sábado, 31 de outubro de 2015
OS REFUGIADOS E A EUROPA
Ultrapassada (ou não) a crise financeira que por pouco deitava a Europa abaixo, eis que surge, ameaçadora, nova crise consubstanciada nos refugiados (serão mesmo todos eles refugiados?) que fogem dos seus países de origem, engalfinhados em guerras misteriosas cujos contornos ainda não são visiveis a olho nu, e desembocam desesperados à porta duma Europa confusa, dividida e incrédula e incapaz de suster tamanha avançada, que não cessa de crescer.
No inicio da crise financeira, quando o euro estava a ser violentamente atacado pelos mercados, alguns falavam na necessidade da mutualização das dividas dos Estados membros como única forma de salvar a Europa ameaçada de extinção. Contudo, a instalação de um mecanismo europeu de estabilização financeira conseguiu travar o descalabro que se adivinhava e por em marcha uma união bancária concebida para permitir à eurozona resistir à falência dum banco, sem necessidade de comprometer as finanças publicas do respectivo país e envolver toda a eurozona no processo. O mesmo ocorreu com a crise grega da passada primavera, quando os 19 países da eurozona estiveram à borda do precipicio. Só quando os alemães puseram o Grexit em cima da mesa é que Tsirpas deu uma cambalhota e cedeu.
Destas crises a Europa saiu reforçada e mais solidária, dizem alguns. A acreditar nesta eventualidade, a crise dos refugiados não será mais do que um mau momento para a Europa. Os europeus conseguirão criar uma verdadeira gestão comum das fronteiras da União com um corpo europeu de guardas fronteiriços e uma politica de imigração económica concertada, como existe no Canadá, com as suas quotas por competências, etc.etc. Desejariamos todos acreditar neste cenário optimista, mas não sei. Para ultrapassar a crise financeira, os dirigentes europeus escolheram resolutamente a austeridade, ou seja, o saneamento drástico das finanças publicas, os cortes nas prestações sociais e as reformas económicas de cariz liberal. Um remédio de cavalo não completamente convincente, mas com a vantagem de poder ser controlado e balizado.
A solução para resolver a crise dos refugiados parece ser bem menos evidente. Com mais de 700 mil refugiados que, desde janeiro deste ano, já passaram o Mediterrâneo, não há ainda uma resposta única e comprovada por parte da UE. Desde maio, que a Comissão esboçou as pistas que, sob a pressão dos acontecimentos e da Alemanha (país destinatário em primeira linha na preferencia dos refugiados), estão a ser adoptadas. A criação de "hot spots" para separar as populações elegiveis para beneficiarem do direito de asilo, dos simples imigrantes económicos, a instalação de centros de acolhimento para evitar que os refugiados durmam nas ruas e nos campos, os acordos de recolocação de urgencia dos refugiados e o reforço dos efectivos e das competências da agência Frontex nas fronteiras externas da UE, são até agora as medidas já tomadas. Mas se elas não funcionarem todas impecavel e simultâneamente (do que é legitimo duvidar-se) o castelo de cartas pode desmoronar-se de um momento para o outro, virando a Europa do "interior" (Alemanha, Reino Unido, Suécia) principal destino dos refugiados, contra a Europa do "transito" ou da "entrada" dos refugiados (Grécia, Itália, Balcãs), que se tornariam em vastos campos de retenção (leia-se de concentração) de refugiados.
Como conseguir uma resposta concertada e firme por parte da Europa ameaçada por esta invasão pacifica de refugiados fugidos das guerras e da miséria que assolam os seus países e que eles atribuem em útima instância aos europeus? Como evitar que os partidos politicos mais xenófobos e populistas se reforcem manipulando os receios criados nos espiritos dos cidadãos europeus pelas imagens televisivas das hordas de refugiados que diariamente entram em território europeu? Como reagir contra a intransigência manifestada por esses partidos quando começarem a influenciar as agendas politicas dos respectivos governos (a vitória eleitoral na Polónia do partido extremista Direito e Justiça no domingo passado é um sinal do que aqui digo)?
Se esta crise dos refugiados se está a revelar bem mais profunda do que foi a crise do euro, é necessário que se aprofundem as suas causas. E essas causas, tendo sido provocadas pela Europa, não são europeias. Encontram-se para lá das fronteiras da União. É a guerra na Siria, a insegurança no Afeganistão, a miséria no Bangladesh, a ditadura eritreiana, etc.etc. A Europa, que viveu durante muito tempo como um óasis de paz protegida das áleas do resto do mundo, começa a sentir agora as vicissitudes desestabilizadoras que esta crise está criando. Mas como pode a Europa contribuir para evitar este descalabro se nem sequer esteve presente na mesa das negociações tendentes a resolver o conflito sirio?
ALBINO ZEFERINO (de regresso de merecidas férias cariocas) 31/10/2015
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário