quinta-feira, 5 de setembro de 2013

A QUADRATURA DO CIRCULO


          Deixar ao todo poderoso tribunal constitucional a faculdade de definir o que é legitimo ao governo fazer para reformar convenientemente o país é perverso, inutil e enganador. A divisão de poderes soberanos entre o parlamento que faz as leis, o governo que as executa e os tribunais que julgam a sua correcta aplicação, tem sido a fórmula virtuosa na qual se baseiam as democracias ocidentais desde a revolução francesa. Desvirtuar este processo, permitindo que organismos não eleitos possam bloquear reformas (aprovadas pelo parlamento) indispensáveis para o desenvolvimento do pais, é crime de lesa-pátria e próprio de regimes ditatoriais, onde, a pretexto de enquadrar as decisões governativas dentro dos limites formais de constituições ideologicamente orientadas, se cometem as maiores injustiças e perversidades.
          Em Portugal a coisa ainda é mais grave, pois o governo, empenhado na efectiva reforma do Estado indispensável à regeneração do país, não faz mais do que seguir (como pode) as orientações politico-economicas que lhe são impostas do exterior e que resultam de um compromisso assinado pelos tres partidos do arco da governação (ou seja, os únicos que foram, são e serão governo) com os credores internacionais de quem a sobrevivencia de Portugal depende.  Deixar assim a um bando de juristas privilegiados (escolhidos de acordo com as suas convicções politicas) a faculdade de decidir aquilo que pode ou não ser executado (depois de aprovado pela maioria parlamentar)  revela-se anti-democrático, perverso e limitador do exercicio livre da acção politica que, em democracia, deve recair essencialmente nos partidos.
          Dir-se-à que há formas de desbloquear esta situação (pois em democracia não pode haver bloqueios) que residem fundamentalmente na reforma da constituição na qual assentam as decisões jurisdicionais do tribunal constitucional. Só que para que a constituição possa ser revista necessita de uma maioria qualificada de 2/3 dos votos dos deputados eleitos. E como a maioria governamental não é por si só suficiente para atingir esses 2/3, torna-se necessário o apoio dos deputados do partido socialista (e só deste, pois os outros - BE e PC - não tendo assinado o memorando de entendimento, encontram-se legitimamente fora do arco da governação, tendo-se transformado em meros partidos de contestação).  O PS, porém, considerando que, se colaborar na revisão constitucional, vai perder votos para a esquerda arriscando-se a tornar-se num simples partido de contestação, prossegue numa politica dúbia de apoio ao memorando, mas impedindo que este se cumpra.
          Aqui reside a quadratura do circulo da politica portuguesa actual que só se quebrará quando, depois de eleições legislativas (que provavelmente empurrarão os socialistas para o governo), o novo governo (eventualmente de coligação entre PS,PSD e CDS) consiga uma maioria parlamentar de apoio de 2/3 dos deputados indispensável  para (então sim) rever a constituição de modo a impedir que o tribunal constitucional possa (como  faz hoje) bloquear as reformas estruturais exigidas pela troika para o saneamento financeiro, economico e social de que o país precisa.

                       ALBINO ZEFERINO                   5/9/2013

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