terça-feira, 29 de julho de 2014

O DESMEMBRAMENTO DE PORTUGAL


          Portugal está-se desmembrando. Depois duma intervenção internacional falhada da qual saimos com mais problemas do que quando entramos, os portugueses enfrentam hoje a sua fase final como país soberano e independente com a queda do ultimo bastião do Portugal capitalista.
          Quando da recuperação do banco que vilmente lhes tinha sido confiscado pelos abrileiros de 74, os Espirito Santo decidiram vingar-se da afronta que representou a nacionalização abrupta daquilo que representara a sua ascenção financeira e de classe como familia possidente do regime deposto em Abril de 74. Prometendo a si mesmos nunca mais deixar-se cair numa esparrela daquelas, os Ricardos, os Manueis, os Manuel Ricardos, os amigos deles e os amigos dos amigos, resolveram construir uma fortaleza inexpugnável à volta do banco devolvido, criando uma teia de interesses, tanto visiveis como ocultos, de tal forma interligados entre si que eles próprios escondiam uns dos outros as suas origens, proveniências e finalidades. Usando as mais sofisticadas engenharias financeiras, os Espíritos (como ficaram conhecidos no milieux) dedicaram todo o seu conhecimento e saber a "vingar-se" de tudo e de todos da afronta que para a familia tinha representado o 25/4. Transformando o BESCL (antiga casa de cambios) no BES (conglomerado financeiro com ramificações em todo o mundo) e depois no GES (onde reuniram a créme de la créme da socialite portuguesa), a familia dos Espiritos tinha interesses em todos os ramos do negócio em Portugal e fora dele.
          Só que a maldita crise deu cabo do plano. A exigencia do BCE no aprofundamento da regulamentação dos bancos europeus tendente à instalação da união bancária europeia trouxe à superficie não só as debilidades estruturais dum grupo financeiro com pés de barro (o mesmo dinheiro - que nem era deles - servia para fazer vários negócios em simultâneo - ou em cascata - para beneficio deles próprios - ou só de alguns deles) com contabilidades escondidas ou obscuras, mas tambem toda uma trama de negócios ocultos que - à sombra dum nome honrado feito com trabalho honesto há mais se 150 anos - envolveu milhares de pessoas de várias nacionalidades que acreditarm neles e no seu nome. A crise do BES arrastará consigo o país e o que resta da sua credibilidade e obrigará a novas intervenções estrangeiras e à perda progressiva da nossa capacidade de resolver democraticamente o nosso devir colectivo.
          Não se pense porem que o desmembramento de Portugal será apenas da responsabilidade duma só pessoa ou mesmo duma só familia. Tal como 1580 representou a abdicação colectiva da soberania perante a evidencia da posse iminente do poderoso Filipe e dos direitos dinásticos que detinha sobre Portugal, tambem a queda do império ES será o culminar dum processo degenerativo iniciado em 1974, com todas as vicissitudes conhecidas e desconhecidas ocorridas desde então, que encerrará um ciclo da nossa vida colectiva para dar inicio a outro, mais centrado na busca do bem-estar pessoal e menos no futuro dos amanhãs que cantam. Só ainda não sei como será.

                                     ALBINO ZEFERINO                                  29/7/2014

terça-feira, 22 de julho de 2014

EM NOME DO ESPIRITO SANTO


          Decididamente Portugal não consegue sair das crises onde se mete ou onde o metem. Crise após crise, lá vamos conseguindo sobreviver, porém cada vez mais pobres, mais limitados nas nossas opções de vida e mais angustiados. Após a crise do Sócraes, a que prosaicamente se chamou crise financeira (na tentativa de limitar os seus estragos aos bancos), passamos alegremente e sem dar por isso à crise social, com o aumento exponencial do desemprego resultante das tentativas (as mais das vezes bacocas) de Passos e do seu Portas de reduzir a despesa publica e finalmente à crise económica, da qual teimamos em não sair (quem mandou a estas alimárias prescindir dum programa de apoio europeu apenas para mostrar à estranja que Passos e Portas tinham conseguido dar a volta à pista, quando ainda nem sequer tinham chegado a meio do percurso?).
          Já começavamos a andar por nós próprios, embora tropegamente, quando, de repente, desaba o Espírito Santo sobre nós, qual tempestade imprevista e indesejada no rescaldo do temporal furioso que finalmente dava mostras de acalmar. Começou com uns chuviscos que molharam apenas os mais próximos, para se ir alargando progressivamente à generalidade do país, afectando praticamente toda a gente. Parece que os estragos do mau tempo não se limitam às regiões fora de portas, mas que, à medida que se vão fazendo balanços, se vai verificando que o temporal é grosso e que não irá deixar ninguem seco e imune à molha. E de outro modo não se esperaria que acontecesse. Já se viu delimitar os efeitos dum furacão antes que ele deixe de soprar, ou mesmo já depois disso, antes de se constatarem in loco os estragos causados pelo vendaval?
          O centro do desastre situa-se, não nos suburbios como nos querem fazer crer, mas no coração da cidade, onde trabalham para cima de 25 mil pessoas, a maioria das quais vai ficar constipada para a vida inteira, tal será a molha. Os furacões constituem um processo meteorológico uno e indivisivel, que, como uma lombriga, vão de um lado para o outro, arrasando tudo por onde passam sem dó nem piedade. Enquanto não termina a sua viagem destruidora, o furacão tende a concentrar a sua energia no seu miolo, no centro, onde roda com mais força e onde destroi com mais violencia. E o centro deste furacão Espirito Santo está em Lisboa, na capital do antigo império, agora já só ruinas de tempos gloriosos onde os nossos maiores proclamavam o seu orgulho na portugalidade e na civilização dos povos. Não creio ser possivel separar, como os nossos responsáveis vêm proclamando, as consequencias nefastas deste furacão inesperado, entre os estragos provocados na periferia e os que fatalmente se vão reflectir na sede. E que estragos serão esses? Em primeiro lugar aumentará o numero de desempregados a juntar à horda dos já existentes, que suga os poucos recursos que o Estado surripia aos que ainda vão tendo alguma coisita. Depois vai secar definitivamente as fontes de financiamento nacionais que muito dependiam da acção da central, base e inspiração de negociatas escuras e dubias provocadas pelo furacão. E finalmente vai ter um factor sistémico sobre toda a meteorologia nacional, que é débil e influenciável por alterações climáticas maiores e absorventes. Os americanos chamam a estes fenómenos as tempestades perfeitas, porque são arrasadoras e não deixam nada nem ninguem de pé.
          Aguardemos pacientemente (não temos outro remédio) o desfecho de mais esta tragédia que nos caiu em cima, e que os anjos e os santos que protegem esta terra de Nossa Senhora nos ajudem a ultrapassar mais esta provação. Em nome do Espirito Santo. Amén.

                                        ALBINO ZEFERINO                                   22/7/2014

 

sexta-feira, 18 de julho de 2014

SENT OF WAR


          O cheiro a guerra paira no ar poluído deste mundo de contradições e de conflitos. Por todo o lado se vêm e ouvem focos de discórdia entre os homens, sejam de natureza politica ou religiosa, social ou étnica, económica ou financeira. Discórdia entre os homens existe desde que há humanidade. Mas para combater esse flagelo inventou-se a concertação e a negociação. Sem estas, as discórdias entre os homens conduzem ao confronto e à guerra. Verifica-se porém, neste principio de século, que a intransigencia instalada nos espíritos dos homens vem dificultando cada vez mais o uso da moderação e da inteligencia para dirimir os conflitos que constantemente afluem nas relações entre as pessoas, as sociedades, as nações, as etnias ou mesmo os extractos sociais e económicos donde provêm os contendores.

          À constituição de grandes grupos de Estados em organizações internacionais destinadas à prossecução de interesses comuns, como a União europeia por exemplo, esteve subjacente a ideia de concertação ou negociação permanente entre os seus membros como forma de se evitarem as guerras e os confrontos entre as nações e as socieedades. Do mesmo modo, o nascimento da NATO, como organização militar internacional, no rescaldo das duas mais mortíferas e destruidoras guerras mundias do século passado, obedeceu a intenção semelhante. Hoje, porém, mais de 70 anos decorridos sobre esses trágicos acontecimentos, parece que as gerações que não os viveram se esqueceram (ou nunca aprenderam) que não há outra forma de dirimir pacificamente os conflitos entre os homens que não seja pela negociação e pela a concertação dos interesses em confronto.

          O eterno conflito no Médio-Oriente, as escaramuças territoriais na Ucrânia, o impassse na federalização indispensável da Europa, o aumento do fosso entre ricos e pobres no mundo, a "invasão" pacífica dos muçulmanos em França e nos países limitrofes, o desaire das primaveras árabes na África do Norte, o descalabro étnico e social no Iraque e na Síria, o alastramento do negócio da droga no México, a desilusão de Dilma no Brasil e a de Obama nos EUA, o crescimento economico assustador da China, o regresso aos métodos sovieticos de Putin na nova Russia, a transferencia dos grandes negócios mundiais para o eixo Hong-Kong, Singapura e Xangai, em detrimento de NovaYorque, Londres e Frankfurt, etc. etc. tudo isto são sinais de que as relações entre os homens e as nações experimentam hoje perigosa viragem prenunciadora de conflitos regionais passiveis de se transformarem num conflito mundial de incalculáveis consequencias.

          E nas grandes cidades europeias? Como vivem hoje as pessoas? Ao progresso científico indiscutivel verificado nestes ultimos anos desde a viragem do século, quer na informática, quer na medicina ou na robótica, quer no ambiente ou na energia, não correspondeu um acréscimo na qualidade de vida das pessoas. Pelo contrário, o que se nota é uma cada vez maior "guetização" das populações urbanas, que se agregam por classes (já não sociais no sentido vitoriano do termo, mas mais pelo nível de vida de que disfrutam) empurrando os chamados imigrantes (e equiparados) para os suburbios das grandes cidades, onde vivem pior do que os seus progentitores viviam no século passsado, no campo tratando das couves e das galinhas. Será que este equilibrio instável, que gera incompreensões e injustiças, acirrando invejas e vinganças recalcadas, não degenará num conflito de natureza social e economica, impulsionado pelos sucessivos escandalos financeiros que a comunicação social engrandece na sua ânsia de procurar audições, e poderá vir a ser o prenuncio do fim desta civilização que conhecemos e que está dando sinais de evidente derrocada? Queira Deus que não!

                              ALBINO ZEFERINO                                 18/7/2014

segunda-feira, 14 de julho de 2014

AS PREMONIÇÕES CAETANISTAS


          Do seu exilio doloroso, Marcello Caetano escreveu há anos: "Em poucas décadas estaremos reduzidos à indigência, ou seja, à caridade de outras nações, pelo que é ridiculo continuar a falar de independência nacional. Para uma nação que estava a caminho de se transformar numa Suiça, o golpe de Estado foi o principio do fim. Resta o sol, o turismo e o servilismo de bandeja, a pobreza crónica e a emigração em massa. Veremos alçados ao Poder analfabetos, meninos mimados, escroques de toda a espécie que conhecemos de longa data. A maioria não servia para criados de quarto e chegam a presidentes de Câmara, deputados, administradores, ministros e até presidentes da Republica."

          Marcello Caetano foi um ilustre professor de Direito, insigne mestre de muitos dos nossos herois da democracia, da esquerda à direita do espectro politico portugues, que, naturalmente, assumiu o lugar proeminente ocupado por Salazar 40 anos antes, quando este foi obrigado, por razões de saude, a demitir-se de chefe do Governo de Portugal. Na altura vivia-se numa "democracia orgânica", eufemismo salazarista que escondia uma ditadura de luva branca, apenas não tolerada por extremistas comunistas e proto-comunistas, perseguidos regularmente pela policia politica do regime.

         A chegada de Caetano ao poder efectivo (tinha sido antes colaborador próximo de Salazar tendo ocupado lugares da maior relevância politica) trouxe para o anquilosado regime, instalado 40 anos antes através do golpe militar de 28 de maio de 1926, uma certa frescura, prenunciadora duma abertura politica a que alguns chamaram a "primavera marcelista". Só que essa primavera cedo se foi pelo medo de Marcello em enfrentar a resistencia salazarista enfeudada por detrás do presidente da Republica que, de fantoche de Salazar, se tornou em simbolo do salazarismo, já sem o ditador. A esperança que a "evolução na continuidade" trouxera a alguns dos críticos do regime dissipava-se como um fogo fátuo aos olhos da maioria dos portugueses, desejosos duma evolução do regime no sentido duma negociação equilibrada para o fim da guerra em África e duma democratização à europeia do regime politico portugues. Desta timidez resultou aquilo que Marcello tão bem soube definir anos depois, já no exilio brasileiro, mas do que não pode deixar de ser considerado como primeiro responsável. A revoluçao dos cravos rebentou por incapacidade do governo marcelista em reformar Portugal no sentido duma modernidade que Salazar e os seus sucessores espirituais não conseguiram compreender e que, pelo contário, não aceitaram e se prontificaram a combater. Ganharam a Marcello, mas perderam com os abrileiros. Só que as consequencias dessa vitória estão a ser pagas hoje pela geração seguinte.

                       ALBINO ZEFERINO                                    14/7/2014

terça-feira, 8 de julho de 2014

PORTUGAL E O FUTURO


          Tal como o livro de Spínola anunciava utopicamente uma mudança de regime,tambem a crónica de hoje pretende mostrar que o chamado ciclo da crise está no fim e que novos desafios nos esperam no futuro. Desta crise inacabada (como tudo em Portugal,que começa e nunca acaba) resultou uma indefinição assustadora do nosso futuro colectivo. Terminada oficialmente a austeridade, voltam as reivindicações e as tentativas de retorno à boa vida à custa do Estado, entidade mística e etérea que paira sobre nós qual anjo da guarda para nos proteger e salvar nos momentos piores do nosso devir colectivo. Mas D.Sebastião já lá vai há mais de 500 anos e afinal Jesus só salva os crentes.
          Definitivamente classificados pelos nossos parceiros comunitários como incapazes de nos governarmos a nós próprios, aguardamos impacientes o final do ciclo para constatarmos o que nos espera no horizonte. Entretidos com a refrega socialista (que não é mais do que uma manifestação da rebeldia bacoca que nos vem do Viriato e que o povo consubstanciou no dito: "Agarrem-me que eu mato-o") os tugas lusitanos não perceberam ainda que a caravana está passando por eles enquanto eles ladram uns para os outros. E a caravana europeia chama-se União bancária, ultima tentativa de preservar o menor denominador comum europeu a que se chama euro.
          A crise do BES não é mais do que o canto do cisne da gestão bancária privada, agora que ficou definitivamente demonstrada a incapacidade lusitana de manter o capitalismo de grupo que caracteriza a economia de mercado do séc. 21. Sem parceiros estratégicos, sem investimentos estrangeiros e sem estratégias globais, os portugueses não se mexem, não arriscam, não investem, nem produzem. A derrocada do GES é a terceira derrota sucessiva da gestão bancária privada no Portugal de Abril. A primeira foi o BCP - tentativa corajosa de Jardim Gonçalves e de outros de criarem um grupo bancário privado a nível europeu, mas logo abortada por invejas e excessos cometido pelos próprios, incapazes de suster a ganância dos seus criadores - e que acabou em mãos angolanas. Tal como o BPN que não conseguiu evitar o pior da natureza humana, aindahoje por julgar - e que igualmente caiu para o lado angolano. O resto do sector bancário já está em mãos espanholas. Serão os esrtrangeiros quem definirá no futuro a estratégia desenvolimentista de Portugal no contexto da União europeia.
          E o que poderá acontecer a Portugal neste contexto? Eu diria que o mais natural será o desmantelamento a prazo doEstado portugues como hoje o conhecemos. Não para nos tornarmos na 18ª autonomia espanholacomo alguns receiam e outros aceitam relutantemente. Fartos de autonomias estão eles.Por causa delas está aEspanha em crise. O mais provável será que as autonomiasespanholasconfinantes com o território portugues  se expandam. A Galiza avançará naturalmente até ao Douro engolindo o Porto e o seu vinho e a Andaluzia expandir-se-á naturalmente Algarve dentro até à costa alentejana, deixando para a Extremadura espanhola a Estremadura portuguesa mais as Beiras e o litoral entre o rio Douro e a serra doEspinhaço de Cãoque separa o Alentejo do Algarve e ficando com o porto de Sines e com Lisboa a caminho dos Açores e das Américas. A Madeira é anexada pelas Canárias.

                     ALBINO ZEFERINO                                      8/7/14