Tal como já tive ocasião de referir em anteriores
desabafos, a furia privatizadora de que este governo se apossou na
tentativa de realizar o dinheiro que lhe falta para fazer face ao
desequilibrio das contas do Estado, não distingue entre aquilo que não
deve manifestamente pertencer à esfera do Estado e as instituições que
representam a soberania do país face a terceiros. A designação da TAP
como companhia de bandeira significa isso mesmo. Sendo uma empresa
comercial por natureza, a TAP encerra em si mesma uma parte da
soberania nacional, na medida em que detém prerrogativas soberanas que
se reflectem nos chamados direitos de tráfego, que outras empresas do
mesmo ramo não possuem. O exclusivo dos voos para as regiões autónomas
(e antes para as colónias), bem como os direitos de tráfego herdados
dos tempos em que voava em exclusivo para certos destinos, conferem à
companhia aérea nacional um valor acrescido relativamente a congéneres
privadas nacionais e estrangeiras que constituem a sua grande
mais-valia. Ignorar este facto constituiu um crime de lesa-pátria
dificilmente aceitável num país dito civilizado e orgulhoso da sua
história.
O que ficou dito não invalida porém a privatização
da TAP. Sendo uma empresa essencialmente comercial será legitimo e até
natural que o governo a inclua no lote de empresas estatais a
privatizar. Mas uma privatização especial, rodeada de especiais
cautelas e reservas que não firam aquilo que ela tem de soberano.
Porque a soberania não se privatiza. Ganha-se ou perde-se. É certo que
são precisamente os tais direitos de tráfego que lhe dão valor
acrescentado relativamente a outras congéneres, quiçá mais atractivas
em termos económicos. Daqui decorre o melindre da sua privatização,
exigindo ao governo um cuidado acrescido na respectiva negociação.
Vender a TAP sim, mas vendê-la com condições que não firam a soberania
nacional. O critério do melhor pagador (tal como decorreu da venda da
parte estatal da EDP) não deve ser exclusivo na escolha do comprador.
Dever-se-à atender, a meu ver, sobretudo à preservação dos beneficios
resultantes dos direitos de tráfego relativamente aos passageiros
portugueses e estrangeiros que demandem o território nacional. E isto
faz-se mantendo os "hubs" de Lisboa, do Porto e de Faro. Fazendo
desaparecer as caracteristicas de aeroportos de rotação destes tres
terminais nacionais para voos com destino ao Brasil e a África,
estaremos a contribuir para um cada vez maior isolamento de Portugal
das rotas aéreas internacionais. A privatização da TAP deve ser feita
não só relativamente a companhias a quem convenha manter os "hubs"
existentes em território portugues, mas tambem atendendo aos
interesses do futuro dono da ANA, que detém a exploração comercial
desses mesmos aeroportos. E dificilmente se vê nas companhias aéreas
europeias esse interesse. TAP e ANA devem ser privatizados
conjuntamente, não necessariamente ao mesmo tempo nem à mesma
entidade, mas atendendo aos interesses de quem as quer comprar e não
exclusivamente a quem dá mais.
ALBINO ZEFERINO 18/4/2012
Sem comentários:
Enviar um comentário