quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

BALANÇO GOVERNATIVO

Nesta época natalícia quase a terminar mais um ano 
é costume fazerem-se balanços. Nas empresas, nas vidas, nas familias, 
nos propósitos de cada um e até na acção dos governos. Antigamente não 
era costume escrutinar a acção dos governos de tão perto e tão 
esmiuçadamente como agora. Hoje critica-se diariamente a acção dos 
ministros por dá cá aquela palha com a cobertura despudorada e 
superficial da imprensa (eles preferem chamar-lhe "em directo") sem 
cuidados analiticos ou comparados que possam dar aos destinatários das 
noticias uma ideia generica e global da acção governativa. Irei hoje, 
à laia de balanço anual, tentar fazer uma comparação desapaixonada 
entre o país que os socialistas nos deixaram e aquele que hoje existe. 
Começando por uma área onde só os obstinados não 
reconhecem as melhorias, é óbvio que a saúde em Portugal melhorou 
muito. Do exercicio incontrolado do sistema nacional de saúde, onde o 
acesso generalizado aos cuidados de saude era proporcionado 
automaticamente sem qualquer triagem clinica ou preocupação 
terapeutica, arrastando despesas incontroláveis para o erário publico 
e para a subsistencia do próprio SNS, passou-se para uma situação 
onde, sem pôr em causa as virtualidades do sistema, existe um controle 
adequado nas prestações de cuidados de saúde a todos os níveis 
(urgencias, consultas externas, tratamentos ambulatórios,exames 
clinicos, horários das consultas, listas de espera, organização dos 
centros de saúde,fiscalização do fornecimento medicamentoso, 
reorganização da gestão hospitalar, renegociação das parcerias 
publico-privadas na saúde, controle na actividade médica, etc.etc.) 
que se reflectiram em poupanças substanciais no sector e que 
permitiram a subsistencia do próprio sistema, sem perda de qualidade 
para os utentes, nem diminuição do seu carácter universal. 
Na educação (outro dos sectores mais gastadores 
do Estado) se verificaram melhorias substanciais. Foi resolvida a 
questão da colocação e da avaliação dos professores que tanta celeuma 
provocou durante o governo anterior. Nunca mais se ouviu falar da 
FENPROF e do seu Mário Nogueira, nem das greves barulhentas na 5 de 
outubro, nem das greves nas escolas. O sistema de ensino foi 
reestruturado, acabou-se com o escandalo do "parque escolar" e com a 
espúria fundação do computador Magalhães, a rede escolar foi 
redimensionada, a autonomia universitária foi regulamentada (o 
escandalo das faculdades- fundação foi eliminado) e nasceu um sistema 
de colaboração permanente entre a investigação universitária e as 
empresas. Muito mais ainda poderá ser feito neste dominio, mas o certo 
é que o ministro vai por bom caminho. 
Na segurança social enfrentou-se pela primeira 
vez sem subterfugios ou tergiversações o verdadeiro problema deste 
importante sector, que consiste na sustentação financeira do próprio 
sistema. Enquanto que antes (do tempo da luminária com cara de gorila 
mal disposto do Ferro Rodrigues) as preocupações se reduziam ao 
alastramento da concessão do subsidio de reinserção social (qual 
mancha de óleo), concedido sem critério a qualquer amigo ou amigo de 
amigo que se comprometesse a votar no PS, sem curar da cobertura 
orçamental dessa despesa deliberadamente incontrolada (o recurso aos 
empréstimos externos era a solução milagrosa para todas as loucuras 
socialistas), o actual governo procura encontrar uma solução estável 
para o magno problema do aumento da despesa com as prestações sociais 
(que cresceram ao ritmo da taxa de desemprego) sem comprometer a 
concessão das mesmas aos que delas efectivamente necessitam. 
Na área das instituições próprias da soberania, a 
segurança publica melhorou substancialmente, a defesa está em fase de 
reestruturação (em função do novo conceito de defesa nacional), os 
negócios estrangeiros estão adaptando-se aos novos mercados e à 
mudança de paradigmas internacionais e apenas a Assembleia da 
Republica não conseguiu ainda reestruturar-se (tanto no numero 
excessivo de deputados que exibe, como na sua composição organizativa 
excessivamente cara, vg. restaurante, ajudas de custo, subsidios de 
deslocação generalizados, meios de transporte proporcionados pelo 
Estado, excesso de pessoal de apoio aos gabinetes parlamentares, 
outsourcing despesista, etc. etc.). Do mesmo modo, este governo ainda 
não conseguiu reduzir substancialmente as despesas com as autarquias 
locais. Enredado em preocupações eleitoralistas, o governo ainda não 
tomou firme a determinação inevitável de reestruturar a organização 
administrativa do país no sentido de uma racionalização (leia-se 
redução do numero) das autarquias locais e das suas competencias. 
Tambem a presidencia da Republica exibe demasiadas despesas para as 
competencias que detém. A subsidiarização parcial e pontual dos 
assessores presidenciais nos momentos em que o presidente deles 
necessitasse e a redução das mordomias presidenciais (criados, 
seguranças, motoristas, residencias, assessores e consultores a tempo 
inteiro, secretárias, jardineiros, casa civil e militar, etc. etc.) 
seriam medidas apropriadas à situação de penuria em que o país se 
encontra. 
No campo da justiça (verdadeiro barómetro do grau 
de desenvolvimento cívico de um povo) a coisa ainda não está tratada, 
apesar das promessas da esforçada ministra que se desdobra em 
declarações de intenção, mas que na realidade ainda nada de 
substancial conseguiu mudar. As resistencias às mudanças 
progressivamente anunciadas pela ministra (mas sempre adiadas), 
protagonizadas pelas poderosas organizações sindicais de juizes e de 
procuradores, que não querem prescindir das regalias de que gozam, 
desde que se convenceram de que cada um deles individualmente 
representa um dos poderes do Estado (sem perceberem que a abstracção 
do conceito apenas pretende consagrar que o poder judicial é 
independente dos outros poderes do Estado), não têm permitido 
erradicar as pérfidas epidemias da corrupção, do abuso de poder, da 
discriminação entre arguidos, da violação do segredo de justiça, da 
deficiente organização jurisdicional do país, enfim, da justiça em 
geral, enleada em teias de interesses tecidas pelos partidos politicos 
nestes anos de democracia mal enjorcada. Aqui o balanço é claramente 
negativo, mais pelo compadrio com as forças obstaculizadoras, do que 
pelas intenções da esforçada ministra que é sabedora, esforçada e 
tenaz. Mas não o suficiente. 
No sector económico do Estado tambem pouco tem sido 
feito. A deficiente organização governativa do sector, com vários 
ministros a mexerem no mesmo saco (ainda por cima de partidos e 
orientações politicas diferentes dentro do governo), que despejam 
sobre os sobrecarregados secretários de Estado matérias da maior 
sensibilidade politica (como as privatizações, por exemplo) não tem 
ajudado nada à necessária reestruturação do país. A eliminação de 
institutos publicos inuteis, bem como a privatização ou eliminação de 
empresas publicas deficitárias (como as dos transportes, da 
radiodifusão, da banca do Estado e outras) não tem obedecido a 
qualquer estratégia, mais parecendo constituir cada uma delas uma 
novela televisiva com actores variados, desde o tradicional vilão ao 
heroi que fica com a gaja boa no final. A recente incursão do ministro 
da Economia na área reservada do das Finanças a propósito da proposta 
de redução drástica do IRC (como quem descobre a pólvora em plena 
batalha) é boa prova do que afirmo, sobretudo depois do fiasco da 
tentativa desajeitada de alterar a TSU. 
Finalmente, nas Finanças a obra do ministro Gaspar 
tem sido notável. Fazer baixar em escassos 2 anos o nível de 
endividamento portugues, que há decadas não parava de subir, é obra. 
Como tambem tem sido obra a renegociação permanente com a troika das 
condições impostas pelos nossos credores no sentido de aligeirar o 
esforço de adaptação do país às novas condições de sobrevivencia. 
Pouco se tem falado deste trabalho permanente e exaustivo que a equipa 
de Gaspar (onde se destaca o secretário de Estado Moedas) tem feito em 
favor da recuperação do país. Não tem sido porem tão bem sucedido o 
resultado do trabalho no esforço para o abaixamento do defice. A 
dificuldade sentida no corte dos gastos pelo lado da despesa publica 
tem vindo a sobrecarregar desnecessariamente a factura fiscal dos 
cidadãos, o que traz consigo efeitos negativos na imagem do governo. A 
negociação permanente com o parceiro da coligação sobre as estratégias 
a seguir no que se refere aos cortes pelo lado da despesa não tem 
permitido a fluidez desejada na adaptação do défice orçamental às 
regras comunitárias. Mesmo assim, o défice baixou mais de 3 pontos 
percentuais em 2 anos e as projecções apontam para que se atinjam os 
valores calculados para o final da legislatura. Tambem a reconversão 
do funcionalismo publico, não só no seu redimensionamento, mas 
sobretudo na requalificação dos seus elementos, tem sofrido alguns 
atrasos causados maioritariamente pelos sindicatos do sector, que 
mostram pouca sensibilidade na abordagem global da situação. 
Last but not least, o primeiro-ministro tem 
demonstrado uma determinação a toda a prova. Num país de governação 
muito dificil, Passos Coelho tem demonstrado uma maturidade inesperada 
num homem tão jovem e politicamente inexperiente como ele era. 
Conseguiu entrar na intimidade e nas boas graças da chefe da Europa 
onde estamos inseridos e de quem dependemos cada vez mais. Delineou e 
executou uma estratégia de alianças intercontinentais notável. A sua 
aproximação à China e a Angola já está a produzir frutos e quem sabe 
se a longo prazo não nos confira um papel de distribuidor de jogo para 
o que sempre fomos dotados. O povo portugues é desconfiado e não gosta 
de mudanças rápidas. Salazar compreendeu isso muito bem e depressa. 
Talvez por isso tenha ficado 48 anos no poder. Passos Coelho não 
ambicionará certamente a tanto. Mas o que ambiciona é deixar Portugal 
mais direito e escorreito do que quando o recebeu. E por este andar 
acredito que o faça. Feliz Ano Novo! 

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