domingo, 2 de março de 2014

A FRONTEIRA LESTE DA UNIÃO EUROPEIA


          Desde a queda da cortina de ferro na Europa que a UE tem vindo a expandir-se para Leste com a sucessiva integração dos antigos países satélites da U.R.S.S. que, passados os respectivos períodos transitórios de adesão, são hoje membros de pleno direito da União europeia. Quer isto dizer que a fronteira oriental da União europeia tem vindo a deslocar-se progressivamente em direcção à Russia, existindo hoje apenas a Ucrânia a separar os dois blocos.
          Independente desde o sec. X, a Ucrânia foi um país permanentemente cobiçado pelos seus vizinhos, tendo sido sucessivamente ocupada pela Polónia e pela Russia e tendo inclusivamente sido partilhada entre estes seus dois vizinhos durante parte do sec. XVII.  Dada a sua enorme extensão territorial e a fertilidade dos seus solos foi considerada nessa altura como o celeiro da Europa. Após a revolução russa de 1917 e o declinio da Polónia, a Ucrânia foi integrada na União das republicas socialistas soviéticas como um Estado federado. Foi ocupada pela Alemanha durante a 2ª Guerra mundial e novamente integrada na URSS no final da guerra. Na sequência do desmembramento da União sovietica em 1989 foi proclamada de novo a independencia do país, ratificada por um referendo popular em 1991, que obteve 90% dos votos populares. A Russia, não tendo querido cortar completamente os laços de dependencia com a Ucrânia, integrou-a na C.E.I. (Comunidade de Estados Independentes) para assim continuar a exercer influência no antigo Estado membro da extinta União soviética. Na sequência da Revolução laranja de 2005, que impôs a democracia de tipo ocidental na Ucrânia,  verificou-se de novo uma tensão nas relações entre a Russia e a Ucrânia. Dessa tensão resultou a queda do governo de Julia Timoschenko (apoiada pela UE) e a instalação de um governo pró-russo na Ucrânia a partir de 2006.
          O interesse russo na Ucrânia resulta hoje de dois factores estratégicos que são: o controle do gasoduto que atravessa o país transportando o gáz russo para a Europa central, nomeadamente para a Alemanha que dele essencialmente depende (o presidente da importante empresa estatal russa monopolizadora do gáz russo - a Gazprom -  é nem mais nem menos do que o antigo Chanceler alemão Gerard Schroeder) e a manutenção do controle sobre a região autónoma da Crimeia (a sul do país) que confronta com o mar Negro onde está a cidade de Sebastopol, importante base naval russa, sede da esquadra naval russa do Mar Negro. A população da região é de origem maioritariamente eslava, sendo por isso pró-russa. A Crimeia foi território russo até ao fim da 2ª GG quando Kruchev a cedeu à Ucrânia (nessa altura uma republica soviética). Por aqui se pode ver o interesse vital para a Russia em manter o controle da Ucrânia através de um governo pró-russo. Os recentes acontecimentos sangrentos ocorridos na Ucrânia não são assim mais do que a manifestação da vontade da maioria da população ucraniana (2/3 da população não são de origem eslava) no retorno a uma democracia representativa de tipo ocidental que possa levar a Ucrânia a fazer parte da União europeia. Aos russos de Putin não interessa pois que a Ucrânia caia na zona de influência da UE.
          A tensão latente entre a Russia e a UE (acompanhada pelos EUA a quem tambem não interressa o controle russo sobre o gasoduto, nem a liberdade de acção da esquadra russa no mar Negro) agravou-se com estas manifestações populares que foram violentamente reprimidas pela policia do regime pró-russo de Vitor Janukovitch, que se viu forçado a fugir para a Russia perante a sua incapacidade de suster esta onda de descontentamento popular. Estão previstas eleições para breve a fim de encontrar uma forma de poder sair deste impasse. Putin porém não lhe interessa que a Ucrânia regresse de novo à democracia ocidental pois arrisca-se a que os ucranianos votem maioritariamente uma adesão à UE (que seria imediatamente concretizada) perdendo definitivamente as possibilidades de controle do gasoduto e da base naval de Sebastopol, tendo enviado imediatamente tropas russas para a fronteira ucraniana mostrando assim que não rejeita a possibilidade duma invasão militar da Ucrânia. A semelhança entre esta explosiva situação e o ocorrido com o Anschluss de 1938 (a anexação pacifica da Austria pelas tropas nazis) é assustadora. Será que a Europa de hoje reagirá como a de 1938, não fazendo nada? Se não, o que fazer? Impedir pela força a eventual invasão russa da Ucrânia? Tenho duvidas que seja essa a boa solução.
          A inesperada e imediata visita de Julia Timoschenko a Berlim (mal foi libertada das masmorras onde o governo pró-russo a encerrara) faz antever o apoio aberto de Merkel a uma eventual candidatura (e provável vitória eleitoral da antiga chefe do governo democrático da Ucrânia) à presidencia do país. Mas será que Putin poderá ser contido por Obama (o presidente americano já fez ameaças publicas ao russo) no seu desespero face a estas evidências? A meu ver, tudo dependerá do resultado das negociações que certamente decorrem entre Merkel, Putin e Obama (os principais actores deste drama). Conseguirão estes convencer o intransigente russo oferecendo-lhe a Crimeia a troco de deixar o restante país à vontade para se unir à União europeia, como parece ser o desejo da maioria da população não eslava da Ucrânia?

                                     ALBINO ZEFERINO               2/3/2014

Sem comentários:

Enviar um comentário