domingo, 28 de fevereiro de 2016

A SOBERANIA PARTILHADA


          Fala-se muito de soberania partilhada quando se quer definir o relacionamento entre a União Europeia e os seus Estados Membros. A UE existe e funciona porque exerce sobre os seus membros uma certa autoridade. Essa autoridade deriva das directivas e dos regulamentos que diariamente são produzidos em Bruxelas para serem transpostos para as legislações internas dos EM a fim de produzirem efeitos juridicos sobre os cidadãos comunitários. O poder que os Estados detêm para dirigir a vida dos seus respectivos cidadãos é assim partilhado com a UE.
          Antigamente quando a soberania provinha do rei, ela era absoluta, o que quer dizer total. O rei tinha sobre os seus subditos (como antes se denominavam os cidadãos de hoje) um poder absoluto. Poder de conceder ou retirar a vida, poder de conceder ou de retirar bens e prebendas, poder de deter ou de libertar as pessoas, poder de juntar ou separar as pessoas, enfim, o poder de fazer ou de não fazer tudo o que lhe viesse à cabeça. Mais tarde com Revolução francesa o poder passou do rei para os cidadãos e destes só para alguns deles. Com a Revolução sovietica a coisa institucionalizou-se e o poder passou a ser exercido por uma minoria de déspotas esclarecidos. Com o advento da Democracia o poder de mandar passou para as instituições democráticas que são eleitas por todos e desse facto retiram a sua legitimidade soberana. Contudo, como as cabeças não são todas iguais, a Democracia apresenta falhas. Quando uns dizem uma coisa e outros o seu oposto fica-se sem saber quem tem razão. Daí a necessidade de se fixarem regras de conduta comuns (ou seja aplicáveis a toda a gente) para servirem de esteio ou de rumo à vida das pessoas. A definição e aplicação dessas regras comuns compete prioritariamente ao Estado que, através dos seus orgãos de soberania, as definem e aplicam.
A isto se chama  o exercicio da soberania.
          Mas será esse exercicio absoluto? Será que basta ao Estado através dos seus orgãos de soberania decidir determinada conduta aplicável aos cidadãos nacionais para que esta revista natureza absoluta, ou seja total e definitiva?  Em principio sim, se a soberania desse Estado for absoluta e estiver consagrada na respectiva Constituição (escrita ou oral). Mas se o Estado em questão tiver delegado essa soberania (ou uma parte dela) noutro Estado ou numa organização de Estados à qual pertença?  Nesse caso, a soberania (ou a parte dela que foi delegada) já não é absoluta (ou total e definitiva). É uma soberania partilhada entre o Estado delegante e o Estado (ou a organização de Estados) no qual foi delegada. É isto o que se passa com os Estados Membros da UE relativamente aos órgãos decisórios desta (do qual fazem parte os orgãos de soberania de todos os Estados delegantes). Por isso se diz que a soberania dos EM da UE é uma soberania partilhada.
          No seio da UE há hoje já uma distinção essencial entre EM, que se concretiza naqueles que delegaram na UE o poder soberano de cunhar moeda (por cunhar entenda-se dirigir a politica monetária desse Estado) e os que não delegaram, mantendo esse poder em mãos exclusivamente nacionais. Ao fazer parte da zona do euro (moeda comum a 18 EM e portanto submetida a determinações comuns aplicáveis a esses 18 EM), os Estados da zona euro abdicaram da soberania total e absoluta na condução da politica monetária dos seus respectivos países, para adoptarem uma politica monetária comum a esses 18 EM. A essa obediencia corresponde a necessidade desses EM de seguirem a politica monetária determinada pela UE, a troco de poderem beneficiar dos apoios ou das ajudas necessários para acompanharem essa politica monetária comum. É nesta perspectiva e não noutra que a reestrturação da banca portuguesa deve ser encarada. Quaisquer outras interpretações ideológicas ou interesseiras devem ser liminarmente excluidas desta reflexão, sob pena de criar no espirito dos cidadãos portugueses expectativas erradas acerca das medidas a seguir e da forma como o problema da banca em Portugal deverá ser resolvido.

               ALBINO  ZEFERINO                                                          28/2/2016

sábado, 27 de fevereiro de 2016

A DESMISTIFICAÇÃO DO BREXIT


          E se apesar de tudo os britânicos votarem mesmo maioritariamente na saida da UE? Será a priori um grande desaire para os europeistas e uma revolução anunciada para a continuidade pacifica e pachorrenta da construcção europeia. A GB não é a Grécia nem é Portugal e por conseguinte conseguirá resisistir por si só a essa provação. O eterno isolamento britanico do velho continente já vem de longe. Mas e a UE? Subsistirá sem a GB? Sim, mas tambem.
          Está claro que o afastamento dum grande país do processo decisório europeu fará moça no habitual ram-ram bruxelense e o desmantelamento dos laços burocráticos já criados com as instituições europeias não será nem fácil nem instantâneo. As reacções serão de diversa ordem: primeiramente mediáticas. O abandono da UE por referendo de um País determinante para os destinos europeus será considerado por muitos como a passagem da certidão de óbito dum processo integrador que atingiu o seu fim. Muitos, da esquerda à direita cantarão loas. Mas será mesmo assim? Não creio.
          Terá tambem consequências financeiras. O RU, embora não seja país pagador, contribui através de mecanismos próprios para o desenvolvimento do processo europeu. E mesmo que os laços não se desfaçam de todo (a GB não passaria a ser inimiga da UE e dos seus EM pelo facto de abandonar a organização) a continuidade da colaboração britânica pontual e casuistica não ficaria em causa. Ou seja, não seria dramático nesta perspectiva.
          Noutras áreas sentir-se-iam certamente tambem reflexos dessa desagregação. A GB deixaria de colaborar na politica externa e de segurança da UE, na PAC, na politica de fronteiras e na ajuda ao desenvolvimento. Mas tudo isto poderia ficar regulado bilateralmente, como acontece com a Suiça e com a Noruega. Tambem não seria dramático.
          E para os bifes? Seria assim tão bom como Farage, Boris, Gove e outros apergoam? É certo que a GB deixaria de gastar dinheiro com a UE (embora, repito, não seja um contribuinte liquido) mas tambem deixaria de receber a solidaridade dos outros em áreas que fazem arranjo, como nos refugiados ou no controle do mercado financeiro, por exemplo. Enfim, a contabilidade material será complexa de estabelecer. O grande prejuizo seria o isolamento. Não é, a meu ver, afastando-se do seu habitat natural (tal como pretendem os nacionalistas catalães ou escoceses) que os nacionalistas fazem progredir o seu país, neste mundo cada vez mais globalizado pela informática e pelos negócios. Acho que o futuro dos países europeus está na UE e é dentro dela que individuos, empresas e instituições poderão progredir. Não fora dela.
          A saida da GB da UE traria tambem vantagens para o processo integrador. Primeiramente desapareceriam os obstáculos institucionais que britanicos e outros sistemáticamente colocam ao aprofundamento da integração europeia. Depois, a saida da GB da UE constituiria uma experiencia que outros criticos do processo europeu observariam com maior cuidado e menos ligeireza. Que vantagens trouxe? Que inconvenientes determinou? Só vendo. Considero que, tal como nas cirurgias curativas dos carcinomas onde a ablação dos tecidos infectados permite ao paciente continuar a sua vida normal sem obstáculos nem privações, a saída da UE de países que não querem que o processo integrador avance, permitirá a este avançar com maior desenvoltura e rapidez para estádios mais avançados de cooperação institucional inter-estadual capazes de fortalecer a UE e os EM que a compõem.
         Penso porém que o pragmatismo britânico vai prevalecer e que esta questão do Brexit será em breve ultrapassada e esquecida por uns tempos.

                 ALBINO ZEFERINO                                                    27/2/2016

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

O REFERENDO BRITÂNICO


          Com o acordo forçado dos governos dos restantes 27 Estados membros, Cameron conseguiu consagrar para o seu país um regime excepcional no seio da UE que se traduz pura e simplesmente no seguinte: O RU beneficiará de todas as decisões comunitárias que o seu governo considerar benéficas para o país e rejeitará todas aquelas que o seu governo considerar prejudiciais para o RU. Uma espécie de opting-out genérico, à la carte ou à vontade do freguês, confome as linguas que definam a aleivosia. Imaginem se a moda pega. Seria o fim imediato da UE como a conhecemos.
          Contudo, em vez de suscitar desagrado ou mesmo rejeição por parte dos europeistas mais aguerridos, não. Parece que toda a gente ficou muito contente com o resultado das conversações que Cameron impôs aos seus pares no último Conselho europeu. É que, dizia ele, se não se conseguir chegar a um acordo que satisfaça a maioria dos ingleses, o governo britanico não terá pé para defender a recusa do Brexit no próximo referendo. E assim sendo, o Brexit tornar-se-á inevitável, agora que os Trabalhistas foram de novo conquistados pela extrema-esquerda anti-europeia. A isto chama-se vulgarmente chantagem, conceito muito utilizado pelos ingleses durante a sua atribulada história.
          A escandalosa derrota da solidariedade europeia às mãos duma Inglaterra ávida do protagonismo que lhe vem escapando na razão directa do sucesso da integração europeia na resolução da crise financeira, obra ainda inacabada mas de enorme e decisivo folgo, veio levantar a questão de saber se os problemas britanicos devem influenciar ou não o percurso europeu no sentido da integração desta Europa dividida entre federalistas e governamentalistas, entre apoiantes duma integração plena que envolva refugiados económicos e aqueles que a rejeitam, em suma, entre os que querem uma Europa dividida em capelinhas ou os que querem uma Europa unida e forte capaz de ombrear com as grandes potencias deste mundo globalizado e competitivo. Compreende-se a relutancia britanica em aceitar partilhar com alemães e franceses as decisões conducentes à condução da Europa e à resolução dos problemas europeus, que são a extensão dos mesmos problemas que afligem o RU.  Só não se compreende a forma brutal e sem alternativa como o PM britanico "obrigou" os seus parceiros a beneficiar os ingleses, como uma "homenagem" à coragem inglesa demonstrada na Guerra contra os boches alemães e contra os seus colaboracionistas franceses. A guerra já lá vai há muito tempo e nem a França nem sobretudo a Alemanha de hoje tem algo que ver com a Alemanha nazi ou com os pétanistas franceses.
          Estou convencido de que o referndo britanico vai ser negativo, como têm sido todos os que põem em causa a pertença do RU à UE. Os ingleses são um povo sábio, genericamente culto e preferem pertencer à UE com vantagens do que sair dela sem vantagem nenhuma. Mas se porventura os loucos tomarem conta do RU e apesar do que digo votarem a favor duma saida do país da UE, então sim, a UE estará acabada e com ela Portugal e os países em dificuldades. Não será navegando sózinho neste mar encapelado de dividas e de alçapões que Portugal conseguirá sobreviver. Nessa altura, teremos que estar muito juntos e não haverá mais espaço para fantasias, senão seremos comidos pelos lobos que espreitam gulosos este cantinho à beira-mar plantado.

                         ALBINO  ZEFERINO                                              23/2/2016
         

domingo, 21 de fevereiro de 2016

A PASSAGEM DO RUBICÃO


          Estamos à beira da passagem do Rubicão, ou seja para os menos entendidos em aforismos, estamos prestes a chegar ao ponto a partir do qual o regresso (ou a regressão como hoje se diz) se torna impossivel.  Refiro-me à desgraça que caiu sobre nós com a queda do império Espirito Santo. Não tem sido por acaso que o tema deixou de ser discutido nos jornais e que o Parlamento arrumou num canto depois de retirar as conclusões superficiais e sem consequencias do seu inquérito parlamentar. É que ninguem quer cavar mais fundo nessa lixeira com medo de ficar contaminado e de contaminar o país inteiro.
          Uma das consequencias desta coligação governativa contra natura que nos rege é precisamente o desejo de uns e a dissimulação de outros na abordagem de tema tão profundo e arriscado para a sobrevivencia de Portugal como Estado soberano e independente (tanto como poderá hoje sê-lo). Para o PS, entalado entre a obediencia às cominações comunitárias e o cumprimento das juras de amor feitas aos comunas nacionais sem as quais cai pela escada do Parlamento abaixo, a coisa tem sido resolvida (ou melhor, adiada) com dissimulação. Dirão alguns espertos que a coisa tem sido empurrada para a frente com a barriga, na esperança que Nossa Senhora das Mágoas apague o fogo que teima em não se extinguir. Costa é perito nestas coisas da dissimulação e do engano e o Zé povinho vai na primeira patranha que lhe contam. O BE, por seu turno e pela voz das gajinhas de serviço, vai impedindo que a coisa caia no esquecimento com algumas declarações esganiçadas que Mortáguas, Marinas e Catarinas vão fazendo, sempre que apanham um microfone pela frente. O que querem os apoiantes parlamentares de Costa? Querem aproveitar a desastrosa e vergonhosa forma como o GES caiu, arrastando consigo para a falência o BES, sócios, clientes e simples depositantes, para nacionalizar o banco, com o pueril pretexto de que a banca nacional não poderá ficar toda ela entregue aos malvados dos espanhois, que tanto esforço e labor custaram aos restauradores de 1640. O Santander apenas aguarda a oportunidade para lançar uma OPA ao Novo Banco, logo que a situação amadureça, dizem elas.
          Esta é a verdadeira questão de fundo cuja resolução vai determinar se Portugal continua ou não à tona da água, ou se, pelo contrário, vai pelo cano abaixo definitivamente e sem regresso. Perder o controle nacional da banca não é bom, mas tambem não é fatal. Depois duma intervenção financeira que durou mais de 3 anos, algo teria que mudar nesta terra de brandos costumes e de hábitos ancestrais. Não é por não controlar a banca (sempre fica com a CGD para brincar) que o país vai à viola. Mas tornar-se dono disto tudo, como aconteceu no PREC, abarcando com as consequencias financeiras dessa posse, não é certamente a melhor maneira de progredir e de criar riqueza. Ou pensam os nossos comunas que as quase mil acções judiciais que correm em Portugal e no estrangeiro contra o Novo Banco (herdeiro dos activos do BES) cairiam se o banco passasse para as mãos do Estado? Os bancos hoje estão maioritariamente falidos, têm pessoal e encargos administrativos a mais e constituem um encargo que o Estado bem pode (e deve evitar). A questão é politca e resume-se ao velho aforismo de sempre: menos Estado, melhor Estado. Ou queremos tentar aquilo que os soviéticos e os seus satélites europeus, os cubanos ou os venezuelanos, os argentinos e os brasileiros tentaram e não conseguiram? Ficar com tudo, distribuir por alguns os eventuais lucros e deixar o Zé povinho na mais triste miséria material e de espirito? Não creio.
          Portugal tem que evoluir. Não é regredindo para situações anteriores que não produziram resultados favoráveis para a maioria das pessoas (apenas serviram os que nelas estavam envolvidos) que devemos caminhar. Veja-se o caso da TAP. Há muito tempo que a TAP deveria ter sido privatizada como foram todas as companhias que antes se chamavam de bandeira (com a liberalização do espaço aéreo deixou de fazer sentido a existencia das companhias de bandeira). Em Portugal não é possivel fazer privatizações deste tipo pacificamente, enquanto não forem alteradas as condições socio-laborais em vigor. E isso só pode ser feito com uma revisão constitucional. Esperemos que o novo Presidente da Republica, distinto constitucionalista e co-autor desta trampa que nos rege, caia em si, faça uma contricção e se esforce em convencer os 2/3 dos deputados necessários para alterarem essa lei que, em vez de nos conduzir para o futuro, nos aponta para o passado de cujas consequencias funestas estamos hoje a sofrer.

                        ALBINO  ZEFERINO                                                 21/2/2016

sábado, 20 de fevereiro de 2016

PORTUGAL E A GUERRA NA EUROPA


          Sem embargo do enorme esforço e determinação dos construtores da Europa de hoje, comumente conhecida por União Europeia, o certo é que essa Europa progressista, nascida no pós-guerra e fruto de visionários esclarecidos, acabou. Embora a sua certidão de óbito só tivesse sido passada quando da crise financeira de 2008, curiosamente provocada pelos desmandos norte-americanos associados ao imobiliário, o final desta Europa de Monet, de Schumann e de outros já era esperado a partir do ultimo alargamento, este por sua vez resultante da détente europeia de 1989. Incapazes de integrar-se no movimentado e sinuoso mundo da globalização, os países do Leste europeu dificilmente se vêm ajeitando às numerosas directivas, regulamentos e avisos emanados da burocrática Bruxelas, apesar do esforço que os respectivos governos têm revelado. Cansados de lutar, alguns destes países viraram à direita, sempre com o espectro comunista na memória. Mas não apenas estes novos países do ultimo alargamento se ressentem, mas outros países periféricos desse mundo novo (agora já com mais de meio século) começaram tambem a sentir dificuldades em acompanhar o ritmo desenvolvimentista dos países originários da UE mais desenvolvidos. Começou assim uma guerra de várias frentes, com vários protagonistas e com várias estratégias em confronto.
          Conscientes de que a sua sobrevivencia nesta guerra de interesses e de influencias económicas depende da melhor ou pior forma como a integração alemã resultar, os alemães apostaram na integração europeia como corolário dessa mesma integração alemã que, apesar dos enormes esforços dos vários governos que se vêm sucedendo na nova Alemanha, experimenta dificuldades ainda não completamente ultrapassadas. Em contrapartida, o declinio que a França tem vindo a registar desde a queda de Mitterand e o cada vez maior isolamento da Grã-Bretanha relativamente às questões europeias, têm permitido que a Alemanha assuma o comando das operações em Bruxelas. Temos assim uma primeira e mais importante frente desta guerra europeia, que resulta do confronto dos grandes países entre si para controlarem a UE em seu próprio beneficio. Por um lado, a Alemanha, cuja estratégia é a sobrevivencia dum país grande e unido, capaz de ser a referencia europeia na arena mundial globalizada. Por outro lado, a França, em vias de islamização acelerada, a perder vigor e importancia, com a ameaça da extrema-direita anti-europeia cada vez mais à espreita, não quer perder o seu estatuto de país decisor nas grandes questões europeias. Finalmente, a Grã-Bretanha, com a guerra contra o IRA resovida e de novo a dar cartas nos mercados financeiros, não quer perder os pergaminhos de grandeza que, com a ajuda americana, conseguiu ganhar enfrentando corajosamente a invasão nazi. Esta é a frente de combate essencial na guerra europeia, mas não é a nossa frente de combate.
          Outra frente desta guerra europeia é a guerra contra a evidência, protagonizada pelos paises mais débeis que foram sujeitos às agruras da austeridade. Essa é a nossa guerra. A Grécia primeiro e agora Portugal enfrentam um problema sério de sobrevivência enquanto países soberanos e autónomos. O excessivo endividamento externo e a dificuldade crónica no controle do défice publico destes dois países europeus são fenómenos da maior importancia no contexto comunitário. Uma vez admitidos no seio dos países do euro, gregos e portugueses obrigaram-se perante os restantes membros do euro-grupo a sujeitarem-se a regras orçamentais muito rigorosas que têm a ver prioritariamente com a saude da própria moeda comum. Não aceitando a posteriori a submissão a essas regras, Portugal (e a Grécia) coloca-se numa posição muito melindrosa, pois com a sua atitude, compromete não só o futuro do país, como sobretudo (aos olhos dos seus parceiros do euro-grupo) o futuro do próprio euro como moeda de referencia mundial. Não se trata portanto, como muitos querem fazer crer, de uma qualquer estratégia malévola dirigida contra os portugueses (ou contra os gregos) por serem pobrezinhos. O que os países do euro-grupo não querem é que portugueses e (ou ) gregos venham dar cabo duma estratégia essencial para a preservação da UE como organização charneira nos destinos do mundo globalizado de hoje. Para isso são necessárias reformas profundas e urgentes nos respectivos países, que põem em causa interesses adquiridos e formas de ver o mundo diferentes daqueles a que portugueses (e gregos) estão habituados, por anos e anos de incompetencia e de aleivosia governativas, que deixaram Portugal (e a Grécia) pelas ruas da amargura e que agora alguns não querem reconhecer nem aceitar. A soberania não se recebe, nem se herda. A soberania impõe-se através de  trabalho árduo, sério e proficuo, reconhecido por todos os que por nós se interessam e não se conquista com falsas promessas ou reivindicações balofas. Isso é troçar dos portugueses e julgar que todos somos estupidos e calões. Queira o novo Presidente da Republica assumir esta luta que terá consigo, estou certo disso, a maioria dos portugueses. Esta é a nossa guerra!

       ALBINO  ZEFERINO                                                                                      20/2/2016

domingo, 7 de fevereiro de 2016

O MURO DA VERGONHA



          Em 1961, o então Presidente da antiga Alemanha Democrática ou do Leste, Erich Hoennecker, mandou erigir um muro de 145 Kms, dividindo a antiga capital do Reich alemão em duas partes, uma correspondendo à zona soviética de Berlim, capital da RDA, e outra correspondente às zonas britânica, norte-americana e francesa, que ficou conhecida por Berlim ocidental, ou zona livre do comunismo. A capital da RFA tinha sido transferida, em 1949, para Bona. A zona livre de Berlim era administrada pela RFA e beneficiava do regime verdadeiramente democrático vigente na RFA. A construcção desse muro intransponivel deu origem a um verdadeiro cerco de Berlim ocidental pelas forças autoritárias do comunismo. O muro passou a chamar-se "muro da Vergonha", pois dividia os cidadãos berlinenses, consoante o lado em que residiam, entre o comunismo e o capitalismo. De um lado, Berlim era desenvolvido, alegre e rico, do outro, Berlim era uma cidade parada no tempo, sem luz e sem esperança para os que ficaram com a desdita de aí morarem. Não podiam passar para o outro lado senão eram abatidos sem aviso pela policia da RDA, a famosa "Stasi". Muitos morreram na tentativa de saltarem o muro, outros, muito poucos, foram conseguindo fugir, iludindo os ferozes algozes comunistas, que disparavam contra eles impiedosamente. Esta situação durou, como se sabe, até 1989, quando, por força da perestroika e na sequência dum movimento expontâneo da população berlinense de ambos os lados, o muro foi abatido e o comunismo foi irradiado da Alemanha, ficando o país de novo unido, como felizmente hoje ainda está.

          A Alemanha, de novo unida, erigiu-se, a partir de então, como o motor da União europeia, graças ao enorme esforço económico e social que a RFA empreendeu na integração politica e económica entre as duas partes do país, que ainda hoje perdura. O alargamento da UE aos países do Leste europeu foi tambem uma das consequencias desse esforço integrador patrocinado pelo eixo franco-alemão e foi assim que a Europa de hoje se transformou numa potencia mundial de primeira grandeza. Foi na sequência desse movimento que surgiram os novos tratados europeus de Maastricht, de Nice, de Schengen e de Lisboa, que deram novo corpo à unidade europeia e que devolveram ao continente europeu o seu actual estatuto de lider mundial, a par dos EUA.

          Contudo, com o aparecimento do terrorismo internacional, após os ataques às torres gémeas em Nova Yorque, consubstanciado na Al-Qaeda e depois no ISIS, e em consequencia disso, com o surgimento em força da imigração árabe e muçulmana em direcção à Europa, a situação na UE mudou radicalmente. A própria integração europeia, em fase de concretização lenta e diferenciada, começou a ser contestada, sobretudo pelos países membros mais atrasados (isto é, por aqueles cuja integração mais esforços reclama). É o que se verificou com a Grécia e com Portugal e tambem com a Itália e com a Espanha e com vários países do leste europeu. A crise financeira de 2008 atingiu em força as populações europeias menos preparadas e começaram a surgir, aqui e ali, forças politicas que, aproveitando-se do descontentamento popular, surgiram com teses mais radicais que punham em duvida as virtualidades duma Europa unida e progressista. Foi assim na Grécia, em Portugal e em Itália, com o advento de partidos de extrema-esquerda em franca ascenção e na Hungria, em França e na Polónia, com a subida ao poder de partidos da extrema-direita, que defendem uma maior desvinculação das regras comunitárias, pondo assim em causa o projecto integrador europeu.

          Não será com a erecção de muros fisicos que os defendam duma imigração indesejada, ou com a instalação de muros psicológicos que obnubilam as mentalidades assustadas dos mais pobres, que os governos de direita da Hungria e da Polónia, ou os governos esquerdistas da Grécia e de Portugal, vão conseguir destruir um projecto onde cabem todos e onde todos, se souberem entender-se, se reverão num futuro de progresso e de paz, livre de constrangimentos e de dificuldades. Saibamos construir com trabalho, sensatez e inteligencia o unico caminho possivel para um futuro risonho e feliz onde possamos mostrar ao mundo as virtualidades dum sistema de paz social e de progresso económico, que todos desejamos e que já muito caminho percorreu.

                  ALBINO  ZEFERINO                                                               7/2/2016

         

       

terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

PRENUNCIO DE UMA MORTE ANUNCIADA


          Decididamente a Europa não consegue sair deste novelo preverso em que está enrolada. Foi a crise financeira de 2008, é a crise bancária que lhe sucedeu, são os refugiados do sul e do leste que não cessam de acorrer às fronteiras Schengen, é a ameaça britânica do isolamento, é a probabilidade da eleição de Le Pen em França, são os putativos sucesores de Obama que não sabem nem querem saber da Europa e é sobretudo a falta de vontade em continuar no caminho da união expressa nas urnas europeias. Desde a Hungria e a Polónia que elegeram governos anti-europeus, até às frentes de esquerda na Grécia, em Portugal e provavelmente em Espanha, que sempre manifestaram reservas substanciais à integração europeia, tudo indica que o desmantelamento duma obra genial começada há 70 anos está a tomar forma.
          O Observador de ontem cita a propósito Joschka Fischer (ex-dirigente dos verdes alemães e ex-ministro federal dos Negócios Estrangeiros) num texto em que reflecte sobre os efeitos do desaparecimento gradual da Pax Americana: "Welcome to the Twenty-First Century". Diz Fischer: "The bleak prospect of European suicide is no longer unthinkable. What will happen if German Chancelor Angela Merkel is brought down by her refugee policy, if the United Kingdom leaves the European Union, or if the French populist Marine Le Pen captures the presidency? A plunge into the abyss is the most dangerous outcome imaginable, if not the likeliest."
          Não querendo antecipar tão horroroso desfecho para esta Europa unida com cuspo, fico porem apreensivo quando constato que grande parte dos países membros desta União de boas vontades (pois por enquanto a UE não passa disso) estão a criar defesas em volta de si proprios, em vez de se esforçarem por criar entre si politicas unitárias que possam, em conjunto e harmonizadas entre todos, fazer frente a estes e outros desafios que ameaçam a unidade deste continente sacrificado, que outrora deu novos mundos ao mundo e civilizou a humanidade inteira. Não é possivel baixar os braços quando alguns fanáticos inconscientes põem em causa séculos de civilização e de cultura para afirmarem alarvemente os instintos básicos pelos quais pautam as suas inuteis vidas e destroem a obra de gerações inteiras de geniais construtores de civilizações.

                           ALBINO ZEFERINO                                           2/2/2016