segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

SALAZAR - SANTO OU DEMÓNIO?

Em momentos de crise como aquele que estamos atravessando, os portugueses têm tendencia para apelar ao sobrenatural para os vir salvar das desgraças onde cairam. Não se preocupam tanto em procurar as razões dessa queda mas mais em encontrar os responsáveis por ela. Chegando à conclusão que os verdadeiros responsáveis da crise são eles próprios, os portugueses em lugar de procurarem emendar-se para não voltarem a cair em desgraças, começam a apelar aos dons sebastiões da sua imaginação para que os safem dos sarilhos em que eles próprios se meteram. É nestes momentos que surgem do imaginário portugues aquelas figuras que com todos os defeitos próprios do ser humano foram elevadas aos altares por feitos anteriores, desde Afonso Henriques, à Rainha Santa e ao Santo Condestävel, passando por Camoes e Vasco da Gama e acabando em Salazar e Otelo.
     Nos tempos que correm e passados mais de 40 anos da morte do ditador, Salazar surge no imaginärio portugues como o impoluto e decidido salvador da Pätria afogada em dïvidas e quase exangue, capaz de devolver aos pobres portugueses as glörias do passado e ressuscitar os famigerados fundos comunitärios que  eles alegre e inconscientemente delapidaram durante anos a fio. Nao ë por acaso que nascem  quase semanalmente nas livrarias portuguesas obras (umas melhor que outras) dedicadas a Salazar exaltando a sua personalidade e determinacao na defesa do interesse nacional e no bem estar dos portugueses. Mas terä sido realmente assim?
     Segundo a excelente biografia de Salazar escrita por F. Ribeiro de Menezes (publicada pela D. Quixote em 2009) o salazarismo permitiu criar as condicoes necessarias ä sobrevivencia de Portugal e do seu imperio permitindo-lhe desenvolver em paz e de forma ordeira os seus recursos materiais e humanos ao mesmo tempo que se mantinham intactos o seu caracter nacional e a sua dimensao espiritual. Esta definicao daquilo que se podera prosaicamente conceptualizar como tendo sido o pensamento estrategico de Salazar ë contudo dissecada pelo historiador Fernando Rosas, que diz (ver obra citada): O salazarismo surge-nos como um compromisso entre as diversas correntes politicas da direita e os varios sectores de interesses das forcas vivas a partir duma base comum de rejeição do liberalismo herdado da 1ª Republica e da apologia de um Estado politica, economica e socialmente forte e interventor...a gestão arbitral dos equilibrios viabilizadores do regime tornar-se.á na ultima racio das escolhas salazaristas no campo da politica ou da economia.
     Como se vê o propalado altruismo salazarista na sua gestão do país não terá sido entendido por toda a gente da mesma maneira. Obrigar os prevaricadores a cumprirem as suas obrigações é mais fácil em ditadura do que em democracia. Mas não se confunda defesa de interesses particulares ou sectoriais com defesa do interesse geral, nem ditadura com democracia. Salazar viveu num tempo diferente, moveu-se num ambiente diferente e usou metodos diferentes. As motivações é que parecem ser as mesmas das de hoje. Salazar sempre mostrou relutancia em deixar o poder. De acordo ainda com F. Ribeiro de Menezes (ver ob cit)...abandonar o poder enquanto ainda era capaz de agir e decidir equivaleria a admitir que poderia ter estado errado no passado e que outros poderiam desempenhar melhor o cargo. Isso ele não quis nunca admitir.
     Faz-nos lembrar alguem do presente?
 
ALBINO ZEFERINO      LISBOA, 10/ 1/ 2011

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