque promete tudo e não faz nada. A discrição deixou de ser escudo para a incompetência.
                   NUNO CRATO, ministro da Educação, homem de esquerda dentro de um governo de direita. Teve o mérito de apaziguar o sector, abandonando temas fracturantes como a avaliação dos professores e as horas extraordinárias e fixando a atenção naquilo que mais sabe: pedagogia. Preparou uma reforma exequivel do curriculo escolar e chamou a si os professores. Tudo isto porem à custa do ensino superior e da investigação, que navegam à vista descontroladamente e com risco de encalhar na praia.
                   PAULO MACEDO, ministro da Saúde, é talvez o melhor de entre os seus colegas de governo e o melhor de entre os ministros da Saúde de todos os tempos. Naturalmente antipático e altivo, enfrentou pela primeira vez em mais de 30 anos dois dos mais poderosos lobies em Portugal: a associação nacional de farmácias e a ordem dos médicos. E agora começou uma inteligente reforma do sistema hospitalar. Isto tudo sem pôr em causa o sistema nacional de saude e a tradicional qualidade do serviço médico em Portugal. É obra. Trata-se de um ministro técnico com provas dadas na banca e nas Finanças (onde empreendeu uma reforma fiscal virtuosa) sem pretensões politicas ou sociais. É assim porque é; faz assim porque acha que deve ser assim e se o mandarem embora tambem não ficará chateado. Um bom exemplo para os politicos profissionais.
                   MOTA SOARES, o da Vespa, ministro da Segurança social, veio com áurea de especialista da área mas pouco mais tem feito do que gerir à vista o secto. Em abono da verdade deverá dizer-se que, com o afluxo de desempregados e o aumento dos reformados e dos beneficiários do RSI, pouco mais Mota Soares poderia ter feito. Eu iria um pouco mais longe. Com a fama que o precedeu era de esperar mais imaginação e drive na condução deste importante sector. Não é aumentando o gasto que se gere bem em período de contenção orçamental. Seria de esperar melhor de um soi disant expert dans la matiére.
                   AGUIAR BRANCO, ministro da Defesa num país indefeso, financeiramente, economicamente, socialmente e intelectualmente. Do grupo dos betos do Porto, Branco nada tem feito, embrulhado nos conceitos teóricos, na mafia militar e nos interesses imobiliários que as reformas das instalações militares suscitam. É o último da lista.
                   PASSOS COELHO, primeiro ministro jovem e prometedor. Bom comunicador, sabe vender com aparente seriedade os seus projectos reformadores. Contudo, a sua falta de sentido de coordenação não tem permitido ao governo arrancar com as indispensáveis reformas para fazer sair o país da modorra. O governo tem-se mostrado impotente perante a força adquirida pelas corporações de interesses instaladas.
                  Em conclusão, poderá dizer-se que o governo PSD-CDS tem cumprido modestamente a sua função para permitir, até agora, o fluxo regular das ajudas financeiras extraordinárias que o país vai recebendo para evitar uma completa bancarrota. Mas será suficiente para fazer sair Portugal da situação desesperada em que se encontra? Tenho duvidas.

                                                 ALBINO ZEFERINO                                                 7/6/2012

sexta-feira, 1 de junho de 2012

A ATRACÇÃO PARA O ABISMO


 Tal como o explorador viajante se sente constantemente atraído para o abismo nas suas aventurosas caminhadas pelas escarpas das montanhas que incessantemente percorre, os portugas lusitanos parece terem caído na mesma desdita no decurso do sinuoso caminho para onde os sucessivos desmandos governativos os conduziram. Não fazendo caso nenhum do exemplo grego, que por obra e graça do Espirito Santo os antecedeu na desgraça, os lusitos avançam inconsciente e determinadamente em direcção ao abismo que os atrai, sem fazerem qualquer ideia da pavorosa morte que os espera. Compreendia-se que, por azar ou inadvertencia, fossem levados ao caminho que os conduzirá inexorávelmente à desgraça se outros não os antecedessem nessa perigosa caminhada; mas olhando os gregos com desprezo e compaixão, como quem lastima a má sorte do vizinho congatulando-se secretamente por não estar no seu lugar, os portugas lusitanos seguem religiosamente os helénicos passos, atraídos por uma inelutável atracção só explicável pela miopia que obnubila os seus espíritos e tolhe as suas mentes.
                    As recentes desventuras do ministro deslumbrado aliadas aos sucessivos buracos financeiros deixados em herança pelos amigos xuxas afastam cada vez mais decisivamente os lusos portugas da politiquice para onde esta democracite abrileira conduziu o país, abrindo portas para uma viragem à grega no panorama partidário lusitano, impedindo assim (tal como na Grécia) qualquer solução de compromisso que possa ajudar quem quer ajudar a pobre Lusitania a levantar-se do chão. A cada vez mais evidente coligação de interesses entre o PS e o PSD, mau-grado os arrufos que as respectivas direcções partidárias teatrealizam para a galeria popular especada perante tanta pouca-vergonha, está minando quaisquer veleidades de compromisso sério a que os portugas precisam de chegar para continuarem a beneficiar da indispensável ajuda externa para sobreviverem. Aproveitando-se desta confusão, os partidos da extrema esquerda começam a reagir inscrevendo nas paredes das ruas dizeres ofensivos contra a presença da troika (como se de desabafos populares expontaneos se tratassem) tentando atrair a atenção dos pobres lusos sofredores e ignorantes para a eventualidade de eleições antecipadas. O exemplo do Sirysa (partido irmão na Grécia do lusitano Bloco de Esquerda) que multiplicou por 3 os votos recebidos nas ultimas eleições legislativas (consequencia do descontentamento popular com a acção dos chamados partidos do arco governativo, o PASOK- irmão do PS lusitano e a Nova Democracia - irmão do PSD lusitano) e destroçando qualquer hipótese de formação de um governo sério em condições de continuar a negociação permanente com a troika, está a criar expectativas nas cabecinhas bloquistas (cuja direcção já se prepara para mudanças nesse sentido) de que estará para breve uma tomada do poder em Portugal.
                   Não deixemos que nos tomem por parvos, antes reagindo com determinação e vontade de vencer a esta atracção para o abismo mostrando de uma vez por todas aos nossos credores de que somos capazes de pagar as nossas dívidas e de honrar os nossos compromissos, afastando estas tentações diabólicas dos nossos espíritos e continuando firmes e rectos no caminho da recuperação económica e financeira com a ajuda daqueles que nos querem ajudar e repudiando os que apenas se querem governar a si próprios e aos seus amigos. Doa a quem doer.

PS. - Já oiço falar em confisco do ouro portugues como garantia do pagamento das nossas dívidas. Porque não substituir esta garantia com avales pessoais daqueles que enriqueceram de repente depois de terem sido importantes. E eles são tantos!

                                                   ALBINO ZEFERINO                      1/6/2012