quinta-feira, 25 de agosto de 2016
O PAÍS DOS BURACOS
Os portugueses gostam muito de ser originais. Ganham sem ter chegado em primeiro lugar, festejam as derrotas como se fossem vitórias, choram quando precisam de trabalhar, disfarçam quando têm que decidir, fazem revoluções sem sangue mas com cravos, gostam de aparentar o que não são e o que não têm, mas acima de tudo perdem-se por buracos. Buracos no verdadeiro sentido da palavra e buracos no sentido figurado desta.
Se repararem bem, as ruas e as estradas portuguesas estão sempre cheias de buracos. De vez em quando lá se tapam alguns, mas sempre de maneira provisoria, de forma a que pouco depois lá surgem de novo os buracos. E assim sucessivamente. Quando se tapa um buraco num lado, aparece logo outro noutro. É uma espécie de fatalidade buracal aquela em que vivemos.
Mas não só no sentido etimológico do termo se materializa esta fatalidade. Ela tambem surge no figurado. Se não, vejamos. As famosas imparidades (forma subtil de chamar os calotes) abundam nas contas do Estado e dos bancos portugueses. Como os portugueses são malucos por buracos não prescindem deles nunca. Mal um é descoberto (normalmente por estrangeiros maldosos) começa a lenga-lenga de como tapá-lo. E ainda antes de tapado este, logo outro aparece, não vá estarmos um longo periodo sem buracos.
Neste momento em que escrevo temos vários buracos abertos, uns em via de serem tapados, outros ainda na fase de saber-se como tapá-los e outros ainda a espreitar a sua oportunidade para aparecerem a céu aberto. Os buracos ainda por tapar são, por exemplo: O BES/GES e o descalabro da sua gestão; o Novo Banco e a sua famosa resolução; o Sócrates e o mistério dos seus gastos milionários; o BANIF, vendido sem o buraco que ficou aberto para nós taparmos; o Montepio, com um buraco ainda por desvendar a sua profundidade; a CGD, que precisa de rectificativo para tapar o enorme buraco que está aberto a todas as intempéries há já algum tempo; os buracos do Oliveira e Costa que lá vai vivendo à espera que um milagre tape os buracos que abriu no BPN, etc.etc.
Mas mais grave ainda é o buraco em que Costa e a sua geringonça nos meteram a todos. Como querem aquelas almas tapar todos estes buracos, sem contrair nas despesas que os provocaram? Os buracos surgiram pelo excesso de despesa (leia-se empréstimos sem garantias aos amigos, provisões deliberadamente baixas e enganadoras, excesso de pessoal administrativo para esconder o desemprego, empresas e serviços publicos desnecessários, PPP`s enganosas e ruinosas para o estado, processos judiciais parados por interesses pessoais, obras publicas de fachada para obtenção de votos,etc.etc.).
A forma torpe e vergonhosa como foi resolvido o buraco da CGD, obrigando a orçamento rctificativo (onde vai o governo buscar os 5.5 mil milhões necessários para a recapitalização da Caixa? Á divida publica certamente!) vai dar que falar. O dinheiro não vem sem que vão para a rua os 2.500 funcionários excedentários e o PCP já avisou que vai votar contra no parlamento. Como vai ser? Terá Costa suficiente jogo de cintura para este baile?
Marcelo já se está prudentemente a demarcar (opôs-se à alteração da lei dos gestores, truque costista para ultrapassar as vexatórias condições impostas por Bruxelas para a gestão da Caixa) e Jerónimo já disse alto e bom som que não alinha naquilo que considera submissão vexatória a Bruxelas. As gajinhas estão silenciosas à espera que a borrasca passe. A coisa ainda não estalou tambem por culpa da Oposição, que não tem mostrado, nem genica, nem determinação inovadora. Marcelo está esperando para ver. Mas não espere muito, que ainda cai num buraco daqueles que os portugueses muito gostam.
ALBINO ZEFERINO 25/8/2016
quarta-feira, 24 de agosto de 2016
GANDULAGEM
A cena de pancadaria da semana passada em Ponte de Sôr, que quase matava um jovem local, envolvendo dois iraquianos filhos de diplomata acreditado em Lisboa, leva-me a pensar sobre o abuso da imunidade diplomática consagrada na Convenção de Viena, que hoje se verifica a quase todos os niveis e em todos os países.
A dita convenção surgiu nos anos 60 do seculo passado, no rescaldo da 2º guerra mundial e na sequência do redesenho do mapa mundo que, como se sabe, ficou dividido em dois grandes blocos, o do mundo comunista, comandado pela URSS e o do mundo livre, comandado pelos EUA. Desta divisão nasceu a guerra fria, que caracterizou a segunda metade do seculo 20 e que pôs duas concepções de vida frente a frente. O caso mais paradigmático foi o das duas Alemanhas, a Alemanha dita democrática ou do Leste e a Alemanha federal ou dita ocidental. Ambas eram alemãs, produto da divisão artificial do país depois da Guerra, em ambas se falava alemão, familias inteiras ficaram divididas por décadas, mas a vida quotidiana dos cidadãos era distinta (para não dizer oposta) em ambos países. Estive lá nessa altura e pude constatar o que digo pessoalmente.
Deste facto surgiu a necessidade de colocar os países no mesmo patamar uns dos outros (já que não era possivel garantir a liberdade e a fraternidade para todos ao menos que ficasse consignada a igualidade para todos). Até então havia os países soberanos e as colónias, os estados unos e indivisiveis e os estados imperiais onde o sol não se punha nunca, os estados tampão e os estados continente, em suma, os que mandavam e os que obedeciam. Com o fim da guerra, que foi mundial por ter envolvido todos (uns mais do que outros), houve a necessidade formal de põr todos no mesmo saco, ou seja, obedecendo todos às mesmas regras gerais. Daí o nascimento da CEE na Europa, da Declaração universal dos direitos do Homem nas Nações Unidas e da Convenção de Viena para as relações diplomáticas. Nesta, ficaram definidas as regras básicas que regulam as relações formais entre os estados e donde resulta o principio da imunidade e dos privilégios diplomáticos para os respectivos agentes. Quer isto dizer que os diplomatas acreditados em determinado país gozam, nesse país, de imunidades e privilégios que os demais cidadãos não usufruem. Não significa que não estejam obrigados a cumprir a lei, apenas que o cumprimento dessa obrigação é-lhes imposto, não pelas autoridades do país onde vivem, mas pelas autoridades dos seus países de origem. Ora isto obriga a que os países de origem desses funcionários (e das suas familias que com eles convivam) aceitem as mesmas regras de convivencia das vigentes nos países onde vivem e onde gozam dessas imunidades.
Entrados francamente no século 21 e várias guerras (e gerações) depois da 2ª grande guerra, é natural que os países de hoje já não observem as mesmas regras de conduta comuns que a convenção de Viena pressupunha quando foi assinada. Eu diria mesmo que a maioria dos países signatários da dita convenção não existiam ainda quando ela foi assinada. É o caso concreto sobre o qual hoje escrevo. O Iraque de hoje não é o Iraque dos anos 60 de 1900 e muito menos o Iraque da Mesopotamia que os livros de história ensinam. O Iraque de hoje é um país desfeito por várias guerras ferozes que ainda não conseguiu por-se de pé apesar (e talvez por causa) do seu petróleo. Não será pois de admirar que os representantes diplomáticos iraquianos (e sobretudo os seus familiares) não consigam distinguir o verdadeiro significado da imunidade diplomática de que gozam do simples exercicio da prepotencia sobre os demais cidadãos. Era como se dessemos a um jovem imberbe uma metralhadora para brincar sem lhe explicar que carregando no gatilho poderá matar todos à sua volta sem se dar conta disso. É o que se passa em certos países africanos.
Em conclusão, é a meu ver necessário que, antes de fazer uma séria e profunda revisão na convenção de Viena sobre relações diplomáticas ( o que julgo não será possivel antes duma nova guerra mundial que volte a por em causa as relações entre os diferentes estados), devemos julgar (nos tribunais, nas esquadras de policia, nas chancelarias diplomáticas e na imprensa em geral) casos como este de Ponte de Sôr, sem demagogias baratas, sem aproveitamentos politicos demagógicos e com o pragamatismo e a coragem que se espera dum governo dum país velho de quase 900 anos, o que não foi mais do que uma acção de gandulagem que resultou mal, porque teve consequencias más.
ALBINO ZEFERINO 24/8/2016
sábado, 20 de agosto de 2016
AINDA O BREXIT
Após o embate inicial resultante do referendo britânico, que deixou ingleses, escoceses, galeses e irlandeses do norte preocupados e os restantes europeus sem saber o que fazer com esta nova partida que os britanicos lhes fizeram, parece que os media esqueceram que o problema, não só não se resolveu ainda, como está longe de estar definida uma estratégia para a sua solução. Á falta de noticias, quer de Londres, quer de Berlim, quer de Bruxelas, os correspondentes diplomáticos têm estado muito caladinhos, não vão dizer disparates que assustem os cidadãos comunitários ainda mais do que já estão.
À parte as demissões dos principais responsáveis pela tragédia anunciada (Cameron, Johnson, Farage e quejandos) que, como ratos em navio a arder, fugiram a sete pés do cenário desta tragédia, nada se alterou no cenário bucólico institucional da União europeia. A Comissão prossegue com as suas actividades (é certo que sem o comisário britânico que, muito à inglesa, se demitiu logo a seguir ao anuncio do Brexit), o Parlamento europeu dá palpites isolados segundo as cabeças pensantes dos deputados que vejam microfones pela frente, e o Conselho de ministros foi a banhos. Contudo, a questão não morre por si só, por ser muito grave.
Teresa May, a nova lider britânica (pró-europeia), já disse que o Brexit é para cumprir (ou terá sido apenas um golpe para a escolha de Boris Johnson para Foreign Secretary sem o pelouro das negociações do Brexit?). Só não disse como. Se fosse apenas para limitar as avarias (como se diz na marinha) já teria certamente preparado com Westminster e com Bruxelas a invocação do famoso artº 50 do tratado de Lisboa, condição indispensável para o inicio formal das negociações tendentes ao abandono de um Estado membro da União. Mas disso, vade retro, nunca mais ninguem ouviu falar. O que irá então acontecer?
O RU quer sair da UE mas não prescinde do acesso ao mercado único europeu. Para isso terá que aceitar a livre circulação de bens, o que não recusa. Recusa sim a livre circulação de pessoas, que foi precisamente a grande razão invocada pelos defensores do vitorioso Brexit. Ora sem a aceitação de imigrantes, não há acesso ao mercado único, dizem os tratados europeus. Por outro lado, a Escócia (e tambem a Irlanda do Norte) já afirmaram que sairiam do Reino Unido se este pedisse a saida da UE. O que aconteceria ao RU sem a Escócia (e a IdoN)?
Do lado europeu, logo que seja apresentado o pedido de saida do RU da UE, iniciam-se as negociações para essa saida (como, quando, em que condições, como ficam as relações: acordo de associação, acordo à norueguesa, acordos pontuais à suiça?). Para que a saida (seja ela qual for) tenha viabilidade, os seus termos terão que ser aprovados pelos 27 Estados membros remanescentes. Será que todos os EM estarão de acordo com as fantasias britânicas? Será que a UE aceitará a Escócia como Estado membro independente do RU? Será que os europeus, nomeadamente os espanhois, aceitarão o desmembramento do RU? Outras duvidas existenciais se levantarão certamente ainda no andar do processso. Se for este o caminho escolhido, prevejo grandes problemas para o RU e tambem para a UE.
O que fazer então? Como irá prosseguir este assunto? A meu ver, a nova PM do RU quererá legitimar o seu lugar atraves de eleições. A ser assim, o mote da campanha eleitoral será necessariamente a concretização do Brexit. Conservadores e Trabalhistas não deixarão de acentuar as dificuldades que o referendo trouxe para o RU no seu todo e farão campanha para que a maioria vencedora rectifique o resultado saído do referendo. Não sendo este vinculativo, nada impedirá que uns meses depois das eleiçoes legislativas possa ser convocado um novo referendo sobre o Brexit do qual resulte uma resolução diferente da do anterior. A ser assim, o problema ficará resolvido e o RU permanecerá na UE. Até quando, isso não sei!
ALBINO ZEFERINO 20/8/2016
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