quarta-feira, 22 de janeiro de 2014
CONSTATAÇÕES
Se duvidas houvesse de que o famigerado tribunal constitucional estaria ao serviço da reacção, a decisão de declarar constitucional a não aplicação aos Açores dos cortes salariais decretados pelo governo para todo os funcionários publicos (estivessem onde estivessem e trabalhassem onde trabalhassem) não poderá ser interpretada senão como uma manobra subrepticia de oposição ao governo nacional. A coisa é fácil de ver e, de tão óbvia, não deverá escapar à prespicácia mediana de um vulgar observador da natureza politica desta Lusitania sem rei nem roque.
As autonomias portuguesas ficaram consagradas na constituição da Republica de 1976 com o simples objectivo de descentralizar a governação de parcelas do território nacional distantes geograficamente do centro politico do país e habitadas por almas menos desenvolvidas cultural e civicamente do que a generalidade da população portuguesa. O seu governo é exercido por autoridades locais, eleitas democraticamente através de sufrágios próprios e cujas competencias se circunscrevem aos territórios e às populações dessas autonomias dentro do quadro constitucional da Republica a que pertencem. Uma espécie de subsidiaridade em relação às leis da Republica emanadas dos orgãos nacionais de governo, como hoje se poderia definir a coisa.
Ora o que o tribunal constitucional diz é precisamente o contrário do que deveria dizer. Em vez de verificar se as leis emanadas do governo regional se adequam à lei geral do Estado, o que os doutos juizes fazem é verificar se a lei geral emanada do governo central se adequa às particularidades da malta dos Açores. E que particularidades para os srs. juizes são essas? Segundo essas bestas, a insularidade (seja lá o que isso for, menoridade intelectual, pobreza espiritual, distancia da periférica Lisboa, etc.) justificaria que os funcionários em serviço no arquipélago não ficassem abrangidos pelos cortes salariais decretados pelo governo para toda a gente. Se a coisa se tivesse passado na Madeira, a decisão tribunalicia seria concerteza a oposta. O malvado do Jardim teria que ser posto na ordem (e nesse caso ninguem iria criticar tal decisão). Mas como os Açores são governados pelo PS (para mal dos seus pecados) lá vem o TC aproveitar para mostrar aos tugas que o governo PSD/CDS voltou a por o pé na poça. Mais óbvio do que isto é dificil!
Outra constatação curiosa dum curioso destas coisas como eu, é a recente mudança de agulha da governação socialista francesa. Depois de muito criticar a politica de equilibrio orçamental promovida pela Alemanha para endireitar a Europa desta pesada crise em que a UE se precipitou, Hollande caiu em si e foi forçado a dar uma volta de 180 graus na estratégia socialista de governo, decretando medidas fortes de austeridade para os franceses que, já fartos dos seus desatinos (não só politicos), esperam ansiosos que o homem se vá de vez.
Seria bom que os portugueses atentassem nisto, numa altura onde já se fala de novo em eleições (em Portugal não podem passar mais de 2 anos sem que haja eleições) e onde os socialistas já se perfilam para regressar de novo à ribalta, cheios de ganância mal-contida e de laivos de vingança justiceira contra tudo e contra todos. Tenhamos juizo, deixemo-nos de infantilidades bacocas e aprendamos um pouco com a desgraça alheia, para não voltarmos a fazer disparates que só nos prejudicam a nós mesmos e não permitem que nos desenvolvamos harmoniosamente a par dos nossos sócios nesta aventura europeia.
ALBINO ZEFERINO 22/1/2014
quinta-feira, 16 de janeiro de 2014
PORTUGAL EM SALDO
A fome aguça o engenho, dizem os populares ditos que os portugueses melhor que ninguem criam para troçarem das suas desgraças colectivas. Verdadeiros tratados de sociologia, os proverbios populares são a génese intelectual do povo portugues, inculto, ignorante, primitivo e superficial, mas ao mesmo tempo, matreiro, vivo, profundo e sábio. Quanto mais sofremos nesta luta contra as mentes mesquinhas e invejosas daqueles que nos perseguem (sejam os credores externos e internos, sejam os mentores da austeridade ou os seus críticos) que a fome (em sentido figurado entenda-se, porque hoje já ninguem morre de fome, como não morre de tifo, nem da tuberculose) nos impele a encontrar soluções cada vez mais engenhosas para enfrentar a crise. Desde que a Ferreira Leite se lembrou de intergrar nos cofres do Estado os fundos de pensões que medravam na paisagem desordenada da segurança social lusitana, que soluções cada vez mais engenhosas têm proliferado no mundinho financeiro deste Portugal das miniaturas do Bissaia de Coimbra.
A cedência a quem mais dinheiro oferecer das joias da coroa portuguesa (EDP, REN, ANA, TAP, seguros da CGD, GALP, PT, CIMPOR, SOMAGUE, TOTTA, BCP, BPSM, CTT e outras que hão-de vir) maioritariamente a estrangeiros, revela que Portugal não tem capacidade para se gerir a si próprio. No limiar de mais um grande passo no sentido da integração europeia com a criação da União bancária europeia, espécie de espaço bancário europeu (à semelhança do espaço social, cultural ou económico que já existem), o problema que agora se põe já não é a que grupo económico nacional vai pertencer determinado sector estratégico, mas a que país ele vai ser entregue. A avidez demonstrada por brasileiros e angolanos, que disputam entre si a primazia que a mesma lingua lhes confere para, controlando sectores vitais da economia portuguesa, entrarem na Europa como fazendo parte dela, vai ser o motor que impulsionará (ou não) Portugal para sair da crise. Quanto mais interesse a angolanos e a brasileiros suscitar a entrada neste novo mundo da banca europeia (ombreando com os grandes bancos ingleses, alemães e franceses) mais depressa os bancos sedeados em Portugal se recomporão da pancada que a crise lhes causou. Os pequenos bancos (os que por si só não tenham musculo para acompanhar a passada europeia serão absorvidos ou cairão). Dos grandes, só o BES ainda depende de portugueses. Todos os outros são já angolanos ou brasileiros (excepção feita ao TOTTA, que os espanhois usam como agencia ibérica).
Mas o próprio BES está hoje em fase de reestruturação accionista. Decidida já a substituição do portugues Salgado como presidente, a duvida quanto ao seu substituto subsiste entre o brasileiro Abecassis (presidente do BESI Brasil) e o angolano Morais Pires (originário do BES Angola). É certo que ambos pertencem ainda à familia. Um pelo sangue, outro pela confiança. Mas não se pense que os responsáveis angolanos e brasileiros não estejam por detrás desta escolha. Portugal está a saldo e é no nosso território onde hoje se discutem as influencias europeias que as potencias extra-europeias pretendem conseguir.
ALBINO ZEFERINO 16/1/2014
sábado, 4 de janeiro de 2014
A SAÍDA DA TROIKA
Ouve-se agora a toda a hora que os portugas estão ansiosos para que chegue maio, para "se verem livres" da troika. Os pobres diabos atribuem à troika todos os malefícios que lhes fizeram perder empregos, dinheiro, salários, pensões, subsidios, abonos, carros, casas, almoçaradas e jantaradas, férias e um que outro extrazito. Pensam, coitados, que o relaxamento na vigilância das nossas excentricidades vai proporcionar, como por milagre, o regresso ao laxismo financeiro que conduziu Portugal ao estado em que está. Mas a coisa não será assim. Continuamos a dever muito (mais do que antes) e o nosso défice orçamental está longe de deixar tranquilos os credores que nos filaram. É mais ou menos como se um doente estivesse na expectativa do médico deixar de lhe receitar os remédios para imediatamente voltar aos excessos que o levaram inicialmente à doença.
Estas almas não percebem que enquanto não conseguirmos endireitar as nossas vidas (ou seja, criar emprego útil, aumentar a produção, ganhar mais dinheiro, abandonar a nossa mentalidade queixosa e subsidiodependente, numa palavra, civilizar os nossos maus hábitos) não será possivel sair da crise. Há quem defenda (e curiosamente há quem acredite nisto) que é aumentando os ordenados, criando empregos desnecessários, fazendo obras inuteis, em suma, gastando o dinheiro que não temos, que conseguiremos sair deste poço sem fundo. A troika existe para nos emprestar o dinheiro de que necessitamos para manter o país à tona de água (para que haja alimentos nos supermercados, transportes que nos levem aos nossos destinos, gasolina para os nossos carros andarem, electricidade para as nossas casas, restaurantes para comermos, água para bebermos e nos lavarmos, escolas para deixarmos os nossos filhos e lares para os nossos pais, enfim, serviços para que nos sirvamos e máquinas ATM para de lá tirarmos o dinheiro de que precisamos para viver).
Não se pense que, com a saída da troika, deixaremos de prestar contas do dinheiro que periodicamente continuaremos a ter que pedir emprestado ao estrangeiro, para suprir a falta da quantia necessária para continuarmos a viver nos minimos. O resultado da produção nacional (impostos incluidos) não chega para cobrir 1/3 das necessidades financeiras do país. Esta situação vai durar certamente muito tempo a ser invertida (se algum dia o for) e o que temos que fazer por agora é conseguir endireitar as finanças de modo a que os nossos credores acreditem que retomamos o caminho do crescimento, para que nos continuem a emprestar o dinheiro de que precisamos para viver, a taxas de juro suportáveis. Enquanto a generalidade da portuguesia não meter isto na cabeça, nada feito. Enquanto os partidos politicos (sobretudo o PS e os outros da oposição) continuarem a reclamar pelo fim da austeridade como se fosse esta a causa dos males que nos afligem (e não a ausencia completa de consciencia da necessidade de constituirmos uma frente unida nacional que consiga erradicar de vez o flagelo da crise) não conseguiremos chegar a bom porto. Não se pense que alemães ou outros venham em nosso socorro por terem pena da situação em que nos encontramos. Só não fomos ainda pelo cano abaixo porque usamos o euro e eles não querem que o euro se desfaça, porque tambem se prejudicariam. Mas não se pense que, se não tivermos juizo, eles não arranjem uma solução para isso (criando uma nova moeda só para países cumpridores, por exemplo) deixando os países incumpridores (como nós e os gregos) entregues ao euro, nessa altura já uma moeda sem valor e sem credibilidade internacional. Deus nos livre duma situação como essa!
Se conseguirmos (como espero e desejo) evitar um 2º resgate (ou seja, um novo memorando de entendimento com novas medidas de austeridade ainda mais gravosas) já não seria mau. Mas dum programa cautelar não nos livraremos concerteza. A tibieza com que este governo aplicou o 1º resgate foi confrangedora (não conseguiu reesturturar a orgânica do Estado, não resolveu o problema da despesa excessiva do Estado, não renegociou capazmente as PPP leoninas, não privatizou as empresas publicas, não fez a reforma autárquica, não saneou a Administração Publica, não reformou a Justiça, não modernizou o sistema eleitoral, entre outros falhanços) indo assim obrigar o governo a pedir à UE a concessão dum programa cautelar que nos permita continuar a aceder ao mercado financeiro em condições de juro minimamente aceitáveis. Esperemos que as anunciadas fiscalizações sucessivas do famigerado tribunal constitucional não venham descaracterizar definitivamente o orçamento do Estado para este ano, forçando, então sim, um 2º resgate de consequencias desastrosas para o futuro próximo de Portugal. Inch Alá!
ALBINO ZEFERINO 4/1/2014
I HAD A DREAM
Esta noite sonhei. Sonhei que vivia num país livre onde todos faziam bem uns aos outros e ninguem fazia mal a ninguem. Todos se preocupavam com os assuntos verdadeiramente importantes para a comunidade deixando a cada um e à sua iniciativa a gestão da sua própria vida. Ninguem se apropriava do que não fosse seu por direito, nem usava nada alheio em seu proveito próprio que não fosse de uma forma legitima. Em caso de necessidade absoluta o Estado ajudava monitorizando a ajuda. As necessidades colectivas (e só estas) como a recolha do lixo e o seu tratamento, o fornecimento dos cuidados básicos de saude, os bombeiros, os policias e os serviços publicos subsidiados (ex. transportes, ensino especial, investigação de ponta, apoio a idosos necessitados, etc.) eram providenciadas pelo Estado, que se financiava através dos impostos. Estes eram cobrados de forma progressiva (quem mais lucros recebesse mais pagava) e apenas e só em função das necessidades orçamentadas. Ou seja, os impostos aumentavam ou diminuiam consoante estivessem previstas mais ou menos despesas para o Estado suportar em determinado ano (tal como ocorre com a inflação).
As despesas com as funções de soberania eram limitadas reduzindo-se à manutenção de um corpo de policia, uns quantos juizes seleccionados caso a caso pelo seu carácter impoluto e tropa de parada e diplomatas de circunstancia, consoante as necessidades determinassem (tudo gente contratada à tarefa). Acabavam as regiões autónomas que passariam a governos civis.
A função legislativa era asegurada por um Parlamento reduzido ao numero minimo de deputados necessários para assegurar a representação de todo o território nacional. Estes funcionavam maioritariamente em comissões fiscalizadoras da acção governativa e em plenários para votações importantes (orçamentos anuais, moções de censura ou de confiança ao governo, declarações de guerra, aprovação de grandes linhas de acção do Estado, referendos parlamentares, etc.). O Parlamento referendava as nomeações governativas.
O governo exercia a função executiva, aprovando decretos regulamentares e fazendo portarias, sendo constituido por 6 ministros (o primeiro, com tarefas coordenadoras; o dos assuntos economicos e financeiros, englobando finanças, agricultura, ambiente, comercio e serviços,etc; o do interior e justiça; o dos assuntos externos, englobando defesa e negócios estrangeiros; o dos assuntos sociais, com tarefas na saude e na escola publicas e na assistencia social; e finalmente o dos transportes e comunicações). Os gabinetes eram reduzidos a um chefe, um adjunto e um secretário e cada ministro tinha direito apenas a uma viatura de serviço com motorista e só para uso em acções de representação (este pessoal era todo eventual e dependia exclusivamente do ministro que os sustentava do seu salário ministerial).
A função judicial do Estado era exercida por um corpo de juizes propostos pelo governo de entre os licenciados em direito e nomeados pelo Parlamento mediante audição parlamentar prévia em comissão, em função das necessidades do momento (em regime de contrato eventual). Os juizes do Supremo e do Constitucional eram nomeados da mesma forma, com o mesmo regime e por concurso publico. Deixava de existir carreira judicial. O mesmo ocorreria nas demais carreiras chamadas hoje do Estado (militar, diplomática, hospitalar, docente liceal e universitária, etc.).
Os médicos deixavam de ser funcionários publicos e eram seleccionados para os hospitais pelos respectivos conselhos de gestão. O ensino superior e a investigação cientifica eram privados e desenvolviam-se em função de critérios utilitários. Havia bolsas de estudo para os necessitados (e só para esses) atribuidas pelas empresas que o desejassem (e que disso poderiam tirar óbvio proveito).
O ensino publico ficava reservado ao Estado que asseguraria escolas publicas em função dos agregados populacionais. Podia concessionar essas escolas a privados mediante concurso. O ensino universitário era privado podendo o Estado manter e gerir as Universidades publicas de referencia, como as de Coimbra e de Lisboa. Todos os professores eram contratados eventuais em função das necessidades lectivas. A investigação e a cultura ficavam entregues ao sector privado.
Acordei estremunhado com a campainha da porta que não parava de tocar. Aos trambolhões lá fui abrir a porta e deparei com o solicitador de execuções que vinha acompanhado de advogado e dum policia à paisana. Vinham penhorar-me o meu carro que eu deixara estacionado à porta de casa lá em baixo. Falta de pagamento do reembolso e dos juros do empréstimo contraido, disseram. Depois de enfiar uma camisola coçada e uns jeans esburacados lá os acompanhei até ao meu carro novo, que tantas ilusões me trouxera.
Chegados à rua deparei com uma multa afixada no para-brisas do carro intimando-me a pagar um balurdio por ter estacionado fora do sector autorizado. Meti o papel no bolso antes que os tipos pudessem ver o que era e entreguei-lhes a chave do carro quase em lágrimas. Fiquei a olhar apatetado enquanto via o meu carrinho novo ser levado por aqueles abutres.
De regresso a casa aproveitei para dar uma olhadela à caixa do correio. No meio dos inumeros flyers publicitários estava uma intimação das Finanças para pagamento de um excesso de IRS que diziam não tinha sido cobrado por engano. Onde iria eu buscar o dinheiro para isso? Subi atabalhoadamente a escada e mesmo antes de entrar no apartamento ouvi o telefone que tocava. Corri para atender e de lá reconheci a voz da minha ex-mulher que, sem sequer me dar os bons dias, me invectivou com maus modos o atraso no pagamento da pensão de alimentos que me esquecera de entregar-lhe no mes passado. Faltava ainda regularizar o pagamento da escola do puto (que ficara por minha conta tambem) lembrava ela antes de desligar abruptamente. E a renda da casa? O senhorio já me tinha ameaçado de despejo se eu voltasse a atrasar-me no pagamento. Tudo junto, se calhar não chegava o ordenado do mês.
Vesti-me à pressa pois tinha ainda que apanhar o autocarro e depois o metro para chegar ao escritório e com esta coisa do solicitador e do telefonema da gaja já tinha perdido imenso tempo. Chegado ao escritório sou imediatamente abordado pelo meu chefe que me diz estar farto dos meus atrasos e da minha incompetencia (fala o roto ao nu, pensei logo eu) e que iria propor ao patrão a minha saída da empresa. Lindo serviço pensei. Estou lixado. Só me resta emigrar. Entrei na internet e pus-me a procurar trabalho no estarngeiro. Ao fim da manhã já tinha seleccionado 3 hipóteses. Uma em Luanda, outra em Maputo e outra em Sindelfingen, na Alemanha. Talvez comece por esta. Dizem que os alemães gostam muito de nós. Será mesmo assim? Deus queira!
ALBINO ZEFERINO 4/1/2014
Subscrever:
Mensagens (Atom)