segunda-feira, 2 de novembro de 2015

OS EFEITOS PREVERSOS DAS ELEIÇÕES


          Enredados no seu dogmatismo endógeno, os lusos eleitores não conseguem desenvencilhar-se da camisa de onze varas em que as ultimas eleições legislativas os meteram. Prosseguindo bacocamente o processo constitucional previsto na velha e desactualizada Constituição (que só tem empecilhado a recuperação economico-financeira que o país precisa), o ultrapassado Presidente, sem chama nem chispa, deu posse a um governo de antemão chumbado à nascença. Tendo sido ultrapassado pelos acontecimentos (leia-se pela ambição descarada do perdedor António Costa), Cavaco não terá outro remedio agora do que aceitar sem tergiversações saloias um novo governo espúrio e não representativo da verdadeira vontade popular.
          Porque o que os portugueses (pelo menos aqueles que votaram) quiseram dizer ao Presidente não foi que não queriam Passos a governar; não queriam era que Passos governasse sem travões. Por isso lhe renovaram o mandato, mas sem maioria. Ao Presidente restava-lhe ter lido esta mensagem e ter-lhe dado corpo. Não basta dizer do alto da sua varanda presidencial que a solução que previra era essa mesmo, ele que tudo vê e antecipa. O dificil não é isso. Não é para prever situações óbvias que ele lá foi posto. Foi lá posto para interpretar a vontade popular com os poderes que o cargo lhe dá. O semi-presidencialismo é isso mesmo. Quieto quando não faz falta e actuante quando é preciso. Por isso tem poderes soberanos quando ninguem mais os tem. E não é refugiando-se atrás duma Constituição caduca, desactualizada, contraditória e preversa (não nos esqueçamos do periodo em que ela foi elaborada, nem das circunstancias dificeis em que foi negociada. O PC de Cunhal não a queria de todo; o PS de Soares queria-a mais solta; o PSD de Sá Carneiro desejava-a mais liberal e o CDS de Freitas mais apertada) que o Presidente desempenha o seu papel nos periodos de crise. Chamado a agir (pois em periodos de acalmia não deve dar-se por ele) o Presidente tem obrigação de traduzir na prática aquilo que a sua consciencia e a sua sabedoria lhe indicam ser a vontade do povo que o elegeu e lhe deu os meios (primeiro magistrado da Nação, comandante supremo das Forças Armadas, imunidades e privilégios presidenciais, etc. etc.).
          É lá posivel que se oiça uma galinha da Ìndia representativa de escassos 10% dos votantes perorar sobre o que deve ou não ser feito em matéria de governação ou um velho afinador de siderurgia (que tambem representa apenas outros tantos 10% de eleitores) manter o segundo partido mais votado refém dos seus caprichos e das suas exigencias impossiveis? Não queiramos ser olhados com respeito e consideração pelos outros quando não fazemos nada por merecê-lo. Se estamos assim a Cavaco o devemos. Que Costa queira ser primeiro ministro à força, que Catarina queira mandar nele ou que Jerónimo lhe possa por condições, é mau mas é o resultado preverso dumas eleições inuteis e fora de prazo. Agora que deixemos conformadamente que a musica prossiga só porque o maestro não dá pelas fifias, é que não é aceitável. O concerto tem que acabar antes que o teatro caia em cima dos espectadores e os esmague impiedosamente na sua queda.

ALBINO ZEFERINO                                                  2/11/2015

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