segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

A DEMOCRACIA EM CRISE


          A reviravolta que as perspectivas duma vitória fácil do moderadissimo François Fillon nas próximas presidenciais francesas levaram, mostra à saciedade que a politica partidária está em crise em todo o lado. Efectivamente, a subida vertiginosa e persistente do independente Macron nas ultimas sondagens de opinião, em França, parece demonstrar que os eleitores cada vez mais manifestam as suas preferencias pelos candidatos independentes dos sistemas politicos caracteristicos das democracias ocidentais.
          A surpreendente eleição de Trump nos EUA e o nascimento de numerosos movimentos politicos a nivel nacional fora do sistema (Podemos e Ciudadanos em Espanha, Beppe Grillo e a Força Itália, em Itália, Le Pen, em França, o aparecimento de movimentos de direita, na Hungria, na Polónia, na Alemanha e na Grécia, o crescimento de partidos que antes eram residuais, na Áustria e na Holanda, etc.etc.) com possibilidades de ganhar eleições (ou até já no poder) é sinal de que a alternancia democrática dos chamados partidos do arco governativo está em crise.
          Tambem entre nós, a actual experiencia da geringonça não é mais do que uma tentativa politicamente inteligente de suster essa corrente anti-sistema que grassa por toda a Europa (e tambem pelos EUA, mas aqui de outra forma). Enquanto que na Europa são os próprios partidos que estão em causa, na América são os partidos tradicionais que são conquistados por dentro por esses movimentos mais inconformados com o sistema (Tea party, Alt Right, etc.).
          A democracia como a conhecemos está em crise, arrastando consigo os elementos que a compõem e os pressupostos onde assenta. Prova disso é a crise existencial que o Brexit provocou na UE e a indefinição que a governação de Trump está a causar na América. Os eleitores cada vez menos acreditam na democracia como redentora dos costumes e da forma soez como os países ocidentais têm sido ultimamente governados. Os inumeros e crescentes sinais de corrupção nos principios e na forma de conduzir os destinos nacionais levaram os governados a descrerem do sistema e conduzem a reacções extremas consubstanciadas no surgimento destes movimentos ou destas individualidades, que se reclamam duma independencia não tanto ideológica mais mais do próprio sistema politico vigente. Não recusam a forma democrática de eleição (pelo contrário, até a levam aos extremos com a exigencia sistemática de referendos por tudo e por nada) mas sim a sua forma laxista e subrepticia do exercicio do poder.  A democracia não está a ser usada a favor do povo mas sim contra ele, afirmam. Uns, pensam que será regionalizando os processos de decisão politica que resolvem a crise; outros, pelo contrário, desejam que as grandes decisões esturturantes sejam comunitarizadas, a fim de poderem diluir as responsabilidades das suas más e descuidadas gestões publicas.
          A democracia nascida na Grécia antiga e retomada pelos ingleses na Magna Carta já não existe. A Revolução francesa e depois as sucessivas revoluções industriais deram cabo dela. A democracia hoje é um conceito que pode ser representado de diversas formas. Com o advento das democracias populares do pós-guerra e das novas independencias saidas das colonizações, foi o conceito muito desvirtuado de forma a significar mais ou menos aquilo que o poder instalado quisesse. Os plebiscitos, as eleições marteladas, as várias democracias (ocidentais ou alternantes, populares ou ditatoriais, orgânicas ou corporativas, directas ou referendárias, etc.etc.) são formas sinuosas do exercicio do poder autoritário e tendencialmente permanente. O poder instalado evita as eleições e quanto mais tempo dura, melhor se mexe nos complicados labirintos da governação, enriquecendo-se a si e aqueles que lhes permitiram enriquecer-se a si próprios. Quando os ingleses votaram o Brexit foi para combater a burocracite comunitária que, junto com a sua própria, se estava a tornar insuportável para eles. Será que outros pensarão o mesmo? Não creio que sem uma profunda reforma das instituições comunitarias, que aproxime os decisores do seu eleitorado, a União europeia prospere e subsista como bloco continental coeso e forte. E sem isso, acabará o euro e a fonte de soberania que a moeda unica representa para países fracos e pobres como o nosso. Será este o desafio deste principio de século atribulado e cheio de incógnitas.


                     ALBINO  ZEFERINO                                                    6/2/2017

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