Agora que tanto se fala de estratégia nacional,
resolvi tecer algumas considerações sobre a carreira diplomática -
orgão que dela depende como seu instrumento privilegiado -
constituido por individualidades especialmente treinadas e habilitadas
para o efeito. Não sendo um especialista do métier (como
correspondente diplomático fui apenas um elemento adjuvante, embora
atento, dessa excelsa organização de crânios que constitui o chamado
corpo diplomático portugues).
Muito exigente na admissão formal, a carreira
diplomática portuguesa é hoje considerada um corpo do Estado
especialmente vocacionado para lidar com estrangeiros junto de quem
representa o Estado portugues na sua mais lata expressão soberana.
Pressupõe além de um especial conhecimento de qual seja a estratégia
nacional em cada momento, a carreira diplomática exige ainda vastos
conhecimentos sobre politica nacional e internacional por parte dos
seus membros e uma compostura pessoal irrepreensivel que permita o
desenvolvimento construtivo das relações com os demais agentes
nacionais e estrangeiros. Os chamados diplomatas são (ou devem sê-lo)
a lídima expressão da soberania do Estado em terras estrangeiras,
traduzindo com o seu saber e a sua postura cívica o país que
oficialmente representam em permanencia. Para isso deverão sempre agir
de forma irrepreensivel e cordata, com competencia e compostura cívica
em todas as ocasiões. Nem sempre porem se verificam infelizmente estas
caracteristicas em todos os seus membros e em todas os momentos das
suas vidas. Fazem parte do anedotário nacional muitas gaffes e
situações ridiculas protagonizadas por diplomatas (alguns nem isso são
embora se façam passar por sê-lo) que diminuem aos olhos de quem as
observa o país que representam (ou que supostamente deveriam
representar). Por este motivo, os governos escolhem por vezes
personalidades de fora da carreira para representarem o país que, aos
seus olhos, melhor cumprem do que os chamados diplomatas de carreira
os designios para os quais foram chamados.
Durante o período da monarquia, os diplomatas eram
pura e simplesmente recrutados maioritariamente de entre a nobreza,
pois se pensava que os nobres mais ilustrados eram mais capazes de bem
representar o país do que membros da burguesia ou do povo. Com o
advento da republica, os diplomatas passaram a ser recrutados de entre
o pessoal politico republicano e tambem junto dos meios intelectuais.
Com Salazar começaram a aparecer os amigos politicos incondicionais na
carreira diplomatica, o que deu origem à criação de uma mentalidade
salazarista no seio da própria carreira. O 25 de abril abriu os
horizontes dos novos diplomatas de então, permitindo a entrada na
carreira de jovens turcos revolucionários que introduziram na carreira
diplomática a noção de politização da função diplomática. Hoje em dia,
as escolhas dos diplomatas e as funções para as quais são nomeados
dependem mais dos seus compromissos politicos do que da sua natural
aptidão para a função para a qual são nomeados.
Chegados a este ponto, perguntar-se-á se a
existencia de uma carreira diplomática sujeita a condicionalismos de
ordem intelectual e exigindo uma dedicação exclusiva pessoal e
familiar se justificará, perante uma clara diminuição do papel
soberano do Estado e a um consequente e descarado aproveitamento
politico da função. Não seria preferivel começar desde já a preparar
os nossos diplomatas para o exercicio da função diplomática a nível
europeu, tentando a atribuição de uma quota para portugueses para
fazerem parte do Serviço Exterior Europeu com sede em Bruxelas e
representações em todos os países terceiros? Ou a nomeação politica
dos embaixadores da Europa continuará a prevalecer com prejuizo de
uma inteira geração de diplomatas portugueses que, por este andar,
qualquer dia lutarão entre si por um lugar de secretário na
Guiné-Bissau ou de conselheiro nas Comores?
ALBINO ZEFERINO 22/10/2012
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