quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

A DOENÇA PORTUGUESA


          Portugal está doente desde que apanhou um virus chamado PREC, na sequência da romantica e florida revolução de 25 de abril de 1974. O virus instalou-se primeiro insidiosamente no espírito dos militares revolucionários, depois progrediu dentro da generalidade da tropa, para finalmente infectar a maioria da população portuguesa, que até hoje ainda não conseguiu ver-se livre dele.  Originário do Leste europeu, o PREC apresentou-se primeiro sob a forma dum processo socio-politico regenerador, progredindo depois, por fases, até à infecção generalizada da sociedade portuguesa. Sob o lema dos 3 D (democratização, descolonização e desenvolvimento) o virus atacou primeiro o sistema politico, depois a economia e finalmente os espiritos simples dos portugueses.
          A 28 de setembro desse ano, durante uma manifestação orquestrada a partir duma corrida de touros no Campo Pequeno, em Lisboa, começou a fase da infecção politica, com o despedimento do governo provisório dos elementos não afectados pelo virus, a perseguição aos partidos dos não infectados (ao que se seguiram as barragens populares intimidatórias nos acessos a Lisboa, a tomada pelos infectados dos sectores mais sensiveis da sociedade portuguesa - sindicatos, transportes e comunicações, educação e cultura, comunicação social, justiça, segurança social etc.).
          Em 11 de março de 1975, passou-se à fase seguinte, com a ocupação das propriedades agricolas, a nacionalização (sem indemnizações) das empresas privadas mais lucrativas (banca, seguros, grandes grupos financeiros,etc.) e o aumento indiscriminado dos impostos (uma espécie de saque legalizado). Durante o verão desse ano (que ficou conhecido pelo verão quente), o virus começou a infectar os espiritos das pessoas, através das campanhas de esclarecimento (sobretudo na provincia), da prisão indiscriminada dos não infectados (acompanhadas de boatos aterradores de próximos enforcamentos colectivos dos não infectados), de saneamentos selvagens na função publica e nas empresas nacionalizadas, do controlo da comunicação social e das editoras, etc. etc.
          Só em 25 de novembro de 1975 é que a progressão do PREC foi estancada, quando alguns militares menos enlouquecidos conseguiram travar a disseminação descontrolada do virus, com um contra-golpe que por pouco não acabou em sangue.  Mas o mal continuou instalado no espírito simples dos portugas, que interiorizaram os conceitos do PREC que lhes foram impostos, confundindo os beneficios imediatos que lhes cairam do céu com direitos inalienáveis (que passaram a chamar-se adquiridos) de que realmente não gozavam. Passados quase 40 anos desta infecção, o povo portugues continua a viver com o virus (que deixou entretanto de se chamar PREC) que ficou cristalizado nas mentes simples dos portugueses e do qual (27 anos depois da adesão à Europa civilizada) não se conseguiram ainda ver livres.
          É esta a razão fundamental pela qual não é possivel reformar Portugal.  Arreigados à tacanhez dos direitos adquiridos (conceito contraditório nos seus termos, pois os direitos não se adquirem, são concedidos para serem usufruidos) os portugas consideram os direitos que lhes foram concedidos como sendo sua propriedade, como um cavalo ou um automóvel e não como algo que lhes foi concedido para ser usado em determinadas condições. E da mesma forma que os direitos lhes foram concedidos poderão, em caso de força maior, serem-lhes retirados ou recusados. O direito ao trabalho existe, quando há trabalho para fazer. Não se vai inventar trabalho quando ele não é necessário. O direito à saude existe, quando há meios para o proporcionar (haverá direito à saude em África ou na Ásia, por exemplo?). O pleno emprego e a segurança social generalizada só existiram (em teoria) em regimes marxistas, que desapareceram por isso mesmo.
          A recente decisão do tribunal constitucional de considerar inconstitucional a harmonização dos regimes de pensões nos sectores publico e privado, ou a insistencia em manter abertos os estaleiros de Viana do Castelo (cuja manutenção - por muitas encomendas que tenha em carteira - é superior à despesa que provoca ao Estado) são a prova provada da impossibilidade de reforma do Estado portugues. Não foi por acaso que o responsável pela reforma do Estado se demitiu, nem foi por acaso que o anterior ministro das Finanças se foi embora. Ambos chegaram à conclusão de que Portugal é, nas actuais condições politicas (ou seja, com a actual Constituição), irreformável. Esperemos que os nosos parceiros europeus não cheguem à mesma conclusão.

                                ALBINO ZEFERINO                                   20/12/2013
         
                 

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