Portugal não tem uma grande tradição sindicalista.
A ausencia de importantes unidades industriais com massas gigantescas
de operariado que estiveram na origem do sindicalismo no sec. XIX na
maioria dos países industrializados foi sempre uma caracteristica
portuguesa no principio desse movimento. O sindicalismo nasceu como
arma de defesa colectiva dos trabalhadores contra os excessos
capitalistas do sec.XIX. Organizando o operariado como uma força de
trabalho colectiva que se opunha ao capital, os sindicatos tiveram um
papel importante na definição de regras justas na relação do trabalho
nas sociedades industriais. Portugal era nessa altura um país
essencialmente agrícola e o trabalho nesse sector sempre se regeu mais
em função das colheitas e do tempo. Só mais tarde com a organização da
agricultura surgiram os primeiros sindicatos no sector, mas nunca com
a importancia e a força que detinham os sindicatos dos sectores
industriais.
A industrialização em Portugal surgiu com Salazar
só nos anos 40 sob o regime corporativo, que organizou o trabalho em
função de sectores de actividade retirando aos sindicatos livres
qualquer capacidade reivindicativa. Foi assim só depois do 25 de abril
que nasceu em Portugal o movimento sindical que hoje conhecemos, que
utiliza as greves como arma de defesa dos interesses dos trabalhadores
e de participação activa na politica. É por isso que as duas centrais
sindicais existentes em Portugal estão intimamente ligadas (eu diria
mesmo dependentes) aos partidos politicos de base operária que as
apoiam. Foi através do movimento sindical que muitas das chamadas
"conquistas da revolução" se concretizaram, aproveitando a confusão
social que se seguiu à revolução, com a colaboração politica dos
sucessivos governos na sua maioria de esquerda. Só a partir da adesão
de Portugal à então Comunidade europeia em 1986 é que os sindicatos
começaram a agir efectivamente como organizações laborais por força da
sua inclusão nas organizações sindicais comunitárias. A UGT nasceu
nessa altura contra a vontade da CGTP que assim viu a sua hegemonia
comprometida, mantendo-se contudo como a mais importante força
sindical portuguesa. Foi através da CGTP que surgiram as primeiras
convenções colectivas de trabalho que fixaram as regras laborais em
Portugal e que ainda hoje detém uma capacidade de mobilização capaz de
paralizar sectores inteiros da economia nacional.
Num momento de viragem do panorama economico-social
em Portugal (alguns chamam-lhe "refundação") é natural que as
organizações sindicais (sobretudo a CGTP) se mostrem desesperadas ao
verem comprometido todo o esforço feito no sentido de controlar o
mundo laboral, com a eliminação progressiva dos beneficios (alguns
espurios e até imorais) que as centrais sindicais conseguiram obter
para os seus associados. Em íntima articulação com o partido comunista
(que orienta a CGTP apesar da sua escassa representação parlamentar) a
CGTP tem reagido, organizando greves e manifestações de rua sem
cessar, na tentativa de manter vivo no espírito dos portugueses a
capacidade reivindicativa do povo, sempre pronto a reagir a medidas
que lhe são objectivamente dolorosas.
Por muito que o governo deseje manter a legalidade
constitucional vigente há quase 40 anos (seria agora o momento
adequado para se fazer uma revisão constitucional que facilitasse a
necessária recuperação social e económica do país) não me parece
aceitável que se permita que um escasso numero de trabalhadores
privilegiados comprometa a acção regeneradora do governo no seu
esforço de sanear sectores produtivos essenciais para a retoma
económica de Portugal. Refiro-me concretamente aos escassos trezentos
e tal estivadores do porto de Lisboa que declararam greve ilimitada ao
trabalho (cumprem os serviços minimos indispensáveis para evitar a
requisição civil) alegando não prescindir dos acréscimos salariais de
que gozam há anos, comprometendo o enorme esforço realizado por
milhares de outros trabalhadores que conseguiram pela primeira vez
desde há dezenas de anos fazer aumentar as exportações portuguesas. Do
mesmo modo se pode argumentar relativamente aos cerca de oitocentos
trabalhadores dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo que, com a sua
atitude reivindicativa, impedem o saneamento duma empresa falida, que
custa milhões de euros ao erário publico. Neste contexto incluo ainda
os trabalhadores dos caminhos de ferro portugueses que igualmente
gozam de salários inflacionados e não prescindem desse privilégio, tal
como o estão fazendo a maioria dos portugueses que aceitaram
patrioticamente colaborar na regeneração financeira do país,
organizando greves sucessivas de cada vez que sentem perigo na
estabilidade dos seus chorudos ordenados . Estas e outras atitudes por
parte de cidadãos portugueses que concordam com abaixamentos salariais
para os outros mas que não estão dispostos a abdicar da totalidade dos
seus, devem ser denunciadas e combatidas, sejam simples trabalhadores
manuais, sejam técnicos altamente qualificados, sejam gestores de topo
ou titulares de orgãos de soberania. A propósito, porque razão são os
deputados poupados aos cortes salariais? Não virá o dinheiro para eles
todo do mesmo sitio?
ALBINO ZEFERINO
30/11/2012
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