sexta-feira, 10 de abril de 2020

ALEA JACTA EST


          Nesta Sexta-feira Santa de 2020, mais de 2 mil anos após a morte de Jesus Cristo na Cruz, o coronavirus parece não dar tréguas a esta Humanidade, assustada com a ameaça de morte e com a  desolação que as epidemias normalmente trazem aos homens e às sociedades por ele formadas. A esperança de um fim da tragédia, que nunca mais chega, conduz às previsões mais variadas e fantasistas sobre o futuro desta Humanidade, cuja vivência de séculos está posta em causa pela pandemia. Há quem vaticine o fim do mundo; há os que dizem que, passada a tempestade, tudo volta a ser igual; e há aqueles que, como eu, pensam que a sociedade em que nos habituamos a viver ficará transformada depois da passagem do coronavirus por este mundo. As profundas alterações que o combate à epidemia está a trazer à sociedade em que vivemos são já evidentes: o confinamento obrigatório em casa, o encerramento das escolas e de estabelecimentos comerciais, o uso da internet para trabalhar à distancia ou para comunicar com os outros, o permanente bombardeamento televisivo com as recentes estatisticas de contagiados e de falecidos em Portugal e no mundo inteiro por causa do virus maldito, as primeiras baixas sociais (aumento do desemprego, paragem abrupta da produção, adiamento sine die de espectáculos (nomeadamente do futebol, panaceia intelectual e razão de existir para muitos), redução geral de rendimentos, queda da produção e do preço do petróleo, aumento da volatilidade das bolsas de valores, abaixamento dos niveis de poluição (atmosférica, sonora e intrusiva), constatação da dificuldade em conter a epidemia, etc.etc. Tudo isto e muito mais está a trazer à sociedade um sinal inequivoco de que se está a formar um mundo novo à nossa volta, como quando surgiu a revolução industrial inglesa no seculo 19, a revolução francesa no seculo 18, ou a descoberta do antibiótico ou a vulgarização do uso da informática no seculo 20. A sorte está lançada (alea jacta est, como diziam os romanos), ou seja, há que consciencializar-nos para novos tempos, novas vontades, novos hábitos de vida e até novas prioridades e novas formas de estar no mundo (politicas, sociais, economicas e até financeiras) onde os velhos hábitos de vida (o famoso "take it for granted") estão a desaparecer.

          Nos E.U.A, Trump tem a reeleição garantida em Novembro próximo, desde que Bernie Sanders desistiu da nomeação democrática. Joe Bydon não está à sua altura. Não há que esperar do lado norte-americano, portanto, qualquer desvio à politica do "America first". Quando muito, Trump acabará com Maduro e com o regime cubano de vez, apoiará Bolsonaro e os militares brasileiros e continuará a chatear os mexicanos com o seu famoso muro.  A China, por seu turno, prosseguirá, com o agora eterno Xi, empenhada em ultrapassar a hegemonia norte-americana no mundo, o que está a  conseguir, devagar mas firmemente, como Confuncio ensinou. A crescente influência chinesa, não só na sua área de expansão geográfica natural, mas tambem em África e sobretudo na Europa, vai ser o paradigma do periodo pós-coronavirus (há mesmo quem defenda que a epidemia foi lançada propositadamente pelos chineses para isso mesmo), com as suas ajudas humanitárias cirurgicas, as suas compras de empresas estrangeiras em sectores chave e as suas alianças politicas estratégicas com países em dificuldades. A politica internacional unilateral conduzida pelos EUA dará lugar a uma nova corrida aos armamentos atómicos entre a China e os EUA, numa nova guerra fria de baixa intensidade, com os seus aliados ocasionais e as suas pequenas vitorias e derrotas circunstanciais. E a Europa? Na UE, o cada vez mais visivel desentendimento entre o norte e o sul do continente no que toca às politicas essenciais (que agora é patente) vai continuar até ver, sem solução definitiva à vista, para gáudio de chineses e de americanos.  Afastado o recurso aos eurobonds, com a compreensivel oposição da Alemanha e dos seus seguidores (ninguem quer pagar as dividas dos outros), as soluções que vierem a ser adoptadas serão sempre precárias e limitadas no tempo, empurrando a UE para um destino que ninguem quer, mas que, por este andar, será inevitável.  Os ingleses já viram isso (antecipadamente como sempre) e continuarão sozinhos na sua luta pela sobrevivência dum país que deu mundos ao mundo, espalhando uma civilização milenar que ainda hoje encanta muitos não britânicos.

          E em Portugal? Por cá as coisas são sempre ao ralenti. Eu diria mesmo que chegam sempre requentadas e a más horas. A epidemia foi "descoberta" já depois de instalada; ainda não se chegou a lado nenhum na sua defesa (apesar da colaboração da população em geral, amedrontada); as ameaças repetem-se (fala-se de novo em crise financeira e em resgate financeiro) e os indices de desenvolvimento estão em queda vertiginosa (desemprego galopante, descapitalização das PME, falências em barda, serviços fechados, comercio arruinado, turismo desaparecido, hospitais a rebentar pelas costuras, tribunais fechados, escolas sem alunos, farmacias e primeiros socorros entupidos, enfim, um pandemónio).  O PM Costa anda de Bruxelas para Lisboa e de Lisboa para Bruxelas, a falar aos microfones (como se dele tudo dependesse) como uma barata tonta, despejando sobre os incrédulos concidadãos mentirinhas piedosas sobre o fim da pandemia e a recuperação imediata do poder de compra perdido e a normalização duma situação que já morreu, abatida pelo coronavirus impiedoso que não olha a quem mata, nem a quem destrói os sonhos e o futuro. Numa recente entrevista dada a um jornal nacional, Catarina Martins, a inefável lider do estranhissimo partido esquerdista defensor de fantasias esotéricas, define (sem o saber) o dilema em que Costa se encontra: ou se junta ao PSD (que o tem vindo a namorar escandalosamente para isso) e teremos uma troika de novo em Portugal (desta vez a sério e com policia a vigiar) para evitar gastos excessivos com fantasias (aumentos retroactivos de salarios, aumento de funcionarios publicos, saude e ensino gratuito para todos, segurança social generalizada, abonos para toda a gente, mães, pais, avos, vagabundos e ladrões, etc etc.) a fim de conter a divida publica que não tem parado de subir; ou então apoio do BE no parlamento e no governo (é o que querem há anos, como agora tem a Espanha, que está a cair por aí abaixo) para fazerem nacionalizações de empresas falidas (TAP, Correios, Efacec, Novo Banco, etc etc) sem indemnizações (está claro), um aumento generalizado dos impostos (sobretudo do IRS e do IRC- os ricos que paguem a crise, como Marx dizia) e um controle governamental da banca (esses malandros que nos levaram o dinheiro da Troika em 2008, o qual estamos todos a pagar) para distribuir os lucros do negócio pelo povo faminto e desgraçado. Eis o dilema de Costa, segundo Catarina. O que fará Costa?

                    ALBINO  ZEFERINO                                                     10/4/2020

domingo, 29 de março de 2020

A DESUNIÃO EUROPEIA


          Desde a chegada do coronavirus à Europa, vindo voluntária ou casualmente da China, conforme o cinismo das interpretações que por aí correm, que o futuro do velho continente como entidade organizada está em risco. A muito propalada solidariedade entre os países europeus, onde a UE assenta os seus próprios fundamentos, tem vindo cada vez mais a ser posta em causa à medida que a pandemia avança, indiferente às tentativas de controle efectivo dos efeitos fatais da doença e dos crescentes estragos que está a causar nas economias do continente e do mundo civilizado.
          Efectivamente, segundo as conclusões do próprio Instituto Gatestone da UE, os estados membros da UE estão instintivamente a regressar à defesa isolada dos respectivos interesses nacionais, no seu combate à epidemia que grassa indistintamente entre eles, em vez de adoptarem estratégias comuns de defesa, como era expectável, face a uma ameaça desta dimensão e profundidade ao continente como um todo. Em semanas recentes, os EM fecharam as suas fronteiras, proibiram as exportações de bens essenciais e suspenderam as ajudas humanitárias, num exercicio inimaginável de egoismo e de pânico incontrolável, face a uma ameaça concreta, iminente e incontrolável, às vidas e aos bens dos seus cidadãos.  O BCE, garante da moeda europeia, tem tratado com inimaginável desdém a terceira maior economia europeia - a Itália - neste singular combate pela vida, e os países mais afectados pela pandemia - a Itália e a Espanha - foram deixados à sua sorte pelos outros EM.  A UE, sete décadas passadas desde a sua criação, ficou paralizada em poucas semanas e em fase de desmembramento iminente, face a este insidioso ataque que a todos aterroriza.
          Enquanto a pandemia alastra pela Europa toda - onde mais de 250 mil pessoas foram, até agora, diagnosticadas como infectadas pelo virus e 15 mil já morreram - os pilares fundamentais constitutivos da União Europeia estão-se desmoronando um por um.  Após criticar durante anos a politica do "America First" do presidente norte-americano Trump, os lideres europeus estão voltando ao nacionalismo de outrora, que tanto verberaram.  O unico soft-power que a UE possuia - a solidariedade multilateral - verificou-se ser uma ficção vazia de conteúdo, face às atitudes nacionalistas demonstradas pelos dirigentes europeus nos ultimos dias. Não existe uma resposta coordenada à crise por parte da UE e as suas recomendações caem em saco roto, face à generalizada crise de confiança instalada nos diversos países europeus.  Num recente artigo publicado na revista alemã " Der Spiegel" lê-se: "Enquanto a pandemia toma conta da Europa, a união velha de décadas mostra a sua fraqueza. Enquanto conseguiu sobreviver ao Brexit e à crise do euro, a crise do coronavirus está transformar-se num desfio insuperável para a UE."
          Como vai ser então agora? Ninguem sabe, mas pode-se especular. Eu diria assim que, passada a pandemia, entraremos todos verdadeiramente no seculo 21, em termos de vida nova, tal como os nossos avós entraram no século 20, só após a Grande Guerra de 1918.  Finda a tragédia, com os estragos em vidas humanas e nas economias contabilizados, o que restar da UE - as instituições, os estados, os governos, as sociedades - terá pela frente a maior e mais extensa e profunda crise económica, social e financeira jamais vivida pelas gerações de hoje. A Europa, como continente velho e civilizado, estará como estava em 1945.  Com fome, desemprego, desorganização social e politica, falta de bens de consumo, produtividades baixissimas, hábitos ancestrais e ideologicamente contaminados, etc etc.  Dos países saídos das várias levas da pandemia, verificar-se-á que uns ficaram menos afectados do que outros.  A divisão entre o norte e o sul dos vários EM acentuar-se-à cada vez mais, em função do nivel das dividas publicas de cada estado. Os estados endividados do sul continuarão empenhados em que o BCE seja autorizado a emitir os famosos euro-bons, para que as suas dividas possam ser financiadas pelos outros estados menos endividados, na senda duma lamuria que se arrasta desde o principio da crise financeira. Os governos dos países do sul (sejam eles quais forem) continuarão a esgrimir os argumentos requentados da solidariedade europeia que usavam antes, embora sem o mesmo ênfase do principio. Os países do norte da Europa, mais ricos, menos endividados, mais organizados e mais produtivos (com maior I&D) continuarão, pelo seu lado, a desprezar arrogantemente esses argumentos, afirmando que quem quer dinheiro, tem que trabalhar mais e melhor. Daqui a concluirem que o euro é uma moeda apenas para os países produtores e com capacidade exportadora é um pulo. A emissão de euro-bonds faria cair o valor do euro e desvalorizaria a produção nacional dos países mais ricos do norte da Europa.
          Chegados a este ponto, os EM do norte da zona euro, criariam formalmente dois grupos de países dentro da UE: o grupo dos países desenvolvidos, produtores de bens exportáveis e portanto criadores de riqueza e fazedores de leis para todos, que continuariam a usar o euro como divisa comum, e o outro grupo dos países, altamente devedores, improdutivos, inadaptados aos novos tempos pós-epidemia, incultos, recalcitrantes e, em suma, atrasados civilizacionamente, que trabalhariam para os outros e usariam moedas locais para comerciarem entre si.  Do primeiro grupo fariam parte a Alemanha, a França, a Dinamarca, a Holanda, os países nordicos e a Noruega, a Suiça e a Austria; o segundo grupo seria composto pela Itália, pela Espanha e por Portugal, pelos países do antigo Leste europeu e pela Grécia.
          Deste modo, a UE deixaria de ser uma união igualitária de estados economica e socialmente desenvolvidos e seguidores de politicas comuns europeias baseadas nos mesmos principios e valores da solidariedade social, da competitividade economica e da igualdade institucional, para se tornar num grupo heterógeneo de estados politico-institucionais, uns mais importantes do que outros, em que as relações entre eles se pautariam por situações de dependência economica ou mesmo politica,  de subordinação às vontades e interesses de uns em desfavor de outros, como acontecia no seculo 19 no Império austro-hungaro, ou mesmo no tempo do Império romano, onde havia os estados romanos, os protectorados e as colónias, ou até quando a Irlanda era colónia da Grã-Bretanha.
          Receio que, se porventura não vier a ser exactamente assim, a nova construção europeia possa vir a ser muito parecida com isto.

                      ALBINO  ZEFERINO                                                         29/3/2020
       
       

domingo, 22 de março de 2020

ESTE MUNDO NÃO É PARA VELHOS


          À medida que os dias passam e a informação flui, podem começar já a detectar-se alguns elementos de facto que caracterizam esta feroz pandemia que nos assola. O primeiro dos quais, talvez mesmo o elemento essencial da nova peste, é que a doença ataca mais os velhos do que os novos. As defesas orgânicas dos mais velhos estão diminuidas (tal como a generalidade dos seus sistemas orgânicos, como seja, a sua capacidade respiratória, a sua atenção, a sua visão, o seu ouvido, etc.), em suma, a sua energia vital não é a mesma do que quando eram mais novos. Deste modo, o virus ataca os velhos mais forte e mais intensamente do que ataca os mais novos (os que estão como se diz "na força da vida"). Parece mesmo que nos mais novos o virus entra e sai do seu corpo quase sem eles darem por isso, enquanto que nos mais velhos ele entra insidiosa e subrepticiamente sem cerimónias nem pré-aviso e aloja-se no corpo deles sem que haja maneira de o expulsar, até que o corpo do velho pára de viver. A descrição do fenómeno é tão brutal quanto a evidência dos numeros conhecidos de mortes pelo novo e desconhecido coronavirus parece mostrar.
          Este facto já conhecido, leva os mais preocupados com o trágico fenómeno, a traçarem estratégias de erradicação da epidemia (na falta de vacinas salvadoras, que tardam) que fundamentalmente se podem dividir em duas: uma é a do combate (quase bélico) travado nos hospitais contra a doença (que não tem conseguido suster a sua disseminação geral, à excepção, parece que, da China), acompanhada duma quarentena forçada dos ainda não contaminados, que (apesar de, até agora, ter sido bem recebida pelas populações assustadas) só poderá produzir resultados úteis, se for aplicada com determinação por uma força publica eficaz, o que a democracia não permite (fecho militarizado das fronteiras terrestres, aéreas e maritimas) e por um confinamento obrigatório nas residencias ou nos locais de trabalho de toda a gente, sem excepção.
          Dado que esta estratégia não tem conseguido resultados palpáveis até agora (bem pelo contrário, o numero de infectados e de mortos não cessa de aumentar), surgiu uma nova estratégia que se traduz no confinamento obrigatório dos velhos acima dos 70 anos (os mais vulneráveis ao contágio e portanto os mais atingidos pela morte, porque menos resistentes aos anti-virus conhecidos), deixando a restante população ser infectada pelo virus, com uma taxa de mortes previsivel e controlável. Deste modo, a epidemia seria erradicada a prazo, logo que 60 ou 70 por cento da população tivesse sido infectada e curada (e portanto tendo ficado imune ao virus).
          Esta solução (aparentemente sedutora) não oferece a meu ver garantias de sucesso, uma vez que é por enquanto desconhecida a reacção do virus (que é mutável e insidioso) a um contágio generalizado e tambem me parece dificil (se não impossivel) conter sem oposição todos os velhos a esse confinamento obrigatório efectivo e absoluto.
          Em conclusão, poderá dizer-se que, sem velhotes, a coisa teria mais hipóteses de ser debelada, deixando o virus à solta e assumindo matematicamente a perda de X % de mortos para que Y % da população possa sobreviver. Dilema preverso!


                    ALBINO  ZEFERINO                                                      22/3/2020

sábado, 21 de março de 2020

O CORONAVIRUS E O FUTURO


          A violencia com que esta epidemia está a atacar o mundo e as subitas alterações à vida das pessoas que tem provocado, leva-me a pensar que, quanto mais tempo demorar o combate à sua contenção, mais este flagelo será a origem duma profunda transformação dos velhos hábitos e costumes próprios da nossa forma de viver. Senão vejamos!
          As determinações governamentais para a contenção da disseminação do virus no mundo inteiro (umas mais profundas, outra mais céleres e outras ainda, mais certeiras do que as outras) vão todas no mesmo sentido: isolamento dos infectados, quarentena dos mais vulneráveis, tratamento dos mais doentes, enterro dos mortos, fecho de escolas, proibição de aglomerações e sobretudo elaboração de estatisticas comparativas do avanço da epidemia nos diversos países e regiões, como se estivessemos numa partida de futebol, a ver quem mete mais golos. Sobre o grau de avanços cientificos na descoberta da vacina salvadora? Nada! Sobre o esforço do investimento na investigação cientifica nesta área? Nada! Sobre as expectativas da evolução da tragédia? Tambem nada! Só palpites. Talvez esteja dominada dentro de dois ou tres meses; Talvez acabe expontâneamente; Talvez apareça, por milagre, uma vacina salvadora; Há até uns curiosos que estão a alertar a malta para o surgimento duma nova vaga do virus até ao final do ano. Credo! Pois se ainda não foi atingido o pico desta!
           Para desviar as atenções, as preocupações vão agora no sentido da preservação das democracias, dos empregos para a vida, das poupanças individuais, dos negócios de vão de escada, dos privilégios politicos, do salvamento do mundo através do ambiente, enfim, da preservação do status quo que o coronavirus está a pôr em causa. Esta gente ainda não percebeu que esta pandemia está a mudar o mundo! O previsor de catástrofes Roubini prevê que a Europa poderá sair mais forte desta crise, ou então ficar devastada. Este não faz por menos: ou ganhamos todos, ou perdemos todos!
          A meu ver, o mundo continuará com os seus problemas estruturais, mas será diferente na sua organização. As democracias, por exemplo, continuarão formalmente. Mas serão mais dirigistas. As pessoas não serão obrigadas a fazer o que os governos determinam à força, como era dantes nas chamadas ditaduras (do proletariado como na URSS, ou orgânicas como na Alemanha de Hitler ou na Itália de Mussolini), mas sim através do convencimento (chame-se-lhe propaganda, lábia, ignorância, ou o que se quiser). Basta um discurso bem elaborado e sobretudo bem dito para convencer uma maioria de imbecis. A educação será diversificada: os programas pedagógicos nos colégios privados (mais caros e selectivos) serão diferentes dos das escolas publicas (mais generalistas e intelectualmente mais acessiveis). Igualmente na saude haverá dois niveis: a saude privada com os seus hospitais privados (mais cara e menos acessivel a quem não tenha seguros de saude mais abrangentes) e a saude publica (nos hospitais publicos, sempre cheios e com filas de espera, mas de graça). O trabalho deixará de ser para a vida (fixo, permanente, cheio de direitos e com poucos deveres) dando lugar ao trabalho flexivel (ou precário), mais dinâmico e competitivo, favorecendo a produtividade e a criação de riqueza. Os Estados tenderão a diminuir as suas competências em favor do sector privado, comprovadamente mais vocacionados para o lucro através da competitividade. O papel dos sindicatos voltará às suas origens históricas, defendendo apenas os interesses meramente laborais dos seus associados junto do patronato e abandonando as acções claramente do âmbito da politica (manifestações laborais com objectivos politicos e com apoios politicos organizados para o efeito). O teletrabalho (já instalado em vários países europeus) será a regra e apenas as funções que impliquem a presença fisica do trabalhador no local de trabalho prevalerão.
           A UE caminhará resolutamente para uma federação de Estados independentes entre si mas dependentes de politicas comuns de âmbito comunitário, decididas em conjunto mas aplicadas individualmente por cada um dos Estados e sempre obedecendo aos mesmos principios. Para assegurar o cumprimento das determinações comunitárias serão criadas forças policiais de  âmbito comunitário (como o FBI, a CIA, a DEA e outras forças equivalentes nos EUA) e será aumentado o âmbito de acção dos tribunais da UE que passarão a ser tribunais de recurso dos EM.
Deste modo, cada país será livre de aderir isoladamente a cada uma das politicas comuns da UE. Desde que adira (mediante adesão formal para cada politica) será considerado EM (nessa politica). Haverá assim vários niveis de adesão para cada país (a chamada politica dos circulos concêntricos), que poderá incluir, a diversos níveis, vários países, uns mais comunitarizados do que outros.

              ALBINO  ZEFERINO                                                                   21/3/2020

sexta-feira, 13 de março de 2020

PORTUGAL DE QUARENTENA


          Face à cada vez mais profunda crise epidémica que o virus da China vem provocando em Portugal, noutros países europeus e tambem no mundo sem que se veja uma solução à vista, receio que as medidas já tomadas (embora acertadas) não venham a produzir o efeito pretendido a mais longo prazo. Efectivamente, ninguem garante que os casos que a pouco e pouco vêem aparecendo nos hospitais já sobrelotados e exaustos não tenham tido origem anterior às medidas de contenção da epidemia decretadas já fora do prazo cautelar. Quero com isto dizer que ninguem sabe quando e como acaba este flagelo. A percentagem reduzida (embora perigosamente crescente) de mortes noutros países atribuidas ao virus maldito tem vindo a descansar (ainda) a maioria da população portuguesa (ainda não houve mortes em Portugal), mas receio que algum dia (cada vez mais proximamente) esta "almofada psicológica" se rompa e então será a grande tragédia com o seu rol de anarquia e de desespero associados.
          Para evitar este funesto desfecho duma situação ainda controlável, acharia prudente que as autoridades portuguesas promovessem, quanto antes, medidas mais drásticas do que as determinadas até agora, que envolvessem a totalidade dos recursos disponiveis e sustivessem realmente a propagação do coronavirus. Refiro-me a medidas de carácter geral, aplicáveis a toda a população e que envolvessem todas as instituições nacionais necessárias e não apenas as relacionadas com a saude publica. Começar-se-ia por enquadrar juridicamente as medidas que tivessem natureza anti-constitucional, como sejam todas aquelas que ferissem a liberdade individual ou colectiva dos cidadãos. Se necessário, proceder-se-ia a rectificações constitucionais ou à revogação de leis obstrutivas de determinações governativas mais musculadas. Seguidamente, adaptavam-se as leis vigentes à nova situação de contenção do virus, a fim de permitir uma maior abrangência e eficácia à acção do legislador. Criada esta nova moldura legal, o governo determinaria uma configuração defensiva (de natureza administrativa) em redor dos aglomerados mais populosos do país (cidades, vilas e freguesias) em relação aos quais as respectivas populações ficariam confinadas, não podendo delas sair ou entrar sem fiscalização prévia. Deste modo restringia-se efectivamente a circulação de pessoas entre comunidades através dum verdadeiro cerco (usando militares se necessário para o efeito, que se instalariam nos quarteis dos regimentos territoriais ainda existentes) só permitindo entradas e saidas de pessoas dos seus locais de residencia com justificação legal. Em cada um destes aglomerados populacionais (cidades, vilas ou freguesias) eram instalados centros de saude especialmente criados para o combate à epidemia, que seguiriam apenas os doentes de cada um dos locais definidos. As situações graves ou especiais seriam encaminhadas para os hospitais centrais já existentes nas grandes cidades. A mobilidade entre aglomerados populacionais só seria permitida aos agentes da Protecção civil em serviço (INEM, bombeiros, serviços de saude, militares em serviço, PSP, GNR, Policia Judiciária, etc.) que seriam permanentemente sujeitos a exames epidemológicos.
          Só desta maneira (ou de outras da mesma natureza) será possivel suster esta epidemia que grassa com muita virulência (maior do que aquela que a comunicaçao social nos faz crer) impedindo as acções inconscientes de grande parte da população portuguesa que, por estupidez natural ou ignorância crassa, põem em risco de vida os seus semelhantes e simultâneamente evitando que os turistas estrangeiros que diariamente demandam o nosso país, para cá venham sem as devidas cautelas sanitárias previamente asseguradas. Ao transferir competências nesta área para as autonomias (o que tambem já existe em Portugal, mas só relativamente à Madeira e aos Açores), os nossos vizinhos espanhois estão no bom caminho, sem porem terem ainda chegado aos pueblos e às cidades, carregadas de estupidos ignorantes como nós (ambas raças têm as mesmas origens) que não se importam com os assuntos sérios desta vida, antes preferindo gastar o seu tempo em copas y toros (e futebol tambien).

                ALBINO ZEFERINO                                                                       13/3/2020

domingo, 8 de março de 2020

A POLITICA E O FUTEBOL



          Diz-se com razão que politica e futebol andam juntos.  Andam juntos porque são duas faces da mesma moeda.  E essa moeda chama-se desenvolvimento. Vejamos então como é que isso se explica.
Nos países ditos desenvolvidos (França, Reino Unido, Alemanha, Holanda, Suécia, Itália, etc.) onde o futebol é considerado uma actividade económica e não apenas socio-cultural, como nos países menos desenvolvidos (por cá, por exemplo, a personalidade de cada pessoa é definida pela opção clubista de cada um dos avaliados), o mundo do futebol é muito mais dinâmico.  A discussão dos primeiros lugares dos campeonatos nacionais não é feita sistematicamente entre os 2 ou 3 clubes do costume (em Portugal, Benfica, Porto e Sporting) mas o campeão nacional muda todos os anos de entre a quase totalidade dos clubes que disputam as respectivas ligas. Não há os clubes de 1ª de 2ª e de 3ª categorias, ou seja, os que ganham sempre, os que às vezes ganham e os que nunca ganham. Não há os derbis, nem as finais antecipadas (que fazem parar o país como se ficassemos todos em estado de sítio) que mobilizam multidões e perturbam a ordem publica, sendo tema de telejornais de todas as televisões durante dias seguidos. O futebol é encarado nesses países como um desporto qualquer, sem carácter exclusivo nem hegemónico, onde os adeptos vibram como cá mas sem que isso faça perigar a sua dignidade e as suas rotinas diárias. Pelo contrário, nos países menos desenvolvidos, um jogo de futebol entre os grandes é como se fosse uma batalha entre facções desentendidas onde se disputa o futuro da Nação.  Os dias de derbi são muito mais agitados do que os dias de eleições.  As reacções dos adeptos vitoriosos são incomparavelmente mais barulhentas e perigosas do que as dos eleitores dos partidos vencedores de eleições, sem embargo dos resultados eleitorais terem consequências muito mais profundas na vida das pessoas do que os resultados do futebol.
          Mas, tal como na politica, o futebol move milhões e afecta decisivamente as vidas de algumas pessoas. Os preços dos jogadores (e agora tambem dos treinadores) são escandalosos face às dificuldades que passam a generalidade das pessoas nas suas vidas dificeis, mas que curiosamente não suscitam nem criticas nem inquéritos (jornalisticos ou publicos) sobre o valor das transacções ou a proveniencia dos milhões nelas envolvidos. De onde vêem, para onde vão? Quem os recolhe e quem os proporcionou? Ninguem se interessa, nem ninguem questiona. Só se sabe que o jogador X comprou uma casa milionária ou um carro espanpanante, ou que o agente Y embolsou mais Z milhões numa intermediação futebolistica que trouxe esperança e alegria a muitos adeptos. Tudo certo. Tal como o sol nascer de manhã ou a lua estar cheia à noite. Na politica as coisas são porem melhor escrutinadas porque nem toda a gente aceita que um politico vindo das berças (vêm quase todos) fique rico de repente e passe a frequentar os meios sociais que poucos anos antes desconhecia existirem ou lhe eram vedados.  Mas mesmo assim a corrupção medra como a água entre as pedras e torna-se dificil destapar o corrupto. Se se puxa por um lado descobre-se-lhe os pés; se se puxa por outro descobre-se-lhe a cabeça. Assim é melhor não puxar muito pelo lençol, senão fica tudo às claras.
          O campeonato portugues de futebol deste ano está ao rubro, pois as equipas que vulgarmente se conformavam ou em ficar no 3ª ou no 4ª lugares da tabela classificativa, ou mesmo as que sistematicamente lutavam nos ultimos lugares para não baixar de divisão, estão a aproximar-se perigosamente dos chamados 3 grandes, querendo mostrar-lhes que o campeonato não é só deles e que há que contar até ao ultimo jogo com todos para a disputa do titulo de campeão nacional. Ora isto é bom, desportivamente e socialmente. Desportivamente porque mostra que quase todos os clubes estão em condições de conseguir o que só alguns (mais ricos, mais bem relacionados, mais protegidos) habitualmente vêem conseguindo; e socialmente porque a democracia parece ter chegado ao futebol que se tem tornado apesar de tudo mais aberto e mais acessivel aos bons jogadores e aos treinadores mais promissores. Oxalá que este progresso seja sinal de que finalmente (atavés do futebol) Portugal se está a aproximar dos países europeus mais desenvolvidos. Mesmo assim este ano não creio que o campeonato escape ainda ao Porto ou ao Benfica. Para o próximo veremos.

                   ALBINO  ZEFERINO                                                              8/3/2020

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

A VITÓRIA SOCIALISTA



          A vitória socialista de ontem nas eleições legislativas ordinárias que marcaram o inicio da nova legislatura parlamentar para o período de 2019/2023 era já esperada.  Depois da crise no PSD, resultante do exercicio da troika imposta pela governação descuidada de Sócrates, a geringonça daí resultante - obra do táctico Costa - empurrou o eleitorado para a legitimação eleitoral da governação lusitana. Só que a esperada (e desejada) maioria absoluta (à Cavaco) não sorriu ao habitualmente afortunado Costa. Só ganhou relativamente, precisando do apoio parlamentar de outros para que as suas propostas governativas consigam ver a luz de dia.  Uma maioria absoluta teria dado a Costa maior descanso para a conquista do poder absoluto pelo PS. Teriamos porém a completa subjugação aos ditames governativos duma maioria de ressabiados sociais e de invejosos malandros, que pronto abafariam as vontades alheias e os interesses dos outros, para dar lugar a um nacional socialismo encapotado de democrático como Hitler e Staline impuseram aos seus compatriotas, há quase um século. Felizmente que o povo é sábio na sua ignorância e não deixou rédea solta às espertezas dos Costas, Centenos, Césares, Galambas e quejandos, que nos conduziriam certamente para novos abismos à Sócrates.  António Costa saiu vencedor como se esperava, mas vai ter que condicionar o apoio às medidas que pretender implementar no país, a outros com quem terá que as negociar.
         Mas afinal com que é que Costa se irá entender? Com o PC e o BE, como até agora, não creio. O BE (indiscutivel vencedor destas eleições) está cheio de ar e mesmo antes de qualquer eventual abordagem nesse sentido por parte de Costa (seria objectivamente o que a maioria esquerdista do país desejaria) a sua chefe já anunciou uma série de condições para o casamento, inaceitáveis para o PS, o que exclui à partida uma reedição da famigerada geringonça. Tambem relativamente ao PC (que foi, com o CDS, o maior perdedor nesta contenda eleitoral) a geringonça não terá grande futuro, pois Jerónimo de Sousa já encaixou a derrota, atribuindo-a precisamente ao apoio comunista na geringonça.
          Quem serão então os novos pagens do imperador maldito?  Os socialistas, na falta duma estratégia clara de acção governativa (agem tacticamente por impulsos, ao sabor das circunstancias do momento), costumam apregoar os seus méritos num suposto centrismo da politica portuguesa (técnica soarista para distinguir o PS dos verdadeiros marxistas que - dizia ele - eram os comunistas) para se tornarem indispensáveis à governação. E o certo é que têm conseguido. Só com Cavaco é que não estiveram no poder, desde que cá chegaram em 1974. O sistema proporcional de representação parlamentar consagrado na caduca Constituição de 1976, aliado ao velho principio de Hondt para a selecção dos eleitos, não proporciona a formação de maiorias absolutas no nosso parlamento. Por isso temos tido menos governos de maioria absoluta do que têm outros países nossos sócios na UE. Neste contexto, o argumento do centrismo (logo apanhado pelo espertalhão Mário Soares para seu proveito) muito ajudou o PS a manter-se quase permanentemente no poleiro da governação em Portugal, durante este regime constitucional. O PS já esteve coligado com todos os outros partidos parlamentares. Faltam agora os novos. E, a meu ver, será com esses que Costa irá agora contar. PAN e Livre serão os próximos. Mas chegarão? Vamos ainda aguardar a contagem final dos votos expressos para ver.

          ALBINO ZEFERINO                                                                                          7/10/2019

sábado, 22 de dezembro de 2018

BOLSONARO E O FUTURO DO BRASIL


           Já com o futuro governo fechado, o presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro, prepara-se para a posse marcada, à americana, para o primeiro dia do próximo ano. Como será esse governo? Como irá governar? Com que apoios? Vejamos então. Suficientemente realista para reconhecer a sua incapacidade e a falta de carisma (como Lula tinha) para, por si só, se impôr a mais de duzentos milhões de brasileiros de todas as raças, cores, convicções, niveis de vida e de desenvolvimento, etc. (o Brasil é por si só um continente), Bolsonaro está consciente do desafio que lhe foi lançado pela maioria da população que nele depositou a confiança necessária para conseguir uma mudança na condução dos destinos de um país há décadas embrulhado em corrupção e de futuro adiado. Dois ministros ressaltam da plêiade das 22 personalidades escolhidas por Bolsonaro para o ajudarem a pôr de novo o Brasil na senda do progresso: Sergio Moro, na Justiça, e Paulo Guedes, na Economia.
          Talvez seja o juiz Moro (o do processo lava-jato, que pôs na cadeia Lula e muitos dos politicos brasileiros corruptos, alguns com ligações a Portugal, que por aqui andam a passear-se) aquele por que todos os bolsonarianos esperam para pôr o país direito (como eles dizem), pois sem a erradicação da corrupção generalizada nada se poderá fazer no campo do desenvolvimento económico e social. Os primeiros sinais virão assim da Justiça, agora com Moro com competências alargadas tanto no sector policial como no social, que se prepara para enfrentar os lobbies da droga com redobrada energia.  Com a transferência dos campos de cultivo da Colombia para o Equador e para o Peru, nas bordas da floresta do Amazonas brasileiro, a droga, já processada em território amazónico, é hoje escoada para o mundo maioritariamente através dos aeroportos de Guarulhos e do Galeão. Os famosos PCC (conglomerado de patrões da droga) estão no Brasil conduzindo as operações e armando poderosamente os seus agentes instalados nas favelas cariocas e paulistas e corrompendo politicos e policias, a fim de facilitar o regular escoamento do produto.
          É de esperar assim uma agudização dos enfrentamentos entre as policias (saneadas é claro - diz-se, por exemplo, que a famosa policia militar vai ser extinta, para dar lugar a uma espécie de DEA brasileira) e os bandidos armados com material de guerra excedente das guerras do Iraque e da Siria, que abatem helicópteros no ar e destroem casas num só disparo. Bolsonaro já anunciou que as leis penais, demasiado exigentes para os agentes da ordem, vão ser liberalizadas para retirar os constrangimentos à policia na luta contra o banditismo. É claro que tudo isto terá que ser feito com cuidado mas de forma a que as pessoas vejam que a insegurança hoje reinante em certas partes do Brasil estará em recuo.
          E é aqui que as coisas poderão emperrar. Fazer "limpezas" profundas em democracia (que é aquilo que Bolsonaro se dispôs a fazer na campanha eleitoral) não só é mais dificil como mais lento, retirando o efeito politico à acção. Limitar a liberdade dos cidadãos (pelo menos de alguns deles) e diminuindo-lhes as garantias de defesa dos seus direitos (pelo menos a alguns deles) pode ser o rastilho para confrontações civis que poderão desembocar na declaração do estado de sitio e na ditadura (de tão má memória no Brasil). Os militares que apoiam Bolsonaro estão à espreita cautelosamente, vigiando as reacções populares às primeiras medidas saneadoras. Vamos lá a ver o que acontece.
          Por outro lado, a multiplicidade de partidos e de partidecos representados na assembleia federal no Planalto em Brasilia impede que o partido de Bolsonaro tenha ganho a maioria dos votos, embora a sua eleição presidencial tenha vencido por maioria de 55% dos votos. Todas as leis de natureza federal terão que passar na câmara, pelo que pode acontecer que algumas leis indispensáveis à prossecução das politicas de Bolsonaro não passem no Planalto (como está agora a acontecer a Trump no Congresso americano). Assim sendo, Bolsonaro terá mais este escolho para resolver na sua espinhosa caminhada para o desenvolvimento do "país do futuro". Deus lhe dê saber e sorte.
          Como nota de rodapé (sempre as mais interessantes) direi que Macri (o presidente da Argentina, país vizinho, amigo, rival e companheiro do Mercosul) anunciou não estar disponivel para ir à cerimónia da posse de Bolsonaro como próximo presidente do Brasil.

                           
                               ALBINO  ZEFERINO                                                    22/12/2018

domingo, 9 de dezembro de 2018

PARIS BRÛLE-T-IL?



          Recordando o best-seller de Collins e Lapierre, premiado em 1966, que relata o épico momento em que o general von Choltitz, comandante militar das forças nazis de ocupação de Paris, recebeu, em 1944, na retirada desesperada dos alemães de França, a ordem de Hitler para incendiar a mais bela cidade europeia de então, o recente movimento dos coletes amarelos, que tem posto a capital francesa a ferro e fogo, parece levar-nos para os tempos de maio de 68, quando Sartre e Cohn-Bendit promoveram a maior onda de protestos populares nas ruas de Paris, a pretexto de manifestações estudantis para pedir reformas no sector educacional em França e que evoluiram para uma maciça manifestação de trabalhadores e depois para a maior greve geral de sempre, que foi brutalmente reprimida pelo governo frances de então, forçando de Gaulle a convocar eleições gerais e só assim retomar o controle da situação, mas abrindo as portas para a sua retirada politica (o que ocorreu pouco depois) e deixando o caminho aberto às reformas politicas que marcaram a França nos anos seguintes.

          Os acontecimentos recentes em Paris e no resto da França, que mobilizaram milhares de policias e provocaram centenas de detenções, parece não estarem para acabar tão cedo, deixando nos espiritos mais preocupados a ideia de que, tal como ocorreu em 1968, não será sem profundas reformas que a situação politica se normalizará. O pretexto da contestação ao anunciado aumento do preço da gasolina, que passou já para patamares mais dificeis de conter e que não se antevê onde acabará, prenuncia o fim de uma época e o inicio de outra, que a vitória eleitoral de Macron simulava ter protagonizado, mas que afinal, parece não ter conseguido. 

          Outros países europeus estão passando por experiências novas que tambem configuram uma vontade popular de mudança do paradigma politico que foi iniciado no pós-guerra, mas que parece ter chegado ao fim. A alternância no poder entre partidos demo-liberais e socialistas (um pouco como os conservadores e os trabalhistas britânicos) parece ter acabado na Europa e perfilam-se no horizonte outras fronteiras divisórias de interesses politicos opostos. Com o fim da pobreza absoluta e da submissão social, os novos eleitores tornaram-se mais inteligentes, mais cultos e mais preparados do que os seus progenitores, para atingir patamares de vida antes reservados apenas a certas classes sociais ou profissionais. A influência de ideologias progressistas ou conservadoras mistura-se no espirito das novas gerações, mais como acontece com o leite e com o café e menos do que ocorre com a água e o azeite, que naturalmente não se misturam. Nada é hoje inatingivel por ninguem e já não existem coutadas reservadas para uso ou frequência de uns e onde outros estavam naturalmente excluidos. É neste contexto que se inserem as opções governativas e de vida da maioria dos cidadãos dos países ditos desenvolvidos. Mas tambem entre países se verfica a mesma coisa, pois já não existem países de primeira ou de segunda categorias, embora subsistam ainda laivos de subalternidade entre os estados mais desenvolvidos e os menos desenvolvidos. E não só entre países de continentes diferentes, mas tambem entre paises do mesmo continente. Basta pensar-se na China, na India, no Brasil ou no México. Todos estes países são subdesenvolvidos, mas detêm todos eles altos graus de desenvolvimento em certos sectores.

          Mas é sobretudo na Europa onde nos inserimos que esta problemática se revela mais premente.  Com a União europeia (com as suas vitórias e os seus desaires) todos os países europeus (mesmo os não membros da UE) atingiram depois (e como consequência) da queda do muro de Berlim, niveis de desenvolvimento acentuados (uns mais do que outros, naturamente).  A integração europeia não é (como alguns ainda pensam) um projecto unificador, mas sim um padrão de vida que todos querem usufruir por igual e o qual todos têm o mesmo direito de almejar. Assim se compreendem as influências que os estados europeus (dentro ou fora da União) exercem uns nos outros. Influências politicas, sociais, económicas, culturais e até de costumes.

          Compreende-se assim a impaciencia que alguns demonstram no alcançar dos desideratos a que se julgam capazes ou com direito, sobretudo quando comparando com as formas, por vezes ardilosas e até soezes, com que outros já os atingiram. As manifestações em França (até agora incontroláveis) são bem a prova disto. Porque razão uns pagam mais do que outros para conseguir o mesmo resultado? Porquê uns chegam mais depressa ou mais alto do que outros tendo capacidades semelhantes?  É disto que se queixam os coletes amarelos e é disto que se queixam todos aqueles que estão na mesma situação. Vivam onde vivam e estejam onde estejam. Coletes amarelos todos temos na mala do nosso carro. Não vivemos é todos em França.


                    ALBINO  ZEFERINO                                                             9/12/2018

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

BREXIT: ACORDO OU DECLARAÇÃO DE GUERRA?


          Com a histórica aceitação sem reservas, neste fim de semana, do plano May, por parte dos sócios da Grã-Bretanha para a saída "soft"dos ingleses da União Europeia onde se meteram para não ficarem isolados numa Europa em mudança profunda, iniciou-se uma fase sem retorno nesta aventura a que alguns chamaram Brexit.  Resta agora o acordo do Parlamento britanico para que o divórcio se concretize.  Mas será assim tão simples? Infelizmente não me parece.
          Nunca os ingleses se conformaram na submissão a uma entidade supranacional que não controlavam, depois de terem sido os únicos a conseguir evitar a invasão hitleriana há mais de setenta anos atrás.  A participação britanica na UE foi sempre pautada por reservas consubstanciadas em "optings out" que, conferindo aos ingleses um estatuto de que os outros não gozavam, fez nascer nos parceiros comunitários um certo desconforto pela presença inglesa nas lides comunitárias. Alguns até chegaram a atribuir aos britanicos algumas culpas por certos atrasos ou desvios ao natural e progressivo processo integrador europeu.  Não é pois de admirar a vontade (por enquanto escondida, é certo) de certos parceiros em "despachar" este assunto, que constitui para alguns a remoção de um obstáculo essencial ao avanço mais rápido na direcção de uma verdadeira união politica que afaste de uma vez para sempre o espectro duma nova guerra na Europa.
          Mas será assim tão fácil "despachar" os ingleses de vez? Não me parece. Em primeiro lugar, porque o Brexit não constitui apenas uma simples declaração de vontade em sair, pelo contrário, reflecte uma decisão popular, que apesar de não ser peremptória nem unânime, traça um caminho ao qual não se poderá fugir com subterfugios e esquemas paralelos, como tem sido uso e costume na Comunidade europeia.  Depois, não é fácil, neste contexto de confrontação, encontrar uma forma pacifica, aceite por "brexiters" mais encarniçados e por "remainers" mais empedernidos, que possa merecer aceitação generalizada de todos os cantos de um reino que se diz unido mas que está afinal junto com cuspo (o que pensam os escoceses, e os irlandeses do norte, e os galeses, e os trabalhistas e os tories, e os comuns e os lordes, e os das docas e os proprietários rurais?).  Será que todos se porão de acordo como se puseram quando Churchill exortou os britânicos a resistir aos avanços de Hitler?
Finalmente, será dificil seja a quem for emendar a mão, seja com outro referendo, seja com algum zigue-zague muito próprio dos ingleses, do qual não vejo um resultado útil e evidente para sair desta embrulhada.
          Será assim, a meu ver, muito dificil que o Parlamento britanico se ponha de acordo na aprovação dum projecto que, sem lhe retirar o mérito especifico, não satisfaz nem gregos nem troianos nesta guerra sem quartel em que os britânicos se meteram quando decidiram aderir à então CEE, convencidos de que a dominariam desde dentro, o que alemães e franceses nunca permitiriam, como nunca permitiram que os britanicos dominassem a Europa desde que a história é história.  Não se pode fazer história contra a história.  Talvez os americanos possam dar uma ajuda quando verificarem que essa ajuda lhes poderá ser útil.  Como reza, de resto, a história.

         
                     ALBINO  ZEFERINO                                                          26/11/2018