segunda-feira, 25 de abril de 2016

A EUROPA DOS PEQUENOS PASSOS


          Acaba de ser dado mais um pequeno passo no sentido duma maior integração europeia. Um pequeno passo, ainda hesitante mas determinado, que se for plenamente conseguido, se transformará num passo decisivo para o futuro do desenvolvimento europeu. Refiro-me à decisão tomada pelos ministros das Finanças do euro-grupo (onde curiosamente participou o nosso ET Centeno) sobre os condicionalismos ao aumento da despesa publica nos países do euro. Parece ter ficado decidido (esperemos que definitivamente) que o aumento da despesa publica orçamentada ficará condicionado ao indice do crescimento de cada país. "Sound`s fair", como diriam os americanos quando pretendem vincar a lógica cartesiana de uma ideia ou proposta inesperada. De facto, não parece lógico que haja aumentos de despesa por parte do sector publico (normalmente improdutivo por natureza) se o PNB não tiver crescido em conformidade. De contrário, quem pagaria esse aumento de despesa? A divida publica à custa do contribuinte, que é quem tem que a pagar.
          Como se vê, o passo aparentemente simples e discreto (pequeno portanto), se dado com determinação e vontade de avançar, transformar-se-à num grande passo, na medida em que evitará o crescimento automático das dividas publicas, fruto das decisões demagógicas dos governos dos países que as tomam e que se baseiam normalmente em razões de natureza eleitoralista. Dirão os mais cépticos que este passo foi sobretudo um passo no caminho da federalização da UE. Não poderei negá-lo, mas perguntarei à laia de contestação, se a mutualização das dividas publicas dos Estados Membros, tão defendida pelos esquerdistas que se opõem sistematicamente aos avanços comunitários, não seria, ela própria, um enorme passo no sentido da federalalização da UE, caso fosse feita. Não podemos ter chuva no nabal e sol na eira ao mesmo tempo. O nosso destino é europeu e só dentro da UE poderemos subsistir.
          Atrever-me-ia a perguntar a mim mesmo se este enorme passo acabado de ensaiar por Djosselborn e os seus pares não estará ligado precisamente a uma eventual mutalização das dividas dos países do euro? É que sem um encontro de contas será dificil que a UE possa recuperar desta violenta crise que parece não querer desaparecer. Uma vez libertos os países mais devedores (ou aliviados conforme os casos) das dividas incomensuráveis que contrairam, já poderiam lançar-se em politicas desenvolvimentistas, que são naturalmente despesistas (mas nestes casos despesas virtuosas que apontam para o desenvolvimeto económico e não para o aforro improdutivo).
          Continuo a pensar que é dentro das politicas definidas e elaboradas em Bruxelas que Portugal (e os outros paises do euro) poderá progredir equilibradamente e consistentemente num desenvolvimento harmonioso da sua economia e portanto benéfico para os seus cidadãos. Outras formas de encarar a solução dos problemas que nos afectam e que condicionam o nosso desenvolvimento como país civilizado e integrado numa entidade maior que nos permita emparceirar com os grandes deste mundo é pura fantasia que só nos confunde e deprime e não conduz o nosso país a lado nenhum. A opção tomada faz hoje 43 anos leva-nos a pensar que não existe outro modo de viver hoje livre e em paz com os outros e conosco próprios. A queda do muro de Berlim em 1989 foi esta mensagem que nos deixou. Saibamos entendê-la bem e seremos tambem bem entendidos.

                            ALBINO  ZEFERINO                                         25/4/2016

sábado, 23 de abril de 2016

ESTABILIDADE E REFORMISMO OU A REALIDADE ENGANOSA


          Passo a passo o governo de António Costa lá vai fazendo o seu preclitante caminho do tem-te e não caias. Agora com a ajuda interessada (e interesseira) de Marcelo presidente, Costa passou mais um obstáculo: a apresentação ao publico do Plano Nacional de Reformas e do Programa de Estabilidade Financeira. Com a coisa a rodar, a geringonça já pode ir a Bruxelas mostrar os documentos, acenando aos exigentes europeus com o apoio dos jornais, do presidente e dos comentadores televisivos. Teve porem o cuidado de não levar a coisa ao Parlamento, não fossem os esquivos parceiros começar a perguntar-lhe coisas desagradáveis e a pôr em causa o seu apoio formal.
          A estabilidade propugnada no programa assenta no aumento do consumo resultante das devoluções dos cortes feitos pelo governo anterior.  Se não fosse triste, era risivel esta argumentação. Se se espera que o povinho aumente os seus gastos com os tostões que o governo socialista lhe vai devolver em ordenados de miseria, então as previsões são no minimo ingénuas. Como querem estas almas que a produtividade aumente sem que haja investimento macisso nas industrias e nos serviços? Diz quem sabe, que as previsoes do governo são demasiado optimistas e que o programa inclui medidas por explicar, cujos resultados podem não corresponder ao esperado.
         Quanto às reformas anunciadas no plano, a coisa ainda é mais nebulosa. Reformas propriamente ditas não há. O que há é alterações procedimentais, que dificilmente trazem algum beneficio financeiro ao equilibrio das contas do Estado. O funcionalismo publico é modernizado, mas sem despedir ninguem. Quanto se poupará? O numero de alunos por aula é reduzido, mas sem aumento de despesa na contratação de novos professores. Vão ser reduzidos os salários do professorado? O SNS será melhorado, ao mesmo tempo que se reduzem as taxas moderadoras. Onde se vai buscar o dinheiro que necessariamente faltará? Fala-se em democratizar as CCR. O que significará isto? Voltar à discussão sobre as virtudes da regionalização do território?
          Não creio que possa durar muito esta governação fingida, mentirosa e irreal. Não é com mentiras, jogos de cintura ou demagogia enganadora que se governa um país em crise profunda, endividado até aos copos e sem capacidade alguma de manobra nesta borrasca tempestuosa onde navega. Os europeus têm hoje mais em que se preocupar do que no destino radioso deste Portugal à deriva. Tenhamos juizo e não nos deixemos enredar em falácias e em fantasias que distorcem a realidade dura e impiedosa em que vivemos. Sem a prossecução de politicas verdadeiramente reformistas que nos conduzam a uma estabilidade perdida por anos e anos de roubalheiras e de aproveitamentos criminosos, nunca mais sairemos da cêpa torta onde há mais de 40 anos nos fizeram cair.  Valha-nos algum juizo e a determinação de poucos ainda, para nos conduzirem a bom porto. Senão, adeus Portugal!

               ALBINO ZEFERINO                                                                      23/4/2016

domingo, 17 de abril de 2016

A CORRUPÇÃO E OS PAPEIS DO PANAMÁ


          Muito se tem falado ultimamente acerca dos famosos papeis do Panamá que levantaram o espinhoso e sensivel problema dos "off-shores".  Mas afinal o que são os "off-shores" e para que servem?  Prosaicamente os "off-shores" são, como o seu nome indica, "locais para além da margem", ou seja, locais longe das vistas alheias, normalmente com mar pelo meio. E para que servem estes locais escondidos, com pouca visibilidade (hoje dir-se-ia com opacidade) e de dificil acesso?  Pois naturalmente para lá se guardar aquilo que não se quer que seja visto.  E só se esconde aquilo que não se quer mostrar.  Sendo o ser humano vaidoso por natureza e gostando de provocar a inveja alheia, não parece natural que esconda aquilo que genuinamente possui ou detém legitimamente. Por exclusão de partes então, o que esconde, oculta para que não se saiba que possui. E só se esconde o que se possui quando isso é proveniente de origens ilegitimas, por vezes ilegais mesmo, mas sempre de origens moralmente duvidosas.  Desde resultados de simples furtos, a partes de fortunas não declaradas ao fisco ou aos outros co-herdeiros, ou a produto de negócios ilicitos ou moralmente condenáveis. A vergonha ou o medo de ser apanhado terá necessariamente que ser maior para o titular dum "off-shore" do que a vontade se esmagar o parceiro com a exibição dessa riqueza.

          Mas nem só para esconder bens de origem inconfessável servem os "off-shores".  Muito boas pessoas (ou pessoas de bem) têm "off-shores" constituidos no simples intuito de fugir ao fisco.  A fuga ao fisco é proporcional à repulsa gerada no espirito do contribuinte pela obrigação cívica do pagamento dos impostos. E essa repulsa é tanto maior quanto a convicção que se instala na mente do contribuinte de que o destino final da sua contribuição cívica, traduzida no pagamento voluntário do imposto que lhe cabe, não é canalizada para os fins a que o Estado se propunha inicialmente. Por outras palavras, o contribuinte  relapso, ao esconder o seu dinheiro do Estado, não acredita que os impostos que deveria pagar (e que não paga porque se evadiu a esse pagamento através do "off-shore") sejam gastos em acções legitimas praticadas pelo governo. Trata-se, como se vê, dum processo psicológico provocado pela acção ilegitima do governo que impele o contribuinte a não desejar contribuir para um mau gasto do seu dinheiro, preferindo incorrer numa falta (agora essa falta está criminalizada em Portugal) a entregar o seu dinheiro à incompetência e à gestão danosa (e por vezes criminosa até) de governos incompetentes e ilegitimos, a seu ver.

          Compreende-se assim que neste mundo cada vez mais orwelliano em que vivemos, os meios informáticos se intrometam cada vez mais nas nossas vidas e denunciem cada vez mais situações objectivas e moralmente incorrectas. A acção denunciadora destes processos (Panama papers, Wikileaks e outros menos conhecidos), à partida intrusiva (e portanto incómoda) não deixa de trazer à sociedade os meios de se regenerar, quer materialmente, quer juridicamente e até legalmente, a fim de combater os flagelos que o desenvolvimento tecnológico vem destapando.  Os "off-shores" não são por si mesmos ilegais, podem é servir (o que acontece na maioria dos casos) para encobrir negócios sujos que convém combater e tentar desmontar à medida que aparecem. Não é acabando com os "off-shores" (o que tambem se me afigura dificil, pois a sua existencia depende dos governos de cada país ou região onde se encontre o "off-shore") mas usando os meios ao dispor dos governos (que cada vez são mais sofisticados) para tentar erradicar o flagelo da corrupção das nossas sociedades.

          Mas não é só atacando os "off-shores" que a corrupção é combatida. Como em todas as questões melindrosas, há que atacar as causas antes de combater as consequencias. Todos os males têm causas exteriores ao fenómeno visado. A corrupção feita através do exercicio da função politica (os favores, os jeitos, os arranjinhos, os financiamentos partidários, as mordomias informais, os empregos politicos, os negócios entre e com os politicos, etc.etc.) tem que acabar (ou ser contida, ao menos). De outra forma quem sofre são os países, é a democracia, são as instituições e finalmente são os cidadãos que são a causa da politica, a sua origem e a sua justificação.  Sem cidadãos pagadores de impostos, não haveria politicos. Não devemos matar a galinha dos ovos de ouro, senão ainda ficamos sem ovos.

        ALBINO  ZEFERINO (correspondente diplomático aposentado)                   17/4/2016