segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

COMO SERÁ O MEU FUTURO?

A primeira parte da minha vida, correspondente à 
minha infancia e á minha adolescencia, passou-se relativamente bem e 
portanto bastante depressa.  Vivia-se nessa altura em Portugal em 
pleno salazarismo e fazendo eu parte de uma familia acomodada, nunca 
senti verdadeiramente o peso do Estado na minha vida.  Os meus pais 
educaram-me bem, como era suposto ser educado naquela época um 
rapazinho da classe média, frequentando colégios particulares e 
cumprindo os programas de ensino iguais para toda a gente.  Em casa 
não se falava de politica (isso era deixado para os cerebros que da 
politica se ocupavam) e as vicissitudes sociais passavam-me ao lado, 
como de todos os que me rodeavam, familia, colegas, vizinhos, amigos, 
conhecidos e parentes.  Depois de um secundário mediano mas sem faltas 
fui para a faculdade, onde pela primeira vez deparei com questões 
sociais e politicas (estava-se nos anos 60) que observei de longe, mas 
sem nunca me envolver.  A contestação juvenil à guerra colonial, o 
maio de 68 em França, o caso Delgado, a revolta de Beja, as greves 
universitárias, em suma, a generalização da reacção a um regime que 
atingia o seu fim, não se me afigurou tão evidente como agora 50 anos 
depois surge na nossa história.  Só com a morte de Salazar se tornou 
mais óbvia a aproximação do fim do regime e a incógnita sobre o que se 
iria passar a seguir.  Estavamos habituados a tomar conta de nós 
próprios e a olhar para o estrangeiro como um estranho a quem se 
agradava ou desagradava consoante os nossos próprios interesses.  Não 
havia que formular estratégias para o relacionamento externo.  Tudo 
era mais simples e mais óbvio.  Apesar de defrontarmos uma guerra sem 
solução em tres frentes e 40% do orçamento do Estado estar hipotecado 
a esse esforço, pouco se notava nas ruas e na vida do dia a dia. 
Porém só poucas pessoas tinham direito a tudo e à maioria cada vez 
faltava mais.  Até que chegou o 25 de abril e a mudança radical da 
sociedade portuguesa.  Nessa altura eu, já formado, cumpria serviço 
militar obrigatório ao qual não me eximi, nem fugindo para o 
estrangeiro, nem fingindo mazelas que felizmente não tinha. Tinha 
casado com a minha namorada de sempre e a nossa mais velha tinha 
acabado de nascer.  Com o fim do serviço militar, casado, com 
responsabilidades familiares, mas sem emprego (naquela época um tipo 
mediano como eu não tinha qualquer problema em encontrar ocupação 
desde que tivesse um curso) resolvi concorrer á carreira diplomática e 
entrei.  Tinha iniciado a segunda parte da minha vida. 
                    Com a minha entrada no mercado de trabalho e as 
responsabilidades familiares entretanto criadas, coincidiu a vivência 
sistemática no estrangeiro inerente à profissão que escolhera. Sem 
experiencia familiar no sector e ao sabor das vicissitudes politicas, 
sociais e económicas que decorriam em Portugal, consequência da 
profunda alteração de hábitos,costumes e valores, que o 25 de abril 
nos trouxe, fui aprendendo um pouco à minha custa a adaptar-me a uma 
nova vida, com exigencias e tarefas desconhecidas para mim, que nos 
toma completamente o tempo, o espirito e o modo de viver. Passaram 
assim 37 anos a correr. Aprendi assim que não convém dizer sempre 
tudo, que nem tudo o que luz é ouro, que os melhores nem sempre 
vencem, que nem sempre o que parece é e que a vida tem mais de dubio 
do que de certo. Ao mesmo tempo ganhava bem, estava protegido 
profissionalmente, tinha apoio social garantido e sentia-me como 
fazendo parte de um club de elite numa sociedade que se desconjuntava. 
A coisa acabava por compensar.  Alem disso, à medida que ia mudando de 
actividade (em média cada 2/3 anos) sentia que me ia tornando cada vez 
mais objectivo, sobretudo depois de passar alguns anos a viver no 
estrangeiro.  As coisas e sobretudo os acontecimentos que observava 
começavam a significar para mim mais do que simples circunstancias do 
momento e mais como fazendo parte de um todo mais geral, que encaixava 
na evolução geoestratégica regional e mundial da sociedade em que 
vivemos.  Foi desta maneira que consegui, sem esforço, situar a 
evolução social portuguesa desde o 25 de abril (e até antes) no seu 
contexto politico e económico.  É assim que percebo a integração 
europeia e a defendo como unica via para a solução dos problemas 
portugueses.  Agora já reformado, com meus filhos casados e com uma 
neta, permito-me a mim próprio exprimir aquilo que verdadeiramente 
sinto como animal pensante. 
                     Coincidindo com o que chamo a terceira parte da 
minha vida (velho à espera da morte) surgiu uma verdadeira hecatombe 
que se traduz na situação de descalabro económico em que Portugal se 
encontra.  Não tendo vivido sistematicamente em Portugal  durante os 
ultimos 35 anos, esperava que agora, passado tanto tempo e depois dos 
portugueses terem partilhado longamente as experiencias e o modo de 
vida europeu, eu pudesse tranquilamente fixar-me na terra onde nasci 
sem as preocupações próprias de um refugiado, disfrutando duma pensão 
de reforma suficiente para manter uma vida digna como a que levei até 
aqui, representando com orgulho o meu país no estrangeiro. Mas o que 
verifico é que os portugueses nada aprenderam do convivio com gentes 
mais evoluidas, estão cada vez mais saloios e ignorantes, mais 
aldrabões e vigaristas, com menos escrupulos e mais pouca-vergonha, 
mais perguiçosos e velhacos, enfim, merecedores de todas as vilanias 
que lhes façam e dignos do país que destruiram leviana e 
inconscientemente. Deus tenha piedade de nós. 

                         ALBINO ZEFERINO         28/1/2012 

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