sábado, 29 de julho de 2017

ESTADO E DEMOCRACIA


          Estado é, como bem se sabe, uma entidade constituida por uma população, vivendo num território e dirigida por um governo.  Se o poder politico exercido por esse governo ao serviço do Estado assenta em eleições democráticas, então poderá dizer-se que se trata dum Estado de direito. Ou melhor, que o fundamento desse Estado reside na lei democraticamente produzida e legitimamente exercida. Poderemos assim dizer que estamos neste caso perante uma comunidade organizada democraticamente e que vivemos em democracia (segundo a rule of law, como os britânicos bem resumem a situação).  Mas será a democracia apenas isso? Bastará a realização periódica de eleições livres e gerais para se afirmar que estamos perante um Estado democrático? Não creio que baste. A democracia (como os gregos a inventaram) é uma forma de governo popular (ié, do povo) que garante a partcipação dos cidadãos em cargos publicos e lhes consagra direitos e garantias (os chamados direitos fundamentais). Ou seja, não basta que determinado governo tenha sido eleito democraticamente para que seja legitimo. Para isso tem que agir democraticamente. E agir democraticamente é agir para com todos da mesma maneira. Não é impondo sacrificios a uns em beneficio de outros ou beneficiando alguns em prejuizo de outros que o governo eleito democraticamente age tambem democraticamente. Vejamos exemplos para tornar o meu pensamento mais explicito.  Na Venezuela, como em Cuba ou no Zimbabwe, por exemplo, há eleições (mais ou menos livres, mais ou menos gerais, mais ou menos periódicas) mas o governo é exercido (cada vez mais escandalosamente) a favor de uns e contra os outros. Ninguem afirma seriamente que a democracia vigora nesses Estados. Outros exemplos (mais melindrosos mas nem assim menos verdadeiros) podem ir buscar-se à Europa e a outras partes do mundo ditas civilizadas (será a Turquia de Erdogan democrática? E a Polónia? E a Hungria? E o Equador ou a Bolivia? E a Russia de Putin, a China de Cho, o Brasil de Temer ou a América de Trump?).
          Vemos assim que não é fácil enquadrar certas formas de governar certos Estados como formas democráticas de governo, ou seja, formas igualitárias de gerir o Estado em beneficio de todos e em nome de todos. Estes desvios cada vez mais evidentes (e alguns até escandalosos) à forma democrática de governar os Estados tem vindo a criar nos espiritos das novas gerações que agora vão chegando ao poder (Macron, por exemplo) a duvida sobre se a democracia como ela tem vindo a ser desvirtuada por anteriores governações (e sobretudo pelos partidos politicos tradicionais) será a melhor forma de gerir a coisa publica dentro dos principios e regras comumente aceites como sendo democráticas. O surgimento de movimentos politicos que recusam inserir-se na clássica hierarquia partidária dos vários Estados ditos democráticos (O Podemos em Espanha, o Bloco de Esquerda em Portugal, o Die Linke na Alemanha, o Lepenismo frances, o movimento que elegeu Macron em França, os inumeros grupusculos das extremas esquerdas e direitas na Europa, o próprio partido que reelegeu e voltou a reeleger (ad aeternum?) Putin na Russia, as Auroras Douradas gregas, os Beppe Grillos italianos e os Tsirpas gregos, são, entre outros, bons exemplos do que pretendo salientar) alguns já no poder, outros próximos dele e outros ainda com esperanças de vir a governar, são prenuncio duma mudança radical nos conceitos tradicionais de exercicio do poder herdados do séc. XIX.  Socialismo, democracia cristã, liberalismo e ditadura, são conceitos de governo hoje caducos, desactualizados e inadequados para gerir os Estados que se dizem democráticos e modernos.
          A governação moderna gira à volta de conceitos como o desemprego, a segurança social, a saude, o ensino e a formação, o ambiente, a segurança pessoal interna e internacional, bem como na poupança, na cibernética, na investigação ou nos movimentos de massas. Para assegurar a estabilidade do Estado (e a sua própria) os governos precisam de mostrar que fazem coisas, mesmo que se revelem posteriormente inuteis ou inadequadas. E para isso precisam de dinheiro. Como há cada vez mais pobres e os ricos são cada vez menos (mas mais ricos) há que tributar onde o dinheiro circula. Ou seja, quem mais dinheiro gasta mais impostos tem que pagar. É um circulo vicioso que parece não ter fim. Hoje em dia nos países da UE, os contribuintes têm que trabalhar em média meio ano só para o Estado (na Irlanda 31,77%, em França 57,41% e em Portugal 44,3%). Se os governos não justificam cabalmente onde gastam esse dinheiro, sujeitam-se a ser postos em causa pelos respectivos eleitores. Pelo menos pelos mais atentos a estas coisas da governação.

                        ALBINO  ZEFERINO                                                               29/7/2017
         

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