segunda-feira, 26 de maio de 2014
A CONFUSÃO EUROPEIA
No rescaldo das eleições para o Parlamento europeu muito se tem dito a propósito das lições a tirar dos resultados. Que a esquerda tinha perdido, que os eurocéticos tinham tomado conta do hemiciclo europeu, que os extremos (esquerda e direita) tinham tornado a Europa ingovernável, etc. etc.
Para mim, duas conclusões podem ser tiradas. A primeira é que os resultados eleitorais tiveram significados e interpretações distintas consoante os países onde a eleição se realizou. A segunda é que essas interpretações e esses significados não tiveram em linha de conta o peso específico de cada país no conjunto do eleitorado europeu. Destas conclusões pode extrair-se uma consequencia que é a seguinte: cada vez conta menos a vontade dos eleitores de cada país de per si em comparação com a vontade dos cidadãos europeus considerada globalmente.
Será que a vitória pírrica do PS portugues corresponde a uma viragem à esquerda do eleitorado europeu? Não creio. Basta somar os votos obtidos pelo PPE comparativamente com os obtidos pelo PSE para verificar que a direita venceu na Europa. Será que a vitória do Syrisa na Grécia correspondeu a uma tomada do poder da extrema esquerda naquele país? Tambem não creio. Os votos da Nova Democracia (centro-direita no poder) somados aos obtidos pela Aurora Dourada (extrema direita grega) ultrapassam a soma dos do Syrisa com os do velho PASOK (socialistas gregos).
Por outro lado, será possivel comparar (em termos europeus entenda-se) a subida do Front National frances (25% do eleitorado) ou da vitória do partido de Nigel Farange (extrema direita na Grã-bretanha) com o aumento do PC portugues, ou mesmo do partido do PM italiano (esquerda moderada)? Quantos votos valem 25% do eleitorado frances? 20 milhões de eleitores europeus? Talvez mais ainda. E 31% do PS portugues ou 20% do Syrisa grego? 1 milhão cada um? Talvez nem isso. Como se vê, as contagens valem aquilo que os contadores contarem. O que realmente conta são as tendências (como na moda) que manifestam as eleições. E a tendência destas eleições europeias foi no sentido da dispersão do votos com predominancia de votação nos extremistas (sobretudo à direita).
A partir daqui é que as extrapolações politicas devem ser feitas. Se o novo executivo europeu pretender reflectir a vontade popular expressa nestas eleições então deverá governar à direita mas sempre de olhos postos nos extremos (esquerda e direita). Os governos nacionais (se porventura não reflectirem estas tendencias) deverão governar mais cuidadosamente ainda, senão governarão mal e desajustados da realidade. Se o PS portugues vier a repetir nas próximas eleições legislativas a vitória de Pirro que o eleitorado luso lhe deu ontem, então terá muito que contorcer-se para não governar desajustado do resto da Europa onde pretende ficar. Menos promessas e mais acção. Menos fantasias e mais realismo. Menos dogmatismo bacoco e mais pragmatismo reformista.
ALBINO ZEFERINO 26/05/2014
sábado, 24 de maio de 2014
A INVASÃO ESPANHOLA
Desde que Portugal é um país independente que mais ou menos cada 200 anos os amigos espanhois tentam invadir-nos. Umas vezes com mais sucesso, outras com menos, mas sempre com determinação, alegria e descontração. A relação entre os dois povos ibéricos é encarada de um e de outro lado da fronteira de forma diferente. Enquanto que os portugueses se orgulham de ser o único país que conseguiu consistentemente separar-se do centralismo castelhano já lá vão quase 900 anos, os espanhois pelo contrário nunca aceitaram de bom grado a existencia de um país independente - com o mesmo estatuto deles - na Peninsula ibérica ( da qual eles se consideram legitimos e exclusivos donos). Que existam povos distintos dentro duma mesma unidade, muito bem. Isso até confere uma certa importancia à unidade. Agora que uns tantos rebeldes se considerem com a mesma natureza do conjunto dos outros já não é facilmente aceitável. Por essa razão não desistem da união ibérica.
Foi assim no final do século 12 quando Afonso Henriques gastou a sua vida na afirmação da independencia de Portugal face ao hegemónico reino de Leão. Voltou a ser assim no final do século 14 quando os ingleses insistiram em preservar a independencia de Portugal ajudando o Mestre de Avis a escorraçar o castelhano, convencido de que era dessa vez que a normalidade institucional iria ser reposta. Foi mais uma vez assim quando o grande Habsburgo finalmente se impôs em Portugal em finais do século 16 para ficar por cá durante 60 anos. E voltou a ser assim no inicio do século 19 quando, aproveitando a onda napoleónica, os espanhois se juntaram a Junot, a Soult e a Massena para entrarem em Portugal e por cá se instalarem num casamento franco-espanhol contra natura. A última tentativa deu-se com a adesão simultânea de ambos países à então CEE, em 1986, depois de negociações paralelas (para não dizer conjuntas) com Bruxelas. É que os europeus ainda não interiorizaram a independencia portuguesa, por não entenderem como um território tão inóspito e selvagem, habitado por umas gentes tão matarruanas e primitavas, sem quaisquer recursos ou mais-valias se tenha conseguido impor à raça espanhola, tão diversa e rica nas suas contradições e diferenças, tão lutadora e salerosa, que mata o touro sem piedade e morre de amor na refrega.
Nos dias de hoje em que os exércitos foram substituidos pelas arruadas, as estratégias pelas OPA`s e as conquistas territoriais pelas tomadas de posição financeiras, é o futebol quem manda. A circunstancia (como dizia o espanhol Ortega e Gasset) tomou conta dos homens e a final da FIFA que se vai disputar no Benfica (não contra o Benfica) entre os dois maiores clubes ibéricos (por acaso das circunstancias, ambos madrilenos) é o pretexto para a nova invasão. Pacífica desta vez (espera-se) mas mesmo assim invasão. A alegria e o ruido espanhois invadiram Lisboa. As estradas e os aeroportos estão atafulhados de espanhois de todas as raças e feitios. Nuestros hermanos consideram-se em casa. Quase no Barnabeu ou em Vallecas. Depois desta final já nada será igual. Ganhe quem ganhe serão sempre os espanhois a ganhar.
ALBINIO ZEFERINO 24/05/2014
sábado, 17 de maio de 2014
O REGRESSO ÀS AULAS
Hoje é dia de festa na escola C+S da Portugália. É o dia em que os alunos regressam às aulas já sem a tutela duns gajos que não os deixavam brincar à vontade. Tinham sido chamados à pressa há 3 anos pela Comissão de Pais que, de cabeça perdida à vista da anarquia reinante na escola dos seus filhos onde ninguem parecia ter mão neles, contrataram uns gajos duros e impiedosos que impuseram aos alunos uma disciplina que eles nunca tinham conhecido antes. Após 40 anos da abertura da nova escola C+S, criada sobre os escombros da velha escola de Nossa Senhora da Piedade nascida nos idos de 1926, que os alunos da nova escola se habituaram a fazer o que lhes dava na gana. Faltavam às aulas sem qualquer justificação, tomavam drogas na escola à vista uns dos outros, batiam-se entre si e batiam nos outros, ameaçavam, gritavam, ofendiam e batiam nos professores, levavam armas para a escola e exibiam-nas abertamente nas aulas, fumavam durante as aulas e entravam e saiam das salas sem dar quaisquer explicações aos professores, faziam marmelada e sexo entre eles pelos cantos da escola sem pudor (e até nas salas de aula) e sobretudo não estudavam nem aprendiam nada. Depois de muito meditar e dada a inoperância do director da escola - um tal Sócrates, que se julgava filósofo como o grego, embora nem licenciado fosse - os pais desesperados contrataram uma firma especializada em saneamentos chamada troika que aplicou às crianças rebeldes um plano - a que chamaram memorando de entendimento - para os meter na linha. O plano foi de tal forma violento que pôs a gandulagem a pão e água. Os alunos, impedidos de fazerem o que lhes dava na gana, exasperavam pelo fim da tutela saneadora da troika para, de novo, poderem dar largas aos seus baixos instintos e inconsciente comportamento. Pudera. Os pais deles, tão preocupados agora que eles não ligavam nenhuma às suas admoestações, tinham feito exactamente o mesmo quando tinham a idade deles.
Depois da festa comemorativa da partida da troika da Portugália, o que será agora o ensino na escola já sem a tutela saneadora? Será que os meninos passarão a ser pontuais e ordeiros nas aulas sem que o agente da troika os intime? Será que seguirão atentamente as explicações dos professores sem recalmar e sem os interromper com imbecilidades e impertinências? Será que respeitarão a autoridade dos professores necessária para o normal funcionamento da escola? Será que se absterão de praticar actos proibidos e imorais na escola e deixarão de se agredir e cometer bulling por tudo e por nada? Será que aprenderam alguma coisa da intervenção da troika na escola C+S da Portugália?
Receio bem que esta curta intervenção saneadora tenha provocado mais repulsa do que trazido algum juizo às pobres cabecinhas destes imbecis. O que receio verdadeiramente é que tudo volte a ser como dantes e que a próxima intervenção da nova troika seja já à bruta e sem as contemplações que a que hoje se vai embora utilizou no seu paciente labor saneador. Deus nos livre disso!
ALBINO ZEFERINO 17/05/2014
domingo, 11 de maio de 2014
O LOGRO DOS REFERENDOS UCRANIANOS OU OS LIMITES DA DEMOCRACIA DIRECTA
Conhecidos os resultados dos referendos realizados no passado fim de semana em Donetz e noutras regiões autónomas ucranianas que se reclamavam favoráveis à integração na Russia, verifica-se que a consulta popular desligada da lógica eleitoral constitucionalmente estabelecida não passa de uma forma de iludir a vontade popular, cuja legitimidade só deve manifestar-se através de eleições de natureza geral e realizadas dentro duma periodicidade constitucionalmente estabelecida.
Consultar o povo sempre e quando pareça a um qualquer grupo contestatário que determinada situação deve ser alterada revela-se perigoso e até contraproducente com os principios democráticos, pois desvirtua o conceito do sufrágio universal e distorce a manifestação da vontade colectiva. Perguntar aos que contestam (e só a eles) se concordam com a situação contestada ou inquirir os queixosos (e só estes) sobre a legitimidade das respectivas queixas é partir vencedor para uma corrida ainda antes da partida. Este tipo de procedimentos caracteriza as sociedades anti-democráticas que fingindo utilizar processos democráticos atingem os seus objectivos politicos duma forma não democrática. Exemplos do que digo foi a época salazarista em Portugal, é o que se passa ainda hoje em muitos países africanos e asiáticos e caracterizou o período marxista-leninista na Europa do Leste no pós-guerra. Faziam-se eleições quando calhava ao governo, apenas eram admitidos ao sufrágio aqueles que concordavam com o governo e o acto eleitoral era monitorizado por agentes do governo.
Para melhor compreender o que aqui quero deixar expresso, façamos um suponhamos. Suponhamos que o governo regional da Madeira pretendia que o território se separasse de Portugal. Era convocado um referendo local para o efeito que obteria 99,9% de sins. O arquipélago ficaria independente de Portugal, mas como não tem condições de subsistir isoladamente, era imediatamente anexado pelas Canárias passando a fazer parte da Espanha. Seria isto o que os madeirenses quereriam?
A utilização dos referendos para apuramento da vontade popular fora duma contextualização muito precisa e constitucionalmente regulamentada é não só anti-democrática como é ilegitima, por distorcer precisamente aquilo que se pretende clarificar. Não tenhamos ilusões. Putin estabeleceu uma estratégia para desestabilizar a Ucrânia de forma a impedir que a UE e a NATO se instalem às portas da Russia. É a partir daqui que há que negociar. Os americanos já perceberam isso. Os europeus fingem não ter percebido.
ALBINO ZEFERINO 12/05/2014
sábado, 10 de maio de 2014
HAJA JUÍZO!
Terminado o período da troika, seria de esperar que o susto causado pela proximidade do descalabro nacional em que o país esteve pelas mãos gananciosas dos sócretinos afastasse durante algum tempo o expectro de um regresso socialista às lides deste pobre país de simplórios, atirado de Herodes para Pilatos qual Cristo redentor das almas ingratas de judeus farisaicos. Mas não! Os povos têm a memória política curta e a sabedoria das gentes- obnubilada pelas vozes esganiçadas dos novos profetas da desgraça colectiva - não enxerga o risco que Portugal correrá se for de novo lançado para os braços perdulários dos socialistas sedentos de privilégios e de beneficios que o exercicio do poder acarreta neste país de opereta bufa. É que nem na Grécia, onde o PASOK- responsável, como o PS aqui, pelo descalabro nacional em que o país caiu - passou de partido tradicional do poder para o fim da escala das opções politicas gregas não se antevendo ressurreição politica possivel nas próximas décadas, os socialistas voltarão a levantar cabeça tão cedo, punidos definitivamente pelas urnas helénicas.
Mas em Portugal não! Parecendo não existir mais opções governativas do que aquelas que o rotativismo monárquico já oferecia há 100 anos, o verdadeiro poder em Portugal continua circunscrito à opção entre os que defendem que deve ser o Estado o motor do progresso colectivo, ou que esse progresso deve ser deixado à iniciativa individual. Ou seja, deve ser o PS a conduzir a barca nacional embrulhado nas suas contradições ideológicas existenciais, ou deve ser o PSD envolvido nos seus compromissos esquemáticos partidários?
Reduzidos a esta já gasta dicotomia opcional, os eleitores lusitanos estão cansados de tanta exploração de um e de outro lado da barricada, mostrando cada vez mais desinteresse por quem efectivamente os governa e preocupando-se cada vez mais com as consequencias concretas dessas governações nos seus bolsos e na sua vida quotidiana. Já não se trata de escolher quem vai para o poleiro gozar das mordomias que essa situação oferece, mas sim de quem vai conduzir os destinos do país em beneficio do povo que o elegeu. Aqui reside a diferença entre a politica do século 20 e a do século 21. Governar hoje não é ser adulado pelo Zé povinho pedinchando favores ou ir almoçar regularmente ao restaurante da moda por conta do lugar que exerce conduzido pelo primo menos afortunado no velho Mercedes do Estado. Governar hoje é dedicar-se inteiramente à coisa publica, acordar cedo e dormir pouco, trabalhar a horas e a desoras, hesitar com angustia na escolha das melhores soluções, ser imparcial nos julgamentos que de si dependem, poupar no colectivo como poupa em sua casa, enfim, ser sério e honesto nas suas atitudes e nos seus propósitos. Só assim merece ser eleito e só assim deveria ser aceite por todos. Haja Juízo!
ALBINO ZEFERINO 10/05/2014
quinta-feira, 1 de maio de 2014
A GEOESTRATÉGIA MUNDIAL RELATIVAMENTE À UCRÂNIA
Enquanto se vai arrastando a crise na Ucrânia com o aumento da animosidade entre russos e norte-americanos pelo dominio geoestratégico da Ucrânia, não se antevê para breve o fim pacifico da crise que assola aquele país.
Efectivamente, desde a queda do muro de Berlim que regressaram aos espíritos dos dois blocos que se opunham na guerra fria os fantasmas da 2º Grande Guerra, consubstanciados pela tentativa de controlo da Ucrânia, país charneira entre o Leste e o Oeste, entre a civilização de tipo ocidental e a barbárie eslava. A Ucrânia serviria como um Estado tampão, uma fronteira alargada dir-se-ia, entre a UE civilizada e os russos à solta. A crise, que hoje aparece às claras para gáudio dos jornalistas que se alimentam de conflitos reais ou latentes, começou quando, desfeita a CEI - a primeira tentativa geoestratégica da nova Russia para delimitar (ou melhor, marcar os limites toleráveis da influência ocidental a Leste) a sua própria zona de influencia - a Ucrânia ficou à mercê da UE ávida do seu progressivo alargamento a Leste. Instalado um regime pró-europeu na Ucrânia, logo os russos fizeram vingar a sua próximidade étnico-geográfica para derrubarem a nóvel PM Julia Timoshenko e alçarem para o seu lugar um russófilo. A crise estalou quando o povo ucraniano (cansado das diatribes do novo governo pró-russo) correu com ele e saltou para as ruas reclamando liberdade, igualdade e justiça. Recomposto da surpresa, Putin aproveitou-se da confusão para reclamar para a órbita russa as regiões ucranianas de maioria russa (Crimeia e mais algumas confinantes com o território russo) onde armou, finaciou e animou a população outrora russa a rebelar-se contra o poder revolucionário instalado em Kiev.
Preocupados com o desenvolvimento da situação (que parecia replicar a estratégia nazi de há 70 anos que deu origem à 2º Guerra mundial) os norte-americanos chocalharam os europeus na NATO e admoesatram a UE (através dos seus aliados preferenciais, os ingleses) para criarem uma frente comum que reagisse ao desaforo russo. Aproveitando-se de uma providencial reunião do informal grupo do G-20 (agora já sem a Russia convenientemente expulsa do grupo) os americanos (sob a experiente batuta do novo secretário de Estado Kerry) comprometeram os países da UE e da NATO (praticamente os mesmos) a imporem sanções à Russia na tentativa de Putin abandonar a sua estratégia longamente meditada e preparada desde o desmembarmento da CEI de "tomar conta" da Ucrânia.
Não creio porém que seja através da imposição de sanções desgarradas e inofensivas que a Russia de Putin desista da criação de um tampão por ele controlado que trave o avanço dos ocidentais para Leste. O que se me afigura é que Putin - uma vez conseguido o controle das regiões fronteiriças onde habita a população maioritariamente russa da Ucrânia - ceda na tentativa de voltar a controlar Kiev, que deixará então aos europeus para expansão da UE. Todos sairão vencedores. Putin mantém a zona tampão que pretende (sem perder os lucros do gás que exporta para a Alemanha através do gasoduto ucraniano) abdicando do resto da Ucrania que não lhe interessa; a UE ganha mais um país para as suas fileiras, alargando-se para Leste (já está a financiar Kiev para "segurar" esse alargamento); a Alemanha mantém as suas boas relações com a Russia (continuando a receber o gás russo a preços de saldo) e os EUA (e os democratas de Obama) podem anunciar ao resto do mundo que, sem eles, a crise ucraniana não se teria resolvido.
O que não ficará na mesma é a "détente" russo-americana que poderá pressagiar uma nova corrida aos armamentos num novo quadro geoestratégico mundial que envolverá mais a Ásia (e sobretudo a China) e menos a Europa (e sobretudo a UE) como parceiros privilegiados dos EUA no policiamento do mundo.
ALBINO ZEFERINO 1/5/2014
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