domingo, 30 de novembro de 2014

A JUDICIALIZAÇÃO DO REGIME


          Os recentes acontecimentos de natureza criminal a que a sociedade portuguesa tem sido exposta e que provocaram um excessivo protagonismo por parte dos juizes nele envolvidos, sugerem um desenvolvimento perigoso para o futuro do regime com a consequente deterioração da sua essencia democrática. O raciocinio em que esta conclusão se baseia é simples: Se as instituições democráticas em que o regime politico assenta (governo, parlamento, presidente) não foram suficientemente capazes de absorver naturalmente e sem sobressaltos os desvios à moral e à ética politicas provocados por inescrupulosos agentes do poder, permitindo (por omissão dos seus deveres de controle ou mesmo por conluio criminoso com os prevaricadores) que os juizes justiceiros interviessem de forma a evitar que os criminosos continuassem a agir impunemente, esta inação (ou acção preversa ou incapaz) legitima reacções, por parte da população despeitada, potencialmente perigosas para o regime e eventualmente violentas para a sociedade.
         Foi para tentar evitar estas situações que se criou uma onda de solidariedade para com o ex-primeiro ministro socialista (encabeçada pelo inefável Soares, velho mas ainda suficientemente desperto para estes fenómenos) materializada nas saloias peregrinações a Évora para onde o energúmeno foi levado (justamente para dificultar estas manifestações de apoio) e permitindo as cartas ameaçadoras e as negações dos crimes por parte do acusado. É que não convém nada ao PS, saído ferido duma feroz e inédita contenda fratricida, aparecer aos olhos dum eleitorado especado por tanta pouca-vergonha, misturar aquilo que é evidente para toda a gente: se não fossem os socialistas não teria havido Sócrates, nem as porcarias e os desmandos que o desavergonhado fez.
         Do mesmo modo se poderá raciocinar com Salgado e com o escandalo do BES. Não fora a deficiente forma (há quem não exclua até o conluio) como as autoridades portuguesas lidaram com este assunto e o caso não teria chegado tão longe. A ganância duma só familia atingiu (espera-se que não tenha sido fatalmente) o regime capitalista em Portugal, recriado pacientemente durante dezenas de anos por denodados agentes, esforçados e audazes. Quem acredita hoje nos bancos? Creio que já nem os que neles trabalham.
         Foi assim que, aproveitando as hesitações e tibiezas dos que deveriam ter agido por obrigação de oficio, os juizes entraram de roldão na casa das pessoas graças às televisões, acusando, interrogando e prendendo os prevaricadores e expondo na praça publica as maldades que fizeram. Já antes com os pedófilos algo de parecido tinha sido feito. Mas aí, a coisa não tocava a todos. Com Sócrates e com Salgado, a coisa toca a todos e portanto toca ao regime.
          O risco que esta judicialização da politica faz correr é o de criar na cabeça das pessoas a convicção de que os politicos não servem para nada. Quando é preciso agir, não agem. Só agem por interesse próprio ou do partido em que se inserem. Ora os juizes não são agentes do poder executivo. Não têm que se substituir ao governo nas suas ausencias ou falhas. Ao governo cabe governar (espera-se que bem e honestamente) vigiando, controlando e fazendo cumprir a lei e acusando (quando for caso disso) os prevaricadores. Aos juizes cabe julgar aqueles que venham acusados de crimes ou de malfeitorias e condená-los ou absolvê-los. Nada mais a democracia lhes exige ou lhes permite. Quando esta divisão de poderes é posta em causa há que agir. E quem deve agir é o mais alto magistrado da Nação. De acordo com a sua consciencia e com a sua sabedoria. Para isso existe e para isso lhe pagam.
          Este fenómeno não é novo. Aconteceu nos anos 80 em Itália com a luta contra a Máfia (o célebre juiz Falcone e outros foram assassinados pelas Brigadas Vermelhas) e mais recentemente em Espanha com o célebre juiz Garzón que decidiu perseguir os franquistas prevaricadores e depois (cheio dos seus sucessos) avançou para a América do Sul atrás de Pinochet e dos generais argentinos. Cedo porém foi afastado, salvando-se de ser assassinado. Por cá a coisa parece estar a começar. O risco não é tanto a saude do juiz Alexandre, mas a descrença na politica que as suas acções (meritórias e corajosas, sem nenhuma duvida) causam nas mentes lhanas dos portugueses. Imagine-se que nas próximas eleições legislativas a abstenção ultrapasse os 50% e que o partido vencedor não atinja a maioria absoluta dos votos expressos. Com que legitimidade governará? Como serão pacificamente aceites os sacrificios que forçosamente terá que continuar a exigir às pessoas? Não sei.

                               ALBINO ZEFERINO                                   30/11/2014

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

OS REACCIONÁRIOS



          Antigamente eram chamados reaccionários aqueles que reagiam à mudança. E o que era a mudança? A mudança era tudo aquilo que se apresentasse como novo, coisa nova, nova experiência, melhoria na situação dos mais desfavorecidos, progressismo nas ideias e nos actos. É claro que para os abastados (ou burgueses como tambem se lhes chamava) tudo aquilo que representasse mudança no status quo representava um risco para a situação dos burgueses. Risco de perderem os seus privilégios de classe (isenções de obrigações, ordenados chorudos, mordomias injustificadas, poderes pequeninos, etc. etc.), risco de perderem o seu dinheiro (nacionalizações das suas empresas e dos seus bens, pressões dos sindicatos, greves reivindicativas, manifestações publicas, exigencias salariais dos trabalhadores, etc. etc) e risco de perderem o seu estatuto (profissional, social e até económico). De tudo isto se viu logo a seguir à revolução de Abril, com as perseguições pessoais, as prisões arbitrarias, as nacionalizações selvagens e os roubos tolerados. Mas tambem em período democrático continuou-se a distinguir os bons dos maus (conforme a prespectiva de onde se observasse) entre os que tinham (dinheiro, poder, autoridade) e os que não tinham (os pobres, submissos e obedientes). Para os possidentes (seriam reaccionários) convinha-lhes que nada mudasse e que tudo ficasse na mesma. Para os possidónios (os amantes do progresso) tudo o que representasse mudança trazia-lhes esperança de melhores dias.
          Tudo isto foi posto em causa com a maldita crise que trouxe austeridade para todos (ricos, pobres, poderosos ou insignificantes) quando todos se começaram a aperceber de que o futuro (que lhes tinha sido apresentado como risonho e cantado) seria negro e sem fim à vista. A partir do momento em que se generalizou a convicção que o status quo estava a mudar, os ricos passaram a recear que nada fazer não lhes garantia a manutenção do seu estatuto e os pobres começaram a perder as esperanças de melhorias das suas situações através dos mecanismos próprios da democracia. Estas convicções foram o rastilho necessário para que a grande confusão se instalasse  nos espíritos da malta e que surgissem verdadeiras manifestações de desespero no seio dos mais recalcitrantes. Refiro-me à contestação aberta às medidas regeneradoras do governo por parte de antigos governantes e responsáveis por anteriores governos tão ou mais culpados do que o actual pela situação miserável a que chegamos, e à confusão ideológica da chamada esquerda que não sabe para onde ir, nem como proceder diferentemente quando lá chegar. Tambem são reflexos desta enorme confusão que paira nos espíritos fechados dos portugueses de hoje, o aumento generalizado e a forma escandalosa como a corrupção se pratica a todos os níveis da sociedade portuguesa. Já não é a simples cunha ou distorsão à lei que outrora fazia demitir ministros e expulsar responsáveis das suas funções, é a impunidade em que hoje ficam os verdadeiros gangsters que saquearam fortunas alheias e prejudicaram os seus concidadãos por várias gerações. A moralidade está em crise e a justiça tambem.
         Natural é assim que os mais oportunistas (ou aproveitadores de oportunidades como se queira chamá-los) comecem a pensar em alternativas. Não apenas em alternativas aos governos instalados ou a instalar, mas mais em alternativas ao status quo. Status quo que aqui significa democracia representativa. Contesta-se abertamente a representatividade dos deputados, contesta-se igualmente a legitimidade do pagamento da divida externa, contesta-se a legitimidade dos governos e da autoridade em geral, contesta-se tudo aquilo que nos obrigue a mais sacrificios. A situação de confusão a que se chegou já não se compadece com simples mudanças de governos, de caras ou até de orientações. O que a malta quer é mudança de status quo. Mas como? Através de quê? Com que meios? Será possivel de um só golpe voltar atrás, fazer de conta que não devemos nada a ninguem, arranjar emprego para os desempregados, futuro para os jovens e bem-estar para a horda de desvalidos que consome os cofres do Estado com os seus subsidios e apoios à mendicidade? Não creio.
          É neste contexto de mudança que começam a surgir por todo o lado (em Portugal ainda não) tentativas politicas que, a coberto de populismos e demagogias perigosos, se apresentam ao eleitorado como os salvadores do mundo em crise e profetas duma nova forma de gerir a coisa publica. É o caso do Syrisa de Tsirpas na Grécia, do Podemos de Iglésias em Espanha, do Cinco Estrelas de Beppe Grillo em Itália, do Partido Pirata na Suécia e do Die Linke na Alemanha (que vai entrar no governo da Turíngia). Tudo malta reivindicativa e esquerdófila. Não será isto o principio do fim da União Eurpeia como nós a conhecemos e a estudamos? Pela direita, em França, o Front National de Le Pen já vai mais adiantado e aspira a uma vitória esmagadora nas próximas eleições, enquanto que o perigoso UKIP de Nigel Farage, no Reino Unido, ameaça Cameron e sobretudo a Europa unida. Não será altura para que os novos responsáveis comunitários (e sobretudo os governantes alemães e franceses) aproveitem estas ameaças ao projecto europeu e duma vez por todas se lancem numa verdadeira união de Estados capaz de fazer frente a estas ameaças e de sobretudo trazer aos cidadãos europeus a esperança de que melhores dias vão chegar. Assim seja para todos e sobretudo para nós.

                           ALBINO ZEFERINO                                      21/11/2014

domingo, 9 de novembro de 2014

OS MAL AGRADECIDOS


          Pela segunda vez em poucos meses os "irmãos" timorenses desfeitaram Portugal. Primeiro, com a "eleição" antecipada do ditador da Guiné Equatorial para membro da CPLP, quase à revelia do Presidente e do primeiro ministro de Portugal que, cheios da importancia que julgavam levar com a sua presença em Dili na cimeira de Chefes de Estado e de Governo dos países da CPLP, viram o caquético Presidente guiné-equatoriano já sentado ao lado dos outros na cerimónia de entronização do novo Estado-membro da organização, mesmo antes de iniciada a cerimónia. Agora, com a expulsão inusitada dos magistrados portugueses de Timor, acusados de má conduta profissional.
          Se a primeira desfeita poderia ser justificada (ou fingindo ignorá-la) atendendo ao receio que os timorenses sentiam perante as repetidas duvidas manifestadas por Portugal quanto à idoneidade democrática do governante guiné-equatoriano para fazer parte da CPLP, já a segunda desfeita não tem qualquer justificação. A cooperação judiciária que Portugal bem-intecionadamente prestava ao Estado irmão exigia, no minimo, consultas prévias que evitassem tal afronta. Aceita-se que o exercicio de um poder soberano exercido por elementos de outro país num país terceiro devesse ser praticado com as maiores cautelas (o que aparentemente parece não ter sido feito), mas é inaceitável uma decisão politica extrema e imprevista, sem prévias consultas com os responsáveis do país cooperante, tivesse tido lugar sem represálias correspondentes à afronta. O anuncio da simples interrupção unilateral da cooperação judiciária por parte de Portugal não basta.
          Ansiosos por mostrar aos seus novos amigos petrolíferos que quem manda em Timor Lorosae são exclusivamente os seus governantes, Xanana e os seus ministros aproveitaram os deslizes neo-colonialistas portugueses para manifestar uma independência que não têm, à custa dum grave insulto aos que lhes proporcionaram, com o seu denodo e determinação, uma independência formal, ainda não inteiramente solidificada. Sem Portugal, Timor não seria um país formalmente independente, nem teria condições de governabilidade, que a presença das forças da ordem portugesas e os juizes portugueses lhe proporcionam. Por seu lado, com a sua passividade e condescendência, Portugal mostrou que não tem estatuto (nem condições) para cooperar eficazmente com terceiros, mesmo quando sente que é indispensável para assegurar as condições minimas para que Timor possa continuar independente.
          No primeiro caso, Portugal poderia ter minimizado a afronta se a tivesse previsto. A presença simultânea do chefe de Estado e do chefe do governo de Portugal na mesma cerimónia (presença apenas formal, uma vez que a decisão politica sobre a entrada da Guiné-Equatorial na CPLP já tinha sido tomada antes) foi exagerada e deveria ter sido evitada. Sem as mesmas razões para igual cautela (Brasil e Angola sempre defenderam a entrada incondicional da Guné-Equatorial -país com petróleo - na CPLP), os chefes de Estado brasileiro e angolano (ambos detentores do poder executivo nos seus respectivos países, ao contrário de Portugal) delegaram a sua presença nos seus ministros dos Negócios Estrangeiros e nada nem ninguém deu pela sua falta. Mas nós não. Como antigos colonizadores e actuais cooperantes activos de Timor (como que "tutores" da sua independência), tivemos que nos fazer representar numa cerimónia formal (e banal) pelos dois mais altos responsáveis pelos destinos de Portugal, para mostrar ao mundo que ainda tinhamos algo a dizer sobre Timor.
Que ilusão. Com a desfeita manifestada aos nossos mais altos dignatários, os timorenses disseram alto e bom som que Portugal (e as suas opiniões) para eles nada conta.
          No caso da expulsão inusitada dos magistrados portugueses (como se de vulgares delinquentes se tratassem) a afronta assumiu foros de ofensa publica e oficial (fazendo lembrar o ultimato ingles a Portugal em 1890), não se compadecendo, a meu ver, com uma simples e formal declaração (por parte apenas da ministra da Justiça responsável pela cooperação judiciária) de que a cooperação pela qual é responsável ficava suspensa. Até quando? Em que condições? Aguardando um pedido de desculpas para ser retomada? E as restantes relações? Ficam tambem suspensas ou não serão afectadas? O nosso embaixador continua por lá como se nada de grave tivesse acontecido? A cooperação policial, militar e a do ensino da lingua portuguesa continua, como se nada tivesse a ver com isto? Portugal aceita que outro país (mesmo tratando-se do "irmão" timorense) o trate com a displicência e o desprezo que a decisão de Xanana revelou? Se assim for, então merecemos mesmo ser tratados como "protegidos" dos nossos credores, como alguns indignados acusam o governo de aceitar.

                      ALBINO ZEFERINO                             9/11/2014

domingo, 2 de novembro de 2014

PODEMOS


          O novo movimento politico espanhol denominado PODEMOS ultrapassou nas sondagens os velhos PP e PSOE da democracia pós-franquista. Ou seja, se houvesse eleições agora em Espanha, teriamos uma revolução politica aqui mesmo ao lado. Mas afinal o que é o PODEMOS e o que representa? É um movimento civico (ou seja, não vinculado a uma ideologia definida) que atrai uma grande maioria de espanhois de todas as proveniencias. Representa o falhanço dos partidos tradicionais na condução dos destinos do país e constitui uma ameaça para a democracia representativa e institucional.
          E o que representa o PODEMOS para os portugueses? Atrever-me-ia a vaticinar que a eventual ascensão do PODEMOS ao poder em Espanha poderá ter as mesmas consequencias do que teve em 1936 a ascensão ao poder em Espanha da Frente Popular. Para quem não se lembre, foi a tomada do poder pela coligação dos socialistas e dos comunistas em Espanha que conduziu ao levantamento militar que iniciou a guerra civil (o chamado "movimiento"). Se porventura Salazar não tivesse estado no poder em Portugal nessa altura, teriamos fatalmente sido engolidos nas fauces sanguinárias daquela que foi a mais terrivel das guerras civis do século passado.
          Só não conhecendo a idiossincracia de "nuestros hermanos" se poderá dizer que uma alteração estrutural do panorama politico espanhol, como a que resultaria duma subida ao poder de um grupo que não se sabe o que quer nem o que procura, não iria conduzir a enfrentamentos violentos e profundos, entre esquerdas e direitas, entre autonomistas e nacionalistas, entre naturais e imigrados e entre ricos e poderosos e pobres e ressabiados. E como Passos e Portas não são Salazar e o Costa ainda menos, teriamos os enfrentamentos entrando-nos pela porta num "santiamen" (como eles dizem). Depois seria o salve-se quem puder pelas veredas acima.
          Por cá ainda não há PODEMOS, mas não será dificil deixar de pensar na manifestação expontânea (com beatas de charuto no chão e tudo) que se formou há tempos, por causa da TSU. Num "santiamen" tambem, a coisa poderá transformar-se num levantamento popular. Basta sentir o ódio reprimido como olhamos uns para os outros quando nos cruzamos nas ruas, ou a forma rouca e surda como as palavras de ordem saem da boca dos manifestantes, quando pacifica mas ruidosamente desfilam a caminho da Assembleia da Republica.
         O PODEMOS espanhol significa que as coisas não estão bem e que o povo (seja lá o que isso for) está disposto a mudar o status quo. PODEMOS significa que podem e quem quer pode, como diz o povo.

                                ALBINO ZEFERINO                                      2/11/2014

A INVEJA NACIONAL


          A inveja é um pecado ou defeito que dificilmente passa sem consequencias. O invejoso é aquele que sente despeito e frustração por não conseguir obter as vantagens ou os sucessos alheios. Fica furioso e desesperado por não conseguir suportar o sucesso de outrem. Sendo uma caracteristica comum à natureza humana (os animais não têm inveja), manifesta-se com mais evidência nos mais desfavorecidos intelectual e culturalmente e portanto nos mais incapazes. Infelizmente é tambem um defeito de carácter muito próprio dos portugueses. Não é por acaso que o grande Camões termina o seu genial épico com a palavra maldita, referindo-se aos seus compatriotas.
          Em vez de enaltecer aqueles que se distinguiram pelas suas acções e que, por isso, atingiram lugares e situações que os invejosos nunca conseguiriam atingir, os invejosos normalmente   desdenham e denigrem aqueles que deveriam festejar, procurando fazer ressaltar os seus defeitos e as suas deficiencias, que todos temos como seres humanos que somos. Tratando-se dum compatriota, ainda é pior, pois a comparação conosco é mais evidente, pois julgamos que seriamos capazes de fazer o que ele fez e da forma como o fez. Só que não é assim e por isso colocamo-nos aos olhos de quem nos vê e nos ouve como frustrados e incapazes de proceder como aqueles que desdenhamos.
          Vem isto a propósito da forma despudorada e soez como a generalidade dos portugueses se refere ao único compatriota que até hoje conseguiu atingir uma posição internacional do destaque que representou a presidência da Comissão da União Europeia protagonizada por José Manuel Durão Barroso. Nunca nenhum portugues, durante os cerca de 900 anos de existência de Portugal como país independente, conseguiu atingir tal posição de destaque mundial, nem nunca um portugues conseguiu ter a notoriedade mundial que Barroso protagonizou enquanto exerceu tal função. Na sua pequenez de espírito e mostrando uma inveja colectiva que o genial Camões bem retratou nos seus Lusíadas, os portugueses preferem destacar na personalidade de Barroso enquanto Presidente da Comissão, não o seu incansável labor de árbitro entre a ganância dos grandes e a angustia dos pequenos, mas antes ressaltando a tibieza da sua acção mediadora na defesa da manutenção duma unidade estratégica indispensável para evitar o desmembramento duma ideia esplêndida. Será que a Europa das Nações não ficou a dever a Barroso e à sua persistente acção mediadora a continuação do projecto europeu como forma de preservar a unidade do Velho continente?  Teria sido preferivel que Barroso tivesse tomado partido a favor de uns contra outros abrindo portas para o desmembramento duma Europa comunitária assente numa moeda comum e baseada em principios comuns de sã convivência? Seria melhor para Portugal que Barroso tivesse advogado uma divisão formal entre ricos e pobres que forçosamente conduziria à destruição da União europeia e à moeda comum? O que aconteceria a Portugal se regressasse ao escudo desvalorizável e abandonasse as politicas orçamentais e monetárias consagradas em Maastricht?
          Não conseguindo demover as perseverantes convicções europeias de Barroso, os invejosos lançaram-se na soez acusação de abandono do país que Barroso protagonizara quando aceitou o lugar de Presidente da Comissão, quando ainda era Primeiro Ministro de Portugal, num momento dificil para o país. Nada mais vil! Aproveitando uma oportunidade que nunca mais surgiria nos tempos mais próximos, Barroso viu que poderia continuar a ser útil a Portugal (como o foi) sem desdenhar uma situação que indubitavelmente prestigiou o seu país. E não se diga que não conseguiu prestigiar Portugal só porque agora (não podendo voltar a ser reeleito) não teve outro convite para prosseguir a sua carreira internacional. Que anterior Presidente da Comissão europeia saltou desse para outro lugar com o mesmo destaque? Nem Delors, nem qualquer outro.  Barroso fez o que qualquer outro portugues (e não só) teria feito nas mesmas circunstâncias. Só que mais nenhum portugues foi convidado para um lugar tão destacado como ele foi. A inveja nacional não permitiu que Barroso regressasse em ombros como mereceria.

                                    ALBINO ZEFERINO                                                   2/11/2014

sábado, 1 de novembro de 2014

REFORMAS À PRESSA


          Aproximando-se o fim deste ciclo politico iniciado com a troika, verifica-se que, por muito que o actual governo se tenha esforçado na implementação das necessárias reformas impostas pela troika, pouco se fez no concreto. A impossibilide de contar com o apoio dos socialistas para esse designio nacional (com receio de que o povo os confundisse com os malandros do governo que não cessavam de lhes exigir sacrificios incompreensiveis para a maioria deles), aliada à reacção à mudança, entranhada no espirito tacanho do povo portugues, marrano por natureza e ignorante por tradição, fez o resto. Em duas palavras se explica a situação: Afogados em dividas desde o 25 de Abril, os portugueses foram, pela primeira vez neste século, confrontados com um problema que nunca ninguem lhes dissera ser deles e só deles; era preciso tomar medidas drásticas para suster a espiral devedora em que o país tinha caido, sem sequer dar por isso. Essas medidas tinham como objectivo reformar o Estado no sentido de travar a sua furia gastadora que, com Sócrates ao leme, tinha tomado proporções gigantescas. Primeiro na saúde com o famigerado sistema nacional de saude - utopia maçónica que obrigava o Estado a garantir sem condições a assistência medico-medicamentosa e os apoios sociais conexos, a todo o bicho careta que o solicitasse.  Se o doutor ia ao médico de cada vez que a cabeça lhe doia, porque é que o Zé povinho não podia fazer o mesmo, agora que o constitucionalmente protegido SNS lho proporcionava?  O mesmo se diga com a Educação e com a demagogica legislação socialista, que alargara até aos 16 anos os estudos obrigatórios e gratuitos a toda a gandulagem que se arrastava drogada pelos cantos do país. Só que não bastou inscrever oficiosamente os meninos nas escolas. Foi preciso arranjar escolas onde essa maralha toda coubesse, encontrar professores que ensinassem aquilo que esses enrgumenos deveriam saber (e não programas antiquados ajustados apenas aos betinhos que antes frequentavam as escolas) e transportá-los e alimentá-los. Ora tudo isto custa balurdios. Tambem a segurança social começou a revelar-se uma fonte inesgotável de despesas com a atribuição descontrolada dos demagógicos apoios sociais por tudo e por nada, atribuidos sem vigilância nem critério, apenas bastando acenar com o braço ou levantar um pouco mais a voz para passar a receber sem trabalhar. Um regabofe! A atribuição sem qualquer critério cientifico de reformas antecipadas aos funcionários publicos (com o argumento de que assim se aliviava o orçamento do Estado, sem pensar que a Caixa geral de Aposentações tambem é suportada por dinheiros publicos) e a compra de fundos de pensões às entidades privadas, aumentando as responsabilidades futuras da segurança social do Estado, foram tambem causas determinantes para o estado depauperado em que se encontram hoje os recursos financeiros do país.
          Foi para tentar pôr cobro a esta situação de anarquia institucionalizada que a Constitução portuguesa protege, que a troika propôs ao governo um programa de restruturação do Estado ambicioso, para cuja execução seria necessária a colaboração patriótica do PS.  PSD e CDS apenas recolhem uma maioria simples dos votos dos deputados, sendo necessário o apoio dos deputados do PS para conseguir maiorias qualificadas que permitam a implementação de reformas de fundo, começando pela da própria Constituição politica da Nação. Mas com Seguro ao leme nada disto foi possivel e daí que as reformas essenciais e mais importantes ficaram por fazer. Seguro sonhava em substituir Passos na liderança do Governo e por mais evidente que a cooperação inter-partidária se impussse, o gajinho não desarmava com medo de perder votos que comprometessem o seu projecto pessoal. Tanto se pôs a geito que os próprios socialistas correram com ele. Agora há que esperar que Costa se alce e que Passos (ou outro qualquer que fique na liderança do partido) assuma o que o maricas do Seguro não quiz fazer. Porque sem acordo inter-partidário nada se pode fazer e Costa sabe-o. Só que por enquanto não o diz.
          Apercebendo-se da posição prudencial que Costa adoptou desde que passou a chefiar o PS, Passos começou agora um contra-relógio reformista (finalização das privatizações, alguma renegociação de PPP´s, lançamento de programas de desenvolvimento apoiados pelo novo QREN, recuperação do plano energético de Sócrates,etc.) na expectativa de ainda conseguir ficar bem na fotografia de familia que vai ser tirada depois das próximas eleições legislativas. Tambem por isso fez questão em assinalar que estas se irão realizar na data constitucionalmente prevista e não antes. A ver vamos!

                                    ALBINO ZEFERINO                                                1/11/2014