domingo, 2 de novembro de 2014

A INVEJA NACIONAL


          A inveja é um pecado ou defeito que dificilmente passa sem consequencias. O invejoso é aquele que sente despeito e frustração por não conseguir obter as vantagens ou os sucessos alheios. Fica furioso e desesperado por não conseguir suportar o sucesso de outrem. Sendo uma caracteristica comum à natureza humana (os animais não têm inveja), manifesta-se com mais evidência nos mais desfavorecidos intelectual e culturalmente e portanto nos mais incapazes. Infelizmente é tambem um defeito de carácter muito próprio dos portugueses. Não é por acaso que o grande Camões termina o seu genial épico com a palavra maldita, referindo-se aos seus compatriotas.
          Em vez de enaltecer aqueles que se distinguiram pelas suas acções e que, por isso, atingiram lugares e situações que os invejosos nunca conseguiriam atingir, os invejosos normalmente   desdenham e denigrem aqueles que deveriam festejar, procurando fazer ressaltar os seus defeitos e as suas deficiencias, que todos temos como seres humanos que somos. Tratando-se dum compatriota, ainda é pior, pois a comparação conosco é mais evidente, pois julgamos que seriamos capazes de fazer o que ele fez e da forma como o fez. Só que não é assim e por isso colocamo-nos aos olhos de quem nos vê e nos ouve como frustrados e incapazes de proceder como aqueles que desdenhamos.
          Vem isto a propósito da forma despudorada e soez como a generalidade dos portugueses se refere ao único compatriota que até hoje conseguiu atingir uma posição internacional do destaque que representou a presidência da Comissão da União Europeia protagonizada por José Manuel Durão Barroso. Nunca nenhum portugues, durante os cerca de 900 anos de existência de Portugal como país independente, conseguiu atingir tal posição de destaque mundial, nem nunca um portugues conseguiu ter a notoriedade mundial que Barroso protagonizou enquanto exerceu tal função. Na sua pequenez de espírito e mostrando uma inveja colectiva que o genial Camões bem retratou nos seus Lusíadas, os portugueses preferem destacar na personalidade de Barroso enquanto Presidente da Comissão, não o seu incansável labor de árbitro entre a ganância dos grandes e a angustia dos pequenos, mas antes ressaltando a tibieza da sua acção mediadora na defesa da manutenção duma unidade estratégica indispensável para evitar o desmembramento duma ideia esplêndida. Será que a Europa das Nações não ficou a dever a Barroso e à sua persistente acção mediadora a continuação do projecto europeu como forma de preservar a unidade do Velho continente?  Teria sido preferivel que Barroso tivesse tomado partido a favor de uns contra outros abrindo portas para o desmembramento duma Europa comunitária assente numa moeda comum e baseada em principios comuns de sã convivência? Seria melhor para Portugal que Barroso tivesse advogado uma divisão formal entre ricos e pobres que forçosamente conduziria à destruição da União europeia e à moeda comum? O que aconteceria a Portugal se regressasse ao escudo desvalorizável e abandonasse as politicas orçamentais e monetárias consagradas em Maastricht?
          Não conseguindo demover as perseverantes convicções europeias de Barroso, os invejosos lançaram-se na soez acusação de abandono do país que Barroso protagonizara quando aceitou o lugar de Presidente da Comissão, quando ainda era Primeiro Ministro de Portugal, num momento dificil para o país. Nada mais vil! Aproveitando uma oportunidade que nunca mais surgiria nos tempos mais próximos, Barroso viu que poderia continuar a ser útil a Portugal (como o foi) sem desdenhar uma situação que indubitavelmente prestigiou o seu país. E não se diga que não conseguiu prestigiar Portugal só porque agora (não podendo voltar a ser reeleito) não teve outro convite para prosseguir a sua carreira internacional. Que anterior Presidente da Comissão europeia saltou desse para outro lugar com o mesmo destaque? Nem Delors, nem qualquer outro.  Barroso fez o que qualquer outro portugues (e não só) teria feito nas mesmas circunstâncias. Só que mais nenhum portugues foi convidado para um lugar tão destacado como ele foi. A inveja nacional não permitiu que Barroso regressasse em ombros como mereceria.

                                    ALBINO ZEFERINO                                                   2/11/2014

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