quarta-feira, 25 de julho de 2012

PORTUGAL INGOVERNÁVEL

Diz-se para aí que os portugueses são ingovernáveis. Seja que governo for que esteja no poder, parece nunca conseguir cumprir as promessas que fez ao eleitorado que lá o pôs. Por muito boa vontade que os primeiros ministros aparentem em cumprir os programas de governo que diligentemente elaboraram e honestamente apresentaram ao eleitorado, o certo é que até agora nenhum ainda conseguiu cumpri-los. Sócrates não conseguiu, Guterres tão-pouco, Cavaco nem falar, Barroso fugiu de vergonha de não conseguir e Passos ainda menos consegue. De Soares e dos anteriores nem vale a pena falar pois nenhum desses fez ideia do que era governar ou dirigir um país.
                    Será culpa exclusiva deles? Será que os ministros serão todos corruptos como diz o Januário? A culpa é toda da Intersindical que, desesperada, prefere a politica da terra queimada à cedência nos seus anquilosados principios? Não creio. Desde Viriato que os lusitanos arranjaram fama de empedrenidos reagentes às mudanças que o desenvolvimento acarreta. Desconfiados de tudo e de todos, com uma dose de manha entranhada no seu ADN árabe-judaico e um cinismo subserviente muito do agrado dos estrangeiros, os portugas são um povo relativamente homógeneo que só agora começa a sentir os efeitos das misturas étnicas e do intercambio de ideias que a civilização global trouxe para Portugal. Às experiências ultramarinas a que a nossa história e a nossa geografia nos obrigaram sucedeu uma repentina e quase abrupta invasão de novos métodos de trabalho e de novos paradigmas oriundos do Leste aos quais a nossa famigerada idiossincrasia inconscientemente reage. Nisso somos conservadores. Nas ideias não. Aceitamo-las imediatamente com entusiasmo infantil e optimismo primário para depois  as recusarmos com sobranceria bacoca quando sentimos que os nossos interesses pessoais possam de uma ou de outra forma vir a ser afectados. Somos um povo ao mesmo tempo simples e complexo, dificil de contentar mas generoso com o seu próximo, dogmaticamente intransigente mas inconscientemente permissivo, desejamos simultaneamente ter sol na eira e chuva no nabal. É com esta gente que Passos tem agora que governar. Porque malgré tout, ainda não começou a governar a sério. Senão vejamos.
                    O famoso memorando da troika tem umas boas dezenas de páginas mas apenas um objectivo: diminuir os gastos do Estado. E onde é que o Estado mais gasta? Em excessos. Excesso de pessoal, excesso de funções, excesso de empresas publicas, excesso de atribuições, excesso de regalias, excesso de tarefas, etc. etc. E o que tem feito o governo para reduzir estes excessos? Eu diria que muito pouco. O pessoal do Estado foi reduzido em 17% quando se sabe que 3/4 das despesas do Estado vão para salários. Terá sido suficiente? Não creio, sobretudo considerando que a maioria desses 17% eram funcionários à beira da reforma a quem foi facilitado o acesso à mesma. E quantas empresas publicas com os seus inflacionados quadros de pessoal e os seus gestores politicos foram extintas? Nenhuma direi eu. E empresas municipais? Nenhuma. E já foi iniciada uma reforma do Estado? Não me apercebi. Quantas autarquias foram extintas? Com que critério? Nenhuma. Será que todos os 230 deputados têm trabalho parlamentar útil? Ou mesmo algum? A Constituição prevê um minimo de 180 deputados. Haverá alguma intenção de reduzir o seu actual numero? Desconheço. Quantos assessores tem o Presidente da Republica? 100, 200, 300? Ninguem sabe. Se calhar ele tambem não. Para as funções que lhe estão cometidas serão todos necessários? Não creio. Para que serve a televisão do Estado? Antes do cabo ainda se percebia que sem ela era mais dificil passar mensagens ao povão. Já Marcelo Caetano percebera isso em 1968. Mas hoje para que serve? Para alimentar os egos e as bolsas de umas centenas de pessoas à custa de todos. Será isto aceitável em plena recessão económica? Não creio. Quantos funcionarecos do Estado têm direito a carro, motorista, telefone e cartão de crédito pago pelo erário publico? Centenas? Milhares? E quantas secretárias de ministros são conduzidas por motoristas às ordens desses ministros. Quantas filhas, mulheres, amantes, sobrinhos, sobrinhas, vizinhos e amigos de ministros beneficiam de regalias que nem sequer os ministros deveriam beneficiar nestes tempos de apertada crise? Eu diria que alguns milhares.
                         E as famigerdas PPP? Já alguma foi revista? Qual? A da Brisa? Ou terá sido a da Lusoponte? Ainda não. E as da saúde? Espirito Santo, Mello e Cia? Pela qual começar? Lá iremos, promete o Álvaro que já parece mais portugues do que canadiano. E os subsidios estatais às empresas que foram do Estado e que entretanto foram privatizadas mantendo os seus gestores que antes eram publicos e que hoje são privados (ou seja, fazem o que querem e como querem) atribuindo-se a si próprios chorudos ordenados e escandalosas benesses à custa dos subsidios que o Estado continua a conceder-lhes com a desculpa de que prestam um serviço publico (EDP, REN, Sines, Alqueva, Galp, EPAL ,EPUL, etc, etc.). E as famosas Estradas de Portugal, buraco imenso de dimensão incalculável sustentado pelo tão escrutinado orçamento do Estado? E os bancos em dificuldades, coitados? Alguém sabe se algum deles abriu falência como em Londres, Paris ou Madrid? Vade retro, diz Gaspar no seu linguarejar espaçado. Em Portugal há o risco sistémico. Não se esqueçam da lição do Teixeira dos Santos quando nacionalizou o BPN. Ainda hoje estamos para saber quanto aquilo nos vai custar.
                      Um breve e superficial exame da execução orçamental recentemente publicada nos jornais indica que só uma rubrica foi positiva. Ou seja, das receitas do Estado, só o IRS subiu. Significa isto que tem sido à custa dos contribuintes directos (daqueles que pagam IRS) que o governo tem conseguido manter toda esta malta. Será isto justo? Não creio. Se o governo pretende continuar por mais algum tempo em funções (pelo menos até ao fim do programa da troika) então terá que arrepiar caminho. E muito em breve. Não é batendo sempre nas mesmas teclas já cansadas de tocar que a melodia sai mais afinada. Chegou a altura de começar a reformar a sério pois, como o povo diz na sua ancestral sabedoria, sem partir os ovos não se podem fazer omoletas. 

                                             ALBINO ZEFERINO dixit em 24/7/2012  

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