segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

A PRIVATIZAÇÃO DA TAP


         Muito se tem dito e escrito acerca da privatização anunciada da TAP. A TAP está para ser privatizada há décadas e só ainda não foi porque não há quem a compre em condições de satisfazer as fantasias que comunoides e quejandos andam a meter na cabeça oca dos lusos de que a TAP ainda serve para alguma coisa. A TAP é mais ou menos como uma máquina de escrever na época dos computadores. Afeiçoamo-nos a ela e custa-nos desfazermo-nos dela.
          A falácia de que sem a TAP os ilhéus deixariam de poder deslocar-se ao continente ou que os emigras ficariam para sempre nos seus países de acolhimento cortando de vez os laços com o velho Portugal dos seus avós é apenas o pretexto que os sindicatos da TAP (controlados maioritariamente pelos comunas da Intersindical) inventaram para convencer o Zé povinho de que Portugal desapareceria com a venda da TAP a privados. Desde quando é que o meio de transporte determina a viagem? Quando muito condiciona-a, como a rede viária condiciona os acessos ou a existência de saneamento básico condiciona a fixação das populações. Terá a Lufthansa decretado alguma vez greve porque os habitantes de Heidelberg, por exemplo, se têm que deslocar até Frankfurt para apanhar o avião para Lisboa, ou para Joanesburgo ou Havana? E a BA alguma vez entrou em greve porque os passageiros provenientes de Calcutá ou de Bombaim com destino a Londres têm que se deslocar quase 100 Kms à chegada à Grã-Bretanha desde o aeroporto de Luton até ao centro de Londres? E os moradores de Reims em França não têm que fazer outros tantos Kms de autoestrada ou de TGV para apanhar o avião da TAP em Paris que os leve até ao Porto? Deixemo-nos de falácias e enfrentemos os problemas como eles se nos apresentam. Com realismo e profundidade. A razão pela qual os sindicatos não querem a privatização da TAP é porque assim perderão todas as regalias laborais de que disfrutam (salários altos, compensações monetárias, regimes mais favorecidos de férias e de apoios sociais, creches e viagens à borla pra si e para os seus familiares, folgas escandalosas entre voos, etc. etc.) e que um eventual novo proprietário privado não aceitará.
          Por outro lado, a TAP hoje não vale nada. Não tem aviões próprios (são todos em leasing) não tem manutenção própria (vendeu a que tinha aos brasileiros que deram cabo dela) não tem instalações próprias (são todas da ANA que é francesa), em suma, não tem activos. Tem apenas os direitos de tráfico que, esses sim, valem alguma coisa mas que uma vez a TAP morta e enterrada voltam ao mercado e serão licitados à melhor oferta. O que a TAP tem são dívidas. Mil milhões de euros em dívida acumulada de anos e anos de forrobodó onde as rotas eram estabelecidas em função dos caprichos dos directores e dos governos, os salários e regalias aos trabalhadores eram fixados a olho e dependiam dos favores e vinculações partidárias dos beneficiados em relação às sucessivas direcções da companhia, etc.etc. Por isso ninguem quer comprar a TAP sem que o governo portugues se responsabilize por estas dividas, consequencia de diatribes passadas. E isso a UE não permite.
          A questão que está em cima da mesa é só uma: ou a TAP continua publica e os seus trabalhadores (em excesso de 3 para 1) continuam a beneficiar de regalias que mais ninguem tem, ou a TAP fecha por inanição, porque não tem meios para continuar como está. Porque razão terá um país periférico como o nosso obrigação de sustentar uma companhia de bandeira (mas qual bandeira, se a bandeira portuguesa já foi abafada pela da UE) que só lhe dá prejuizo e dores de cabeça, em beneficio de uns tantos privilegiados que nela trabalham, quando e como lhes apetece? Isto já vinha da troika e pena foi que não tivesse sido já resolvido.
          Numa área geopolitica que se pretende unificada, não há lugar para companhias de bandeira. A aviação é um negócio como qualquer outro que vive da oferta e da procura e se move dentro dum quadro de concorrencia leal. Será que a Easy-jet ou a Ryannair não ocupariam de imediato o lugar da TAP nos voos de e para as Regiões autónimas com vantagem para os utilizadores? A periferia a isso obriga. Habituemo-nos a viver no século 21 pois já lá vão 14 anos dele. Bandeiras são objectos do sec 19 que acabaram com a 1ª grande Guerra.

                                    ALBINO ZEFERINO                 22/12/2014

domingo, 21 de dezembro de 2014

O PORTUGAL DOS PEQUENINOS


          Para quem não saiba, o Portugal dos pequeninos é a miniatura do país com as suas aldeias e as suas vilas, feita à escala dos mais pequenos para que eles possam nela brincar. Encontra-se bem no centro do país para que todos os portugueses tenham a ele igual acesso. Ora é sobre o Portugal de hoje, cada vez mais pequenino e insignificante, que desejo escrever.
         Os portugueses estão hoje mais desconsolados e mais tristes do que antes, porque vêem o seu país definhar a olhos vistos. Quando da construcção do Portugal dos pequeninos, o país ia do Minho a Timor e as suas aldeias e vilas eram lugares alegres e prazenteiros para se viver. Hoje, Portugal já só vai do Minho ao Algarve e as suas aldeias e vilas estão desertas ou a definhar. Do mesmo modo, antes, em Portugal, tudo o que fosse serviço publico era do Estado. Hoje, tudo está privatizado ou em vias disso, mais por necessidades financeiras do que por outra coisa, e entregue a estrangeiros que nos exploram e nos sugam os poucos recursos que ainda temos. E porquê?
          No principio da queda surgiu o desejo de alargar a todos aquilo de que só alguns beneficiavam.Vieram as nacionalizações selvagens, seguidas de gestões incompetentes e criminosas que delapidaram as empresas anexadas pelo Estado revolucionário em seu proveito e no dos seus agentes mais próximos. Veio depois o periodo da acalmia, com a devolução aos privados de alguns dos bens surripiados, mas em estado tão depauperado que já não foi possivel recriar os conglomerados anteriores. Outros bens ficaram na posse do Estado continuando a sua exploração já não em beneficio de todos, mas cada vez mais em proveito apenas dos que deles se utilizavam. Refiro-me concretamente às empresas de transporte publico e às fornecedoras de energia. O escandalo dos preços cobrados na electricidade, no gás, nas portagens e nos combustiveis comparativamente com os preços praticados nos congéneres estrangeiros é elucidativo. Com a troika, logo veio a ideia de privatizar essas companhias a fim de que a sua gestão profissionalizada e despolitizada pudesse beneficiar os utentes. Mas não aconteceu assim. Com as restrições à liberdade de acção dos novos donos, continuaram as taxas e as sobretaxas para o erário publico, as contribuições para o ambiente e a regulação dirigida dos preços. As companhias entregues aos estrangeiros continuam a servir de empregos para os portugueses amigos dos governos a troco de rendas pagas pelos contribuintes. A pouca vergonha continua e cada vez é mais descarada. O país está cada vez mais pobre e os portugueses cada vez mais descontentes.
          Este contexto serviu para que os menos escrupulosos pudessem impunemente usar em seu proveito, através de acções de corrupção cada vez mais descaradas, dinheiro dos outros para se governarem. Refiro-me concretamente a Sócrates e a Salgado. O primeiro, chegado à capital das berças beirãs, alçou-se aos mais altos lugares governativos usando a sua lábia e despudor e, sem quaisquer pejo moral, desviou milhões de euros em seu próprio proveito. O segundo, usando a sua displicente personalidade, impôs-se à familia para comandar um império que controlava 1/3 da actividade financeira em Portugal, retirando insidiosamente para si uma fortuna que destruiu um banco familiar com 140 anos de existência, prejudicando tudo e todos.
          Portugal não é definitivamente hoje o que era antes de Sócrates e de Salgado. Dum país pobre mas honrado, cumpridor dos seus compromissos e deveres, passou à categoria de país corrupto e desacreditado, olhado com desconfiança e comiseração pelos seus parceiros. É hoje considerado como terra de oportunidades por parte de inescrupulosos investidores internacionais que usam e abusam das politicas liberalizantes levadas a cabo pelos governos que se vão sucedendo, a fim de se aproveitarem dos ultimos recursos valiosos que Portugal possui. Veja-se a EDP, a REN e a ANA. Veja-se a PT e os Correios. Atente-se no que vai acontecer à TAP e ao resquicio do sector bancário e segurador.
          Vamos empobrecendo alegremente e definitivamente. Por menos do que isto, outros países outora grandes sairam do mapa. A Prussia, a Áustria- Hungria, a Jugoslávia, e as pujantes republicas italianas, entre outros. O que vai acontecer a Portugal? Perguntem a Sócrates e a Salgado. Estarão arrependidos?

                              ALBINO ZEFERINO                                    21/12/2014

sábado, 13 de dezembro de 2014

A CONTRA REVOLUÇÃO


          A propósito da brutal reacção que os sindicatos da TAP lançaram contra a intenção governativa de avançar com a privatização da companhia, poder-se-á pensar que o esforço reformista do governo afinal prossegue. Com o desfalecimento provocado pela saida da troika, logo seguido da crise Espirito Santo, tudo indicava que o governo baixara os braços nesse seu inacabado projecto reformista. Mas não. A detenção de Sócrates e o seu provável julgamento por actos de corrupção agravada, parece ter trazido novo ânimo ao governo reformista, agora de novo lançado no projecto com aparente renascida energia.
          A questão das reformas é vital para que se possa antecipar onde Portugal vai cair neste novo milénio carregado de incertezas e de ameaças globais. Ou os portugueses querem que o seu país continue a pertencer ao mundo desenvolvido ou preferem (sentem-se mais confortáveis, como hoje se diz) passar a ser considerados cidadãos de segunda classe neste mundo de contradições, com menos oportunidades e menos qualidade de vida do que os seus vizinhos de percurso. É que, queira-se ou não se queira, o mundo ainda está (e estará por muito mais tempo) dividido entre os países civilizados e os países em desenvolvimento (ou sub-desenvolvidos em relação àqueles). Nada disto tem a ver com a detenção de recursos naturais ou de capacidades bélicas, mas mais em jogos de poder ou de influência, que se desenvolvem em palcos geoestratégicos por vezes fora do nosso alcance e até da nossa percepção. Isto é, ou nos conformamos com esta vidinha à sombra da bananeira e a viver à custa de terceiros, ou resolvemos fazer pela vida trabalhando afincadamente para contribuirmos para construir um futuro mais risonho para os nossos filhos.
        A manutenção das garantias do Estado de assegurar aos seus cidadãos (e a cidadãos de países terceiros que aqui vivam) sustento, saude, educação e até regalias supérfulas (em alguns casos), não se compadece com as responsabilidades finaceiras que a libertinagem governativa de 40 anos de democracia criaram. O Estado não produz dinheiro e para proporcionar tudo aquilo a que os constitucionalistas de 1976 o obrigaram tem que se endividar no exterior. Esse endividamento determina uma submissão a determinadas regras que ultrapassam a esfera decisória soberana do Estado portugues. Ou seja, já hoje, os portugueses deixaram de poder escolher por si sós o caminho que julgam melhor para si percorrer. A passagem da troika por Portugal (e o seu eventual regresso) é uma prova cabal disto. Ora, as privatizações de empresas de sectores vulgarmente denominados publicos (transportes, hospitais, escolas, equipamentos básicos, etc.) são por assim dizer uma obrigação (ou um ónus) que os portugueses terão que aceitar (quer queiram quer não) pela impossibilidade prática do Estado poder continuar a assegurar aquilo a que meia duzia de iluminados (alguns ainda mexem hoje) inconscientemente decidiram por nós deixar plasmado na Constituição da Républica.
         É isto que os comunistas e os seus seguidores não aceitam. Não aceitam que estejamos submetidos a ditames estrangeiros, não aceitam a dura realidade dos factos, não aceitam abdicar das benesses que os seus antecessores nas tribunas do poder abusiva e inconscientemente resolveram atribuir-se a si próprios e aos seus apaniguados, não aceitam termos já perdido parte da nossa soberania (hoje ela é partilhada com os nossos parceiros comunitários e submetida ao escrutineo dos mercados financeiros) e preferem o suicidio ao tratamento. Não creio que seja esssa a opção da maioria dos portugueses e tambem não creio que todos os sofridos sejam tão inconscientemente intransigentes. Oponhamo-nos contra estas vozes da desgraça. Revoltemo-nos contra os arautos do imobilismo e do atraso social. Calemos os retrógados e lutemos pela modernidade. Preferimos ser cubanos ou ser portugueses? Preferimos viver na Síria ou no Dubai? Preferimos a alegre América ou a fria Russia? A escolha é nossa.

                                      ALBINO ZEFERINO                               13/12/2014

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

PORTUGAL SEM RUMO


          Vamos entrar no ano decisivo do nosso futuro colectivo. O que acontecer em 2015 será determinante para aquilo que nos habituamos a chamar "o nosso país". Não será tanto saber se conseguimos ou não atingir as previsões governativas sobre o défice orçamental ou se as inacabadas reformas chegarão finalmente ao fim. A questão é muito mais funda do que isso e as consequencias para nós serão muito mais determinantes acerca do nosso futuro do que as simples previsões de outono chegadas pachorrentemente de Bruxelas para nos assustar.
         Refiro-me à eventualidade da realização de eleições legislativas antecipadas na Grécia, facto com o qual o PM grego tem ameaçado Bruxelas numa tentativa desesperada de ganhar tempo e trunfos para prosseguir ao seu ritmo as reformas de que o país precisa. É que as sondagens mais recentes indicam uma vitória esmagadora do esquerdista e contestatário Syrisa que, a acontecer, lançaria a Grécia no caminho inexorável da saida do euro e da exclusão imediata das ajudas comunitárias. Seria como se por cá o Bloco de Esquerda ganhasse as próximas eleições.
          Caso essa fatalidade ocorra na Grécia, imediatamente a esquerda portuguesa (com o PS de Costa à cabeça) não descansará enquanto não lograr que o amedrontado Cavaco antecipe eleições tambem por cá, cujo resultado seria muito provavelmente, tal como na Grécia poderá ocorrer, uma vitória revanchista da esquerda, unida em torno do slogan: "direita para a rua, a luta continua". E assim alegre e inconscientemente as duas "ovelhas negras" da familia europeia sairiam de casa, ficando entregues a si próprias e ao seu trágico destino e envolvidas numa espiral de subidas das taxas de juro e da perda inexorável da confiança dos mercados.
          Paralelamente, em 2015, assistir-se-á ao embate definitivo entre as teses francesa e alemã acerca da correcção dos défices publicos. Enquanto que os socialistas franceses não mostram muita vontade em satisfazer as imposições de Bruxelas no que toca à adopção de medidas que corrijam o défice publico previsto para 2015, vistas como imposições alemãs provenientes directamente de Berlim, a Comissão europeia e o Eurogrupo já ameaçaram a França de multas em caso de incumprimento. Do resultado deste braço de ferro dependerá, em muito, a forma como serão encarados os mecanismos europeus para a contenção das dividas publicas e para a correcção dos défices excessivos dos países mais relapsos. Uma posição mais flexivel em relação à França e à Itália (não sem contrapartidas certamente) poderá significar menos exigencia no que a Portugal e à Grécia diz respeito, evitando que novas medidas de austeridade venham a ser adoptadas.
          Finalmente, será tambem em 2015 que o Banco Central Europeu, face ao risco de deflacção na Europa,terá que decidir se segue o exemplo da Reserva Federal norte-americana e do Banco de Inglaterra e começa a fazer compras de titulos da divida publica, contra a vontade expressa do gaverno alemão, que considera isso constituir um financiamento aos Estados, que não os incentiva a realizar as reformas de que precisam. Se a linha mais ortodoxa vencer em Frankfurt, serão de esperar novas subidas das taxas de juro nos países periféricos e um andamento menos favoravel da procura interna em vários países clientes das exportações portuguesas.
          Será assim do desfecho destas tres incógnitas que dependerá o futuro deste Portugal sem rumo certo e de destino indefinido. Que Santa Maria escute as nossas preces e ponha juizo nas cabeças ocas deste povo de herois inconscientes e de audazes temerários.

                          ALBINO ZEFERINO                                     11/12/2014
         

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

O ANIMAL FEROZ


          Se duvidas houvesse acerca da ferocidade do animal que a politica portuguesa adquiriu há anos a um saltimbanco de passagem pelo país com um nome espanholado e que à força de urros e de cambalhotas espalhafatosas se erigiu em chefe do circo amedrontando os outros animais com quem contracenava, decerto teriam desaparecido com as vicissitudes diárias com que o bicho (agora a ferros) nos atormenta. É inconcebivel que, depois de desmascarado nas suas diatribes criminosas, o animal continue a espernear espumando de raiva as suas frustrações de classe e gritando despudoradamente os seus complexos de culpa numa crise de negação da realidade que a sua personalidade doentia nunca conseguiu aceitar, mesmo quando ainda actuava no circo.
          Mas afinal que circo é este que aceita sem escrutineo prévio a admissão de tal besta como chefe da manada de animais que, pacatamente até então, pastavam nos verdejantes prados deste país à beira mar plantado? É um circo de aldeia, com palhaços ricos e pobres que contam histórias requentadas e sem graça às criancinhas ululantes que os cercam e que exibe animais velhos e pachorrentos em voltaretes rotineiros às palmas imbecilizadas dos espectadores anestesiados por anos e anos de enganosa rábula, tocada e cantada ao som dos cantes alentejanos (agora internacionalizados) dos libertadores de abril.  E os restantes animais, como o aceitaram sem tugir nem mugir? Terá sido o velho leão Soares que, cioso de entregar o comando das hostes a outro animal politico como ele, o acarinhou e adoptou como seu putativo sucessor? Só que a ferocidade não substitui a manha e a pretensão não equivale ao oportunismo. O animal feroz expôs-se ao mundo antes de garantir a sua imunidade. Deixou-se levar pela ambição, sem cuidar dos refluxos que as suas temerárias investidas em territórios desconhecidos aos animais da sua raça provocaram. E agora quê?
          Os animais da mesma raça do animal feroz (agora já a ferros longe da ribalta) escondem a sua natureza por detrás das chocas, badalando os chocalhos ao som da banda de musica do inteligente da tourada, fingindo empurrar o touro para dentro do curro, mas desejando, lá bem do fundo, que ele não entre, deixando as chocas ao abandono. E o publico? O publico assobia perante o mau espectáculo que o animal feroz prestou e só deseja que ele desapareça de vez da ribalta. Para escolher novo animal que substitua este, que não os esmifre e os deixe pastar à vontade nos verdejantes prados lusitanos. E quando acabar a erva?

                                       ALBINO ZEFERINO                   4/12/2014

domingo, 30 de novembro de 2014

A JUDICIALIZAÇÃO DO REGIME


          Os recentes acontecimentos de natureza criminal a que a sociedade portuguesa tem sido exposta e que provocaram um excessivo protagonismo por parte dos juizes nele envolvidos, sugerem um desenvolvimento perigoso para o futuro do regime com a consequente deterioração da sua essencia democrática. O raciocinio em que esta conclusão se baseia é simples: Se as instituições democráticas em que o regime politico assenta (governo, parlamento, presidente) não foram suficientemente capazes de absorver naturalmente e sem sobressaltos os desvios à moral e à ética politicas provocados por inescrupulosos agentes do poder, permitindo (por omissão dos seus deveres de controle ou mesmo por conluio criminoso com os prevaricadores) que os juizes justiceiros interviessem de forma a evitar que os criminosos continuassem a agir impunemente, esta inação (ou acção preversa ou incapaz) legitima reacções, por parte da população despeitada, potencialmente perigosas para o regime e eventualmente violentas para a sociedade.
         Foi para tentar evitar estas situações que se criou uma onda de solidariedade para com o ex-primeiro ministro socialista (encabeçada pelo inefável Soares, velho mas ainda suficientemente desperto para estes fenómenos) materializada nas saloias peregrinações a Évora para onde o energúmeno foi levado (justamente para dificultar estas manifestações de apoio) e permitindo as cartas ameaçadoras e as negações dos crimes por parte do acusado. É que não convém nada ao PS, saído ferido duma feroz e inédita contenda fratricida, aparecer aos olhos dum eleitorado especado por tanta pouca-vergonha, misturar aquilo que é evidente para toda a gente: se não fossem os socialistas não teria havido Sócrates, nem as porcarias e os desmandos que o desavergonhado fez.
         Do mesmo modo se poderá raciocinar com Salgado e com o escandalo do BES. Não fora a deficiente forma (há quem não exclua até o conluio) como as autoridades portuguesas lidaram com este assunto e o caso não teria chegado tão longe. A ganância duma só familia atingiu (espera-se que não tenha sido fatalmente) o regime capitalista em Portugal, recriado pacientemente durante dezenas de anos por denodados agentes, esforçados e audazes. Quem acredita hoje nos bancos? Creio que já nem os que neles trabalham.
         Foi assim que, aproveitando as hesitações e tibiezas dos que deveriam ter agido por obrigação de oficio, os juizes entraram de roldão na casa das pessoas graças às televisões, acusando, interrogando e prendendo os prevaricadores e expondo na praça publica as maldades que fizeram. Já antes com os pedófilos algo de parecido tinha sido feito. Mas aí, a coisa não tocava a todos. Com Sócrates e com Salgado, a coisa toca a todos e portanto toca ao regime.
          O risco que esta judicialização da politica faz correr é o de criar na cabeça das pessoas a convicção de que os politicos não servem para nada. Quando é preciso agir, não agem. Só agem por interesse próprio ou do partido em que se inserem. Ora os juizes não são agentes do poder executivo. Não têm que se substituir ao governo nas suas ausencias ou falhas. Ao governo cabe governar (espera-se que bem e honestamente) vigiando, controlando e fazendo cumprir a lei e acusando (quando for caso disso) os prevaricadores. Aos juizes cabe julgar aqueles que venham acusados de crimes ou de malfeitorias e condená-los ou absolvê-los. Nada mais a democracia lhes exige ou lhes permite. Quando esta divisão de poderes é posta em causa há que agir. E quem deve agir é o mais alto magistrado da Nação. De acordo com a sua consciencia e com a sua sabedoria. Para isso existe e para isso lhe pagam.
          Este fenómeno não é novo. Aconteceu nos anos 80 em Itália com a luta contra a Máfia (o célebre juiz Falcone e outros foram assassinados pelas Brigadas Vermelhas) e mais recentemente em Espanha com o célebre juiz Garzón que decidiu perseguir os franquistas prevaricadores e depois (cheio dos seus sucessos) avançou para a América do Sul atrás de Pinochet e dos generais argentinos. Cedo porém foi afastado, salvando-se de ser assassinado. Por cá a coisa parece estar a começar. O risco não é tanto a saude do juiz Alexandre, mas a descrença na politica que as suas acções (meritórias e corajosas, sem nenhuma duvida) causam nas mentes lhanas dos portugueses. Imagine-se que nas próximas eleições legislativas a abstenção ultrapasse os 50% e que o partido vencedor não atinja a maioria absoluta dos votos expressos. Com que legitimidade governará? Como serão pacificamente aceites os sacrificios que forçosamente terá que continuar a exigir às pessoas? Não sei.

                               ALBINO ZEFERINO                                   30/11/2014

sexta-feira, 21 de novembro de 2014

OS REACCIONÁRIOS



          Antigamente eram chamados reaccionários aqueles que reagiam à mudança. E o que era a mudança? A mudança era tudo aquilo que se apresentasse como novo, coisa nova, nova experiência, melhoria na situação dos mais desfavorecidos, progressismo nas ideias e nos actos. É claro que para os abastados (ou burgueses como tambem se lhes chamava) tudo aquilo que representasse mudança no status quo representava um risco para a situação dos burgueses. Risco de perderem os seus privilégios de classe (isenções de obrigações, ordenados chorudos, mordomias injustificadas, poderes pequeninos, etc. etc.), risco de perderem o seu dinheiro (nacionalizações das suas empresas e dos seus bens, pressões dos sindicatos, greves reivindicativas, manifestações publicas, exigencias salariais dos trabalhadores, etc. etc) e risco de perderem o seu estatuto (profissional, social e até económico). De tudo isto se viu logo a seguir à revolução de Abril, com as perseguições pessoais, as prisões arbitrarias, as nacionalizações selvagens e os roubos tolerados. Mas tambem em período democrático continuou-se a distinguir os bons dos maus (conforme a prespectiva de onde se observasse) entre os que tinham (dinheiro, poder, autoridade) e os que não tinham (os pobres, submissos e obedientes). Para os possidentes (seriam reaccionários) convinha-lhes que nada mudasse e que tudo ficasse na mesma. Para os possidónios (os amantes do progresso) tudo o que representasse mudança trazia-lhes esperança de melhores dias.
          Tudo isto foi posto em causa com a maldita crise que trouxe austeridade para todos (ricos, pobres, poderosos ou insignificantes) quando todos se começaram a aperceber de que o futuro (que lhes tinha sido apresentado como risonho e cantado) seria negro e sem fim à vista. A partir do momento em que se generalizou a convicção que o status quo estava a mudar, os ricos passaram a recear que nada fazer não lhes garantia a manutenção do seu estatuto e os pobres começaram a perder as esperanças de melhorias das suas situações através dos mecanismos próprios da democracia. Estas convicções foram o rastilho necessário para que a grande confusão se instalasse  nos espíritos da malta e que surgissem verdadeiras manifestações de desespero no seio dos mais recalcitrantes. Refiro-me à contestação aberta às medidas regeneradoras do governo por parte de antigos governantes e responsáveis por anteriores governos tão ou mais culpados do que o actual pela situação miserável a que chegamos, e à confusão ideológica da chamada esquerda que não sabe para onde ir, nem como proceder diferentemente quando lá chegar. Tambem são reflexos desta enorme confusão que paira nos espíritos fechados dos portugueses de hoje, o aumento generalizado e a forma escandalosa como a corrupção se pratica a todos os níveis da sociedade portuguesa. Já não é a simples cunha ou distorsão à lei que outrora fazia demitir ministros e expulsar responsáveis das suas funções, é a impunidade em que hoje ficam os verdadeiros gangsters que saquearam fortunas alheias e prejudicaram os seus concidadãos por várias gerações. A moralidade está em crise e a justiça tambem.
         Natural é assim que os mais oportunistas (ou aproveitadores de oportunidades como se queira chamá-los) comecem a pensar em alternativas. Não apenas em alternativas aos governos instalados ou a instalar, mas mais em alternativas ao status quo. Status quo que aqui significa democracia representativa. Contesta-se abertamente a representatividade dos deputados, contesta-se igualmente a legitimidade do pagamento da divida externa, contesta-se a legitimidade dos governos e da autoridade em geral, contesta-se tudo aquilo que nos obrigue a mais sacrificios. A situação de confusão a que se chegou já não se compadece com simples mudanças de governos, de caras ou até de orientações. O que a malta quer é mudança de status quo. Mas como? Através de quê? Com que meios? Será possivel de um só golpe voltar atrás, fazer de conta que não devemos nada a ninguem, arranjar emprego para os desempregados, futuro para os jovens e bem-estar para a horda de desvalidos que consome os cofres do Estado com os seus subsidios e apoios à mendicidade? Não creio.
          É neste contexto de mudança que começam a surgir por todo o lado (em Portugal ainda não) tentativas politicas que, a coberto de populismos e demagogias perigosos, se apresentam ao eleitorado como os salvadores do mundo em crise e profetas duma nova forma de gerir a coisa publica. É o caso do Syrisa de Tsirpas na Grécia, do Podemos de Iglésias em Espanha, do Cinco Estrelas de Beppe Grillo em Itália, do Partido Pirata na Suécia e do Die Linke na Alemanha (que vai entrar no governo da Turíngia). Tudo malta reivindicativa e esquerdófila. Não será isto o principio do fim da União Eurpeia como nós a conhecemos e a estudamos? Pela direita, em França, o Front National de Le Pen já vai mais adiantado e aspira a uma vitória esmagadora nas próximas eleições, enquanto que o perigoso UKIP de Nigel Farage, no Reino Unido, ameaça Cameron e sobretudo a Europa unida. Não será altura para que os novos responsáveis comunitários (e sobretudo os governantes alemães e franceses) aproveitem estas ameaças ao projecto europeu e duma vez por todas se lancem numa verdadeira união de Estados capaz de fazer frente a estas ameaças e de sobretudo trazer aos cidadãos europeus a esperança de que melhores dias vão chegar. Assim seja para todos e sobretudo para nós.

                           ALBINO ZEFERINO                                      21/11/2014

domingo, 9 de novembro de 2014

OS MAL AGRADECIDOS


          Pela segunda vez em poucos meses os "irmãos" timorenses desfeitaram Portugal. Primeiro, com a "eleição" antecipada do ditador da Guiné Equatorial para membro da CPLP, quase à revelia do Presidente e do primeiro ministro de Portugal que, cheios da importancia que julgavam levar com a sua presença em Dili na cimeira de Chefes de Estado e de Governo dos países da CPLP, viram o caquético Presidente guiné-equatoriano já sentado ao lado dos outros na cerimónia de entronização do novo Estado-membro da organização, mesmo antes de iniciada a cerimónia. Agora, com a expulsão inusitada dos magistrados portugueses de Timor, acusados de má conduta profissional.
          Se a primeira desfeita poderia ser justificada (ou fingindo ignorá-la) atendendo ao receio que os timorenses sentiam perante as repetidas duvidas manifestadas por Portugal quanto à idoneidade democrática do governante guiné-equatoriano para fazer parte da CPLP, já a segunda desfeita não tem qualquer justificação. A cooperação judiciária que Portugal bem-intecionadamente prestava ao Estado irmão exigia, no minimo, consultas prévias que evitassem tal afronta. Aceita-se que o exercicio de um poder soberano exercido por elementos de outro país num país terceiro devesse ser praticado com as maiores cautelas (o que aparentemente parece não ter sido feito), mas é inaceitável uma decisão politica extrema e imprevista, sem prévias consultas com os responsáveis do país cooperante, tivesse tido lugar sem represálias correspondentes à afronta. O anuncio da simples interrupção unilateral da cooperação judiciária por parte de Portugal não basta.
          Ansiosos por mostrar aos seus novos amigos petrolíferos que quem manda em Timor Lorosae são exclusivamente os seus governantes, Xanana e os seus ministros aproveitaram os deslizes neo-colonialistas portugueses para manifestar uma independência que não têm, à custa dum grave insulto aos que lhes proporcionaram, com o seu denodo e determinação, uma independência formal, ainda não inteiramente solidificada. Sem Portugal, Timor não seria um país formalmente independente, nem teria condições de governabilidade, que a presença das forças da ordem portugesas e os juizes portugueses lhe proporcionam. Por seu lado, com a sua passividade e condescendência, Portugal mostrou que não tem estatuto (nem condições) para cooperar eficazmente com terceiros, mesmo quando sente que é indispensável para assegurar as condições minimas para que Timor possa continuar independente.
          No primeiro caso, Portugal poderia ter minimizado a afronta se a tivesse previsto. A presença simultânea do chefe de Estado e do chefe do governo de Portugal na mesma cerimónia (presença apenas formal, uma vez que a decisão politica sobre a entrada da Guiné-Equatorial na CPLP já tinha sido tomada antes) foi exagerada e deveria ter sido evitada. Sem as mesmas razões para igual cautela (Brasil e Angola sempre defenderam a entrada incondicional da Guné-Equatorial -país com petróleo - na CPLP), os chefes de Estado brasileiro e angolano (ambos detentores do poder executivo nos seus respectivos países, ao contrário de Portugal) delegaram a sua presença nos seus ministros dos Negócios Estrangeiros e nada nem ninguém deu pela sua falta. Mas nós não. Como antigos colonizadores e actuais cooperantes activos de Timor (como que "tutores" da sua independência), tivemos que nos fazer representar numa cerimónia formal (e banal) pelos dois mais altos responsáveis pelos destinos de Portugal, para mostrar ao mundo que ainda tinhamos algo a dizer sobre Timor.
Que ilusão. Com a desfeita manifestada aos nossos mais altos dignatários, os timorenses disseram alto e bom som que Portugal (e as suas opiniões) para eles nada conta.
          No caso da expulsão inusitada dos magistrados portugueses (como se de vulgares delinquentes se tratassem) a afronta assumiu foros de ofensa publica e oficial (fazendo lembrar o ultimato ingles a Portugal em 1890), não se compadecendo, a meu ver, com uma simples e formal declaração (por parte apenas da ministra da Justiça responsável pela cooperação judiciária) de que a cooperação pela qual é responsável ficava suspensa. Até quando? Em que condições? Aguardando um pedido de desculpas para ser retomada? E as restantes relações? Ficam tambem suspensas ou não serão afectadas? O nosso embaixador continua por lá como se nada de grave tivesse acontecido? A cooperação policial, militar e a do ensino da lingua portuguesa continua, como se nada tivesse a ver com isto? Portugal aceita que outro país (mesmo tratando-se do "irmão" timorense) o trate com a displicência e o desprezo que a decisão de Xanana revelou? Se assim for, então merecemos mesmo ser tratados como "protegidos" dos nossos credores, como alguns indignados acusam o governo de aceitar.

                      ALBINO ZEFERINO                             9/11/2014

domingo, 2 de novembro de 2014

PODEMOS


          O novo movimento politico espanhol denominado PODEMOS ultrapassou nas sondagens os velhos PP e PSOE da democracia pós-franquista. Ou seja, se houvesse eleições agora em Espanha, teriamos uma revolução politica aqui mesmo ao lado. Mas afinal o que é o PODEMOS e o que representa? É um movimento civico (ou seja, não vinculado a uma ideologia definida) que atrai uma grande maioria de espanhois de todas as proveniencias. Representa o falhanço dos partidos tradicionais na condução dos destinos do país e constitui uma ameaça para a democracia representativa e institucional.
          E o que representa o PODEMOS para os portugueses? Atrever-me-ia a vaticinar que a eventual ascensão do PODEMOS ao poder em Espanha poderá ter as mesmas consequencias do que teve em 1936 a ascensão ao poder em Espanha da Frente Popular. Para quem não se lembre, foi a tomada do poder pela coligação dos socialistas e dos comunistas em Espanha que conduziu ao levantamento militar que iniciou a guerra civil (o chamado "movimiento"). Se porventura Salazar não tivesse estado no poder em Portugal nessa altura, teriamos fatalmente sido engolidos nas fauces sanguinárias daquela que foi a mais terrivel das guerras civis do século passado.
          Só não conhecendo a idiossincracia de "nuestros hermanos" se poderá dizer que uma alteração estrutural do panorama politico espanhol, como a que resultaria duma subida ao poder de um grupo que não se sabe o que quer nem o que procura, não iria conduzir a enfrentamentos violentos e profundos, entre esquerdas e direitas, entre autonomistas e nacionalistas, entre naturais e imigrados e entre ricos e poderosos e pobres e ressabiados. E como Passos e Portas não são Salazar e o Costa ainda menos, teriamos os enfrentamentos entrando-nos pela porta num "santiamen" (como eles dizem). Depois seria o salve-se quem puder pelas veredas acima.
          Por cá ainda não há PODEMOS, mas não será dificil deixar de pensar na manifestação expontânea (com beatas de charuto no chão e tudo) que se formou há tempos, por causa da TSU. Num "santiamen" tambem, a coisa poderá transformar-se num levantamento popular. Basta sentir o ódio reprimido como olhamos uns para os outros quando nos cruzamos nas ruas, ou a forma rouca e surda como as palavras de ordem saem da boca dos manifestantes, quando pacifica mas ruidosamente desfilam a caminho da Assembleia da Republica.
         O PODEMOS espanhol significa que as coisas não estão bem e que o povo (seja lá o que isso for) está disposto a mudar o status quo. PODEMOS significa que podem e quem quer pode, como diz o povo.

                                ALBINO ZEFERINO                                      2/11/2014

A INVEJA NACIONAL


          A inveja é um pecado ou defeito que dificilmente passa sem consequencias. O invejoso é aquele que sente despeito e frustração por não conseguir obter as vantagens ou os sucessos alheios. Fica furioso e desesperado por não conseguir suportar o sucesso de outrem. Sendo uma caracteristica comum à natureza humana (os animais não têm inveja), manifesta-se com mais evidência nos mais desfavorecidos intelectual e culturalmente e portanto nos mais incapazes. Infelizmente é tambem um defeito de carácter muito próprio dos portugueses. Não é por acaso que o grande Camões termina o seu genial épico com a palavra maldita, referindo-se aos seus compatriotas.
          Em vez de enaltecer aqueles que se distinguiram pelas suas acções e que, por isso, atingiram lugares e situações que os invejosos nunca conseguiriam atingir, os invejosos normalmente   desdenham e denigrem aqueles que deveriam festejar, procurando fazer ressaltar os seus defeitos e as suas deficiencias, que todos temos como seres humanos que somos. Tratando-se dum compatriota, ainda é pior, pois a comparação conosco é mais evidente, pois julgamos que seriamos capazes de fazer o que ele fez e da forma como o fez. Só que não é assim e por isso colocamo-nos aos olhos de quem nos vê e nos ouve como frustrados e incapazes de proceder como aqueles que desdenhamos.
          Vem isto a propósito da forma despudorada e soez como a generalidade dos portugueses se refere ao único compatriota que até hoje conseguiu atingir uma posição internacional do destaque que representou a presidência da Comissão da União Europeia protagonizada por José Manuel Durão Barroso. Nunca nenhum portugues, durante os cerca de 900 anos de existência de Portugal como país independente, conseguiu atingir tal posição de destaque mundial, nem nunca um portugues conseguiu ter a notoriedade mundial que Barroso protagonizou enquanto exerceu tal função. Na sua pequenez de espírito e mostrando uma inveja colectiva que o genial Camões bem retratou nos seus Lusíadas, os portugueses preferem destacar na personalidade de Barroso enquanto Presidente da Comissão, não o seu incansável labor de árbitro entre a ganância dos grandes e a angustia dos pequenos, mas antes ressaltando a tibieza da sua acção mediadora na defesa da manutenção duma unidade estratégica indispensável para evitar o desmembramento duma ideia esplêndida. Será que a Europa das Nações não ficou a dever a Barroso e à sua persistente acção mediadora a continuação do projecto europeu como forma de preservar a unidade do Velho continente?  Teria sido preferivel que Barroso tivesse tomado partido a favor de uns contra outros abrindo portas para o desmembramento duma Europa comunitária assente numa moeda comum e baseada em principios comuns de sã convivência? Seria melhor para Portugal que Barroso tivesse advogado uma divisão formal entre ricos e pobres que forçosamente conduziria à destruição da União europeia e à moeda comum? O que aconteceria a Portugal se regressasse ao escudo desvalorizável e abandonasse as politicas orçamentais e monetárias consagradas em Maastricht?
          Não conseguindo demover as perseverantes convicções europeias de Barroso, os invejosos lançaram-se na soez acusação de abandono do país que Barroso protagonizara quando aceitou o lugar de Presidente da Comissão, quando ainda era Primeiro Ministro de Portugal, num momento dificil para o país. Nada mais vil! Aproveitando uma oportunidade que nunca mais surgiria nos tempos mais próximos, Barroso viu que poderia continuar a ser útil a Portugal (como o foi) sem desdenhar uma situação que indubitavelmente prestigiou o seu país. E não se diga que não conseguiu prestigiar Portugal só porque agora (não podendo voltar a ser reeleito) não teve outro convite para prosseguir a sua carreira internacional. Que anterior Presidente da Comissão europeia saltou desse para outro lugar com o mesmo destaque? Nem Delors, nem qualquer outro.  Barroso fez o que qualquer outro portugues (e não só) teria feito nas mesmas circunstâncias. Só que mais nenhum portugues foi convidado para um lugar tão destacado como ele foi. A inveja nacional não permitiu que Barroso regressasse em ombros como mereceria.

                                    ALBINO ZEFERINO                                                   2/11/2014

sábado, 1 de novembro de 2014

REFORMAS À PRESSA


          Aproximando-se o fim deste ciclo politico iniciado com a troika, verifica-se que, por muito que o actual governo se tenha esforçado na implementação das necessárias reformas impostas pela troika, pouco se fez no concreto. A impossibilide de contar com o apoio dos socialistas para esse designio nacional (com receio de que o povo os confundisse com os malandros do governo que não cessavam de lhes exigir sacrificios incompreensiveis para a maioria deles), aliada à reacção à mudança, entranhada no espirito tacanho do povo portugues, marrano por natureza e ignorante por tradição, fez o resto. Em duas palavras se explica a situação: Afogados em dividas desde o 25 de Abril, os portugueses foram, pela primeira vez neste século, confrontados com um problema que nunca ninguem lhes dissera ser deles e só deles; era preciso tomar medidas drásticas para suster a espiral devedora em que o país tinha caido, sem sequer dar por isso. Essas medidas tinham como objectivo reformar o Estado no sentido de travar a sua furia gastadora que, com Sócrates ao leme, tinha tomado proporções gigantescas. Primeiro na saúde com o famigerado sistema nacional de saude - utopia maçónica que obrigava o Estado a garantir sem condições a assistência medico-medicamentosa e os apoios sociais conexos, a todo o bicho careta que o solicitasse.  Se o doutor ia ao médico de cada vez que a cabeça lhe doia, porque é que o Zé povinho não podia fazer o mesmo, agora que o constitucionalmente protegido SNS lho proporcionava?  O mesmo se diga com a Educação e com a demagogica legislação socialista, que alargara até aos 16 anos os estudos obrigatórios e gratuitos a toda a gandulagem que se arrastava drogada pelos cantos do país. Só que não bastou inscrever oficiosamente os meninos nas escolas. Foi preciso arranjar escolas onde essa maralha toda coubesse, encontrar professores que ensinassem aquilo que esses enrgumenos deveriam saber (e não programas antiquados ajustados apenas aos betinhos que antes frequentavam as escolas) e transportá-los e alimentá-los. Ora tudo isto custa balurdios. Tambem a segurança social começou a revelar-se uma fonte inesgotável de despesas com a atribuição descontrolada dos demagógicos apoios sociais por tudo e por nada, atribuidos sem vigilância nem critério, apenas bastando acenar com o braço ou levantar um pouco mais a voz para passar a receber sem trabalhar. Um regabofe! A atribuição sem qualquer critério cientifico de reformas antecipadas aos funcionários publicos (com o argumento de que assim se aliviava o orçamento do Estado, sem pensar que a Caixa geral de Aposentações tambem é suportada por dinheiros publicos) e a compra de fundos de pensões às entidades privadas, aumentando as responsabilidades futuras da segurança social do Estado, foram tambem causas determinantes para o estado depauperado em que se encontram hoje os recursos financeiros do país.
          Foi para tentar pôr cobro a esta situação de anarquia institucionalizada que a Constitução portuguesa protege, que a troika propôs ao governo um programa de restruturação do Estado ambicioso, para cuja execução seria necessária a colaboração patriótica do PS.  PSD e CDS apenas recolhem uma maioria simples dos votos dos deputados, sendo necessário o apoio dos deputados do PS para conseguir maiorias qualificadas que permitam a implementação de reformas de fundo, começando pela da própria Constituição politica da Nação. Mas com Seguro ao leme nada disto foi possivel e daí que as reformas essenciais e mais importantes ficaram por fazer. Seguro sonhava em substituir Passos na liderança do Governo e por mais evidente que a cooperação inter-partidária se impussse, o gajinho não desarmava com medo de perder votos que comprometessem o seu projecto pessoal. Tanto se pôs a geito que os próprios socialistas correram com ele. Agora há que esperar que Costa se alce e que Passos (ou outro qualquer que fique na liderança do partido) assuma o que o maricas do Seguro não quiz fazer. Porque sem acordo inter-partidário nada se pode fazer e Costa sabe-o. Só que por enquanto não o diz.
          Apercebendo-se da posição prudencial que Costa adoptou desde que passou a chefiar o PS, Passos começou agora um contra-relógio reformista (finalização das privatizações, alguma renegociação de PPP´s, lançamento de programas de desenvolvimento apoiados pelo novo QREN, recuperação do plano energético de Sócrates,etc.) na expectativa de ainda conseguir ficar bem na fotografia de familia que vai ser tirada depois das próximas eleições legislativas. Tambem por isso fez questão em assinalar que estas se irão realizar na data constitucionalmente prevista e não antes. A ver vamos!

                                    ALBINO ZEFERINO                                                1/11/2014

sábado, 25 de outubro de 2014

O ZÉ PAGANTE


          O exagero da tributação em Portugal atingiu as raias do aceitável. Não só os pressupostos da tributação estão desajustados em relação aos contribuintes a quem os impostos se dirigem, como o conceito de contribuinte está desajustado relativamente ao chamado português médio. Considerar que alguém deve contribuir com os seus rendimentos (sejam do seu trabalho, sejam das suas poupanças ou da sua reforma) para além do limiar da pobreza é no minimo criminoso. Não se trata de exigir sacrificios ou abdicação a alguma folga que se tenha conseguido com esforço e dedicação ao trabalho, mas sim de uma expoliação (ou roubo, como se queira chamar-lhe) do direito de propriedade que a Constituição zelosamente quis consagrar. Senão vejamos.
          O portugues médio é casado, tem 2 filhos e um rendimento médio de 1.500€ mensais (limite de rendimento a partir do qual se é considerado "rico" aos olhos da Autoridade tributária). Desse "enorme" rendimento, o portugues médio tem que descontar à cabeça a renda que paga pela sua casa (ou os juros do empréstimo bancário que contraiu para a comprar) e  além disso terá que pôr de lado, pelo menos, metade do que mensalmente recebe para pagar as contas do supermercado e as contas do gás, da electricidade, das comunicações e da água que ele e a sua familia consomem, além das despesas de condominio do andar que habita (se o comprou). Não falo nos "extras" que mensalmente surgem, como médicos, seguros, prestações diversas (carro, computador, etc.), roupa para si e para os que de si dependem, propinas e livros para as escolas dos filhos, algum presente de anos e alguma saida nocturna para desopilar, portagens nas auto-estradas e oficina para a revisão da viatura, entre outros. Não admira, assim, que a grande maioria dos portugueses vivam no que se costuma chamar "o limiar da pobreza".
          Em cima disto tudo surgem os famigerados impostos (directos e indirectos) que o Zé pagante tem obrigatoriamente que suportar e que variam em função dos rendimentos (ou propriedades) que eventualmente detenha. Refiro-me ao IVA - que faz aumentar o custo dos bens e serviços que consome (algumas vezes em 1/4 do seu valor) -  ao IMT, ao IMI, à taxa de conservação de esgotos, aos seguros obrigatórios, ao IUC, ao ISP (que fazem com que os combustiveis sejam em Portugal dos mais altos no mundo), ao imposto sobre o tabaco (para quem ainda fume) ao imposto sobre os veiculos (ISV), ao imposto sobre o alcool e sobre as bebidas alcoolicas e ao imposto de selo (que disparou em valor e em incidência) e agora até para a ecologia. Não falo já na famigerada TSU nem no IRC (que recai maioritariamente sobre as PME´S, afogando-as), mas terei ainda que mencionar o malfadado IRS. Este, apesar de recair "apenas" sobre parte da população (só quem declare que recebe mais do que o minimo vital é que está sujeito a ele) é tão elevado para os bolsos do portugues médio a ele sujeito, que transformou a sociedade portuguesa em geral num bando de indigentes.
          Quando estudei direito fiscal na Faculdade aprendi que o imposto antes de ser lançado era sujeito a umas regras essenciais de convivência social (tão essenciais que não precisavam de figurar na Constituição) que preservavam o equilibrio na sua cobrança e a adequação desta na necesidade em cobrá-los. Só pagava imposto quem podia (ou seja, quem não empobrecia para o pagar) e de forma a que todos os que podiam pagavam sem reclamar, pois consideravam esse pagamento como uma contribuição para os outros e para a sociedade. Hoje infelizmente já não é assim. Paga quem tem e o produto da sua contribuição sabe-se lá para onde vai...É claro que esta convicção leva fatalmente à fuga generalizada aos impostos e ao aproveitamento desse esbulho para onde os governos bem entendem (corrupções, investimentos publicos desastrosos, pagamento de apoios sociais descontrolados e subsidios inuteis para sectores não essenciais).
          O sistema fiscal portugues está doente. Está desajustado das realidades e obedece a regras iniquas próprias dos esbulhos dos saques filibusteiros de antanho. O Estado precisa deseperadamente de dinheiro para fazer face às enormes dívidas que contraiu nos ultimos 40 anos sem proveito para a sociedade nem para os seus cidadãos. A generalização do conceito de divida publica crescente (sem olhar à capacidade do país para a satisfação dessa divida cada vez maior) apenas com os olhos postos no aproveitamento imediato desses dinheiros conseguidos através duma rapina institucionalizada, vai fatalmente conduzir Portugal a uma situação de insolvência permanente donde dificilmente conseguirá sair sem empenhar por muitos anos a sua independência nacional.
          Não vale a pena culpar o euro deste descalabro, nem ficar à espera que outros (a UE e o seu BCE) venham salvar-nos deste futuro negro, que se vem descobrindo quotidiananmente aos nossos olhos. O desastre incontrolado do BES/GES (ultimo bastião do capitalismo privado em Portugal) na sequência da falência cada vez mais evidente da banca portuguesa (BCP, BPN, BANIF, etc.) e as sucessivas politicas partidárias que conduziram este belo mas triste país para a ruina, foram os verdadeiros carrascos de Portugal nesta caminhada democrática iniciada em 1974 que está prestes a chegar ao fim. O que se seguirá não sei. Mas não será certamente boa coisa.

                                              ALBINO ZEFERINO                                       25/10/2014
           
         

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

O ORÇAMENTO DE MENTIRA


          O orçamento do Estado para 2015, ontem entregue com pompa e circunstância na Assembleia da Republica para discussão e votação, não é mais do que um reflexo do governo condicionado pela obrigação constitucional. Diz-se que há um relfexo condicionado quando algo é feito mecanicamente, por obrigação de função ou social, como quem cumprimenta alguem por dever de oficio ou por precaução profissional para evitar ficar mal aos olhos do cumprimentado.
          Com um governo em fim de ciclo, acusado de não ter conseguido cumprir os minimos impostos pela troika, não se anteveria grande estratégia neste documento. E se a houvesse serviria para quê? O futuro de Portugal está à vista de todos. Já o tenho dito aqui e repito: Portugal será no futuro o que os credores internacionais decidirem que seja com as suas avaliações, previsões e imposições. E perante os sucessivos desaires governativos na reestruturação do país, não poderemos esperar grande coisa no próximo futuro.
          Este governo, sem embargo das expectativas que tinha criado no inicio do mandato, pouco mais fez do que Sócrates e os seus sócretinos, limitando-se a tentar baixar o défice "para ingles ver", à custa dum brutal aumento de impostos, que deixou exângue a classe média criada pacientemente durante 10 anos por Cavaco, em vez de diminuir os gastos excessivos do Estado, verdadeiro sugadouro do produto nacional bruto portugues, em despesas improdutivas e iníquas resultantes das obrigações constitucionais impostas por um contrato social desactualizado e criado à sombra dos excessos revolucionários de abril.
          Mais valia ter deixado para os novos governantes (sejam eles quem forem) a tarefa de produzir o documento central que servirá para orientar as nossas vidas durante o próximo ano. Não faz muito sentido elaborar um documento orientador para ser executado por outros quando sabemos que não seremos nós a fazê-lo. Ou será que Passos e Portas ainda não perceberam que vão ser comidos com batatinhas pelo Costa do castelo nas próximas eleições, pois deixaram à vista de todos a sua incapacidade de reformar o Estado, tarefa para a qual tinham sido eleitos e que tinham prometido fazer? Não é com paninhos quentes, conversinhas concertadas, trocas de favores ou negócios sob a mesa, que se reforma um pais com vicios entranhados há mais de 40 anos e manhas institucionalizadas na legislação. Haveria que ter cortado na despesa do Estado com coragem e determinação. Escolheram-se bons ministros para isso (Saude, Educação e Segurança Social) mas nada foi feito de essencial. Os médicos e os enfermeiros foram postos na ordem? As farmaceuticas foram reguladas? Os hospitais foram reesturturados? O acesso à saude foi regulamentado? As escolas foram reesturturadas? O ensino foi harmonizado? Os professores em excesso foram mandados para casa? O ministério foi reduzido à sua forma mais simples conforme com as boas regras, ou continuou a decidir tudo, desde a colocação da horda dos profesores, às matérias a ensinar e até ao numero de alunos em cada turma?  Os subsidios sociais foram sustidos? Houve alguma alteração substancial na segurança social? Foi conseguida a sustentação do sistema de reformas? Baixou o volume das despesas com a segurança social?
         Ainda se este projecto de orçamento contemplasse regras que obrigassem o futuro governo a agir de acordo com o que estava estabelecido pela troika e que o actual não teve coragem (ou competência) para implementar,vá lá. Mas o que este orçamento faz é fixar percentagens fantasiosas de défice, de PNB e de desemprego a atingir, como se o simples desejo do governo fosse o motor necessário para fazer sair o país deste atoleiro onde se encontra, sem expectativas de recuperação redentora, nem motivação que anime o Zé povinho a mexer-se.

                                      ALBINO ZEFERINO                                   16/10/2014

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

A IMPLOSÃO DO SISTEMA PARTIDÁRIO


         
          Com a queda do muro de Berlim iniciou-se um novo ciclo da chamada democracia representativa na Europa. Os antigos partidos democrata-cristãos, sociais-democratas e comunistas deram lugar a novas organizações partidárias concentradas em redor de novos conceitos politicos baseados mais em realidades virtuais como as auroras douradas, os ecologismos e os ambientalismos, os partidos da terra ou agrários, os partidos populares, os blocos de esquerda ou de direita, as casas da Russia, as solidaridades e as uniões de todo o tipo, etc.etc. Os conceitos politicos baseados nas doutrinas clássicas como a do marxismo-leninismo ou a doutrina social da Igreja deixaram de ser as referências de que os partidos se reclamavam para dar lugar à formação de organizações de cidadãos com o objectivo de conquistar e de exercer o poder politico. Os conceitos sociais deram lugar a conceitos de classe a partir dos quais se arregimentam os militantes desejosos de fazer politica e de usufruir dela. Os novos partidos passaram a defender mais os privilégios de classe ou de lugar e menos a busca de ideais de solidaridade e de igualdade de que os antigos partidos se reclamavam.
A democracia politica deixou assim de ser a forma menos má de organizar e de conduzir as sociedades (como Churchill a defendia) para dar lugar a uma amálgama de interesses contraditórios que disputam entre si o exercicio do poder politico.

          Nas sociedades pluripartidárias saídas da Grande guerra de 1939/45, onde esquerda e direita se distinguiam pela defesa da detenção dos meios de produção nacionais no Estado ou nos particulares, os novos partidos encaixaram-se naturalmente nesses conceitos, continuando os da esquerda defendendo o Estado na economia e os de direita defendendo a liberalização desta. Em Portugal, contudo, a ideologia marxista ferozmente introduzida pelas "campanhas de esclarecimento" na população ignorante, protagonizadas pelo PREC, não permitiu que os novos partidos se pudessem livremente exprimir contra a detenção pelo Estado dos meios de produção nacionais. Ainda hoje, o chamado complexo de esquerda está arreigado na população portuguesa, impedindo que os partidos de direita se exprimam claramente a este respeito junto dos seus eleitores.

          Foi preciso que a crise de 2008 agitasse as consciências para que, em Portugal, o actual governo se visse forçado a definir, através das chamadas politicas de austeridade, que o que os partidos de esquerda defendiam como sendo "sagrado" (as chamadas conquistas da revolução) tinha que ser posto em causa. Com um atraso de 20 anos, estamos agora a verificar que as velhas doutrinas do marxismo, da social-democracia e da democracia-cristã já não respondem aos problemas sociais e económicos que a sociedade hoje enfrenta. Daí o surgimento de novos partidos (o partido novo e o movimento de Marinho Pinto, por exemplo) que representam a incursão portuguesa no novo fenómeno partidário europeu. Em breve veremos como nascerão em Portugal novas manifestações de organização politica como estas, que tentarão responder à insatisfação crescente da população pelo funcionamento da democracia instalada em 1974.

          Sem uma reforma profunda do sistema politico em Portugal não será possivel continuarmos a viver como até agora, beneficiando dum sistema de segurança social avançado e proporcionando saude e ensino para todos, refreando o desemprego e promovendo um aumento da produção nacional. Os velhos partidos (PS, PSD, PCP e CDS) terão que se reformar, unindo-se, desintegrando-se ou dando lugar a outros novos. O sistema eleitoral tem que ser modificado, ajustando o numero de deputados à população existente e alterando a sua representatividade. O financiamento dos partidos tem que ser reajustado, escrutinado detalhadamente e tornado publico. As imunidades e os privilégios dos deputados e dos restantes órgãos de soberania têm que ser igualmente reajustados, escrutinados e publicitados. A reforma da Administração publica, ajustando-a à realidade, tem que prosseguir com denodo e determinação e a opção europeia terá que ser institucionalizada, através do cumprimento rigoroso do tratado orçamental e do pacto de estabilidade. Só assim recuperaremos a nossa imagem de país europeu, membro do pelotão da frente dos países mais desenvolvidos do planeta e merecedor da história que os nossos maiores protagonizaram desde há mais de 900 anos. Não nos esqueçamos que demos novos mundos ao mundo, como Camões bem deixou plasmado no seu épico "Os Lusíadas".

                                 ALBINO ZEFERINO                              6/10/2014
         

domingo, 5 de outubro de 2014

DEMOCRACIA E REPUBLICA


          Hoje é dia da Republica. Faz 104 anos que uns gajinhos desgarrados começaram aos tiros à entrada de Lisboa (na altura no aterro da Rotunda) até que outros tantos subiram à varanda do edificio da Câmara municipal para que a Republica fosse declarada. A malta aceitou, como tem aceite sempre tudo o que é novidade. Na provincia (Porto incluido) nem se deu por nada, senão mais de uma semana depois.
          Com a Republica veio a Democracia, ou seja, a presença de um privilegiado à cabeça do reino passou a ser disputada eleitoralmente. E no parlamento as eleições deixaram de ser para legitimar as opções governativas reais. Instituiu-se o sufrágio universal (mais ou menos, como tudo em Portugal) e as mulheres passaram a poder votar tambem. E foi assim, da manhã para a tarde, que se mandaram às urtigas quase 800 anos de Monarquia.
          Mas afinal o que tem a Monarquia a ver com a Democracia? Pode haver Monarquia com Democracia e Republica sem ela? Todos sabem que sim. O que todos sabem tambem é que à medida que os anos passam o conceito de Democracia evolui. Para que a Democracia não se esboroe nas lutas politicas entre os mais conceptualistas e os mais pragmáticos, torna-se necessário adaptar os conceitos democráticos às realidades concretas que nos toca viver. Para manter a Democracia contra a ditadura nazista, não foi necessário que os países democráticos se aliassem com a ditadura soviética durante a 2ºguerra mundial?
          Com o desaparecimento da cortina de ferro, que separava os países ditos democráticos dos chamados marxistas no decurso de guerra fria entre o Ocidente e o Oriente europeu, o conceito de Democracia evoluiu. Eu diria mesmo que ainda está hoje em evolução. A simples existência constitucional de eleições periódicas para refrescamento da legitimidade democrática dos vários orgãos de soberania, veio a ser secundarizada por mecanismos institucionais pré-estabelecidos que limitam o livre recurso às eleições, de cada vez que se pretende alterar o satus quo. O que eu quero dizer é que as exigencias cada vez mais prementes e determinantes do quotidiano das pessoas coadunam-se cada vez menos com a liberdade do recurso arbitrário a eleições, de cada vez que surge um impasse politico na condução da coisa publica. Assim se explica o continuo aumento da abstenção nos sucessivos actos eleitorais que as autoridades vêm impondo aos cidadãos para se desreponsabilizarem das suas obrigações (ou seja, para atirarem as responsabilidades das suas asneiras para cima dos eleitores). Ora isso mesmo desincentiva as pessoas na participação eleitoral, desacredita o acto eleitoral como forma suprema de manifestação da vontade popular (fazendo aumentar a contestação informal) e retira o carácter vinculativo que a escolha sufragada deve revestir (cada vez mais se assiste a manifestações de repudio de resultados eleitorais).
          Não me repugna assim que as Constituições politicas (e a Constituição europeia, quando existir) definam com clareza e sem ambiguidades quando, como e porquê pode haver recurso a eleições. Só nesses casos (e nesses momentos) será legitimo recorrer às eleições, mais para assegurar uma alternancia governativa do que para passar certidões de óbito a governos moribundos ou permitir desforços eleitorais a grupos menos conformados com as suas derrotas. Deste modo, as governações seriam mais eficazes, mais previsiveis e mais uteis aos governados, que afinal são os verdadeiros detentores da soberania politica, seja ela nacional, comunitária, regional ou local. Não são os reis, nem os partidos e muito menos os politicos. Vejam os americanos, com as suas eleições de 4 em 4 anos, para mudança de Presidente e aproveitando para mudar metade do Congresso. Nem demais nem de menos. Porque não copiar as coisas boas e não criticar sempre por criticar?

                                    ALBINO ZEFERINO                       5/10/2014

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

COSTA E OS OUTROS


          Com a esperada vitória de António Costa na inédita contenda interna do PS, iniciou-se, de facto, um novo ciclo politico em Portugal. O governo Passos/Portas está desgastado, não consegue fazer mais do que já fez (de bom ou de mau, conforme as perspectivas) e sente-se no ar o ambiente de fim de festa que caracteriza os fins de ciclo em Portugal: boatos direccionados, manifestação de cansaço governativo, arrumação de pessoal politico, hesitações em tomadas de decisões importantes, alheamento de responsabilidades, desanimo nas conversas, etc.etc. Só não se sabe quanto tempo este intervalo vai durar. Noutro país qualquer, este estado de espírito colectivo seria suficiente para desencadear imediatamente eleições que desanuviassem o peso do ambiente e clarificassem as estratégias para o futuro. Mas o dogmatismo constrangedor e a tibieza cobarde que habita os espiritos dos lusitanos não permite que não se cumpram religiosamente os prazos constitucionais previstos. Ou seja, sem que Passos se demita, só haverá eleições legislativas (e portanto novo governo) dentro de um ano. A Passos, a quem espera uma dura travessia do deserto, não interessará tomar iniciativas. Enquanto o pau vai e vem folgam as costas. Costa, que já tem a glória que procurava, não tem pressa em tomar as rédeas duma carroça desengonçada e sem destino, antes que as contas do BES estejam saldadas e as ajudas do Draghi a caminho (ou seja, antes que a união bancária europeia atinja a velocidade de cruzeiro). Cavaco, o tibio dogmático, rei do Portugal democrático feito pelos amigos do Costa (que não dele), quer é que o tempo passe depressa até que cheguem os 6 meses anteriores às eleições presidenciais (mais umas), o denominado período de nojo constitucional. O único a quem interessa ir marcando caminho é a Portas, que hesita entre pedir namoro a Costa ou a transformar-se na sua alternativa de direita. Mas para se decidir (Portas não é tibio nem dogmático, é apenas sacana e sem carácter) convém-lhe também esperar pela definição politica do manhoso Costa e pelo tamanho da derrota de Passos (um e outro destes fenómenos serão determinantes para a opção do CDS). Poderá entretanto entregar o partido a Cristas ou a qualquer outro descartável, enquanto estas duvidas não se clarificam (a sua falhada tentativa de ser nomeado comissário europeu a isto sugere) mas arriscando-se a ser ultrapassado no partido. E isso Portas não consente nem aceita.
          Teremos assim que aguardar pacientemente que o tempo vá passando indiferente às angustias lusitanas, deixando que se cozinhem além fronteiras os destinos deste belo mas triste país, enredado em problemas sucessivos e de cada vez mais dificil e complexa solução, mas habitado por gente simples e paciente, que tem sabido esperar de mãos postas pelo D. Sebastião que foi combater os mouros para África há 500 anos e que tarda em voltar.

                                       ALBINO ZEFERINO                                2/10/2014              

domingo, 28 de setembro de 2014

O INICIO DO NOVO CICLO


          Hoje é um dia importante. Não porque vá acontecer algo de importante que mude radicalmente a nossa triste forma de viver, mas porque será o principio de um periodo que determinará uma mudança no ciclo politico das nossas vidas. A luta fratricida que o PS vai hoje enfrentar nas urnas partidárias vai consagrar o novo líder que irá conduzir o nosso destino colectivo nos próximos anos. Seja Seguro, seja Costa, o vencedor, o ciclo liderado por Passos Coelho e pela sua gente terminará hoje.
          Respira-se um ar de fim de ciclo que não se coaduna com a dinâmica que hoje a governação exige e que mais cedo do que tarde as circunstancias politico-sociais vão revelar. A crise provocada pela precipitada reforma judicial, a confusão gerada pela desastrada colocação dos professores, a queda abrupta e inesperada do ultimo bastião do capitalismo portugues e finalmente a constatação de que Passos Coelho afinal já não era virgem, serão as razões objectivas que provocarão a queda antecipada deste esforçado governo que, queira-se ou não se queira, tudo fez para que Portugal não caisse de borco perante uma Europa gananciosa e voraz. Só que, apesar do seu genuino esforço, o governo de Passos não conseguiu terminar o ciclo com sucesso. É certo que este foi o governo que desde o 25 de Abril mais reformou, que foi o único governo que conseguiu reduzir o défice orçamental desde Salazar e aquele que demonstrou mais coragem em atacar de frente os elefantes brancos criados pelo PREC. Contudo, deixou-se enredar nas teias duma corrupção institucionalizada há anos e muito protagonizada pelas velhas raposas matreiras da politica portuguesa que desvirtuaram as genuinas intenções reformadoras de Passos e torpedearam as escolhas mais criteriosas para as necessárias reformas sociais e económicas. O resultado desta governação sem ser mau, não conseguiu passar do medíocre.
          O que nos espera, então, a partir de hoje? Eu diria que, uma vez consagrado Costa como o próximo salvador da Pátria, os portugueses não descansarão enquanto o homem não lhes dê o que prometeu, ou seja, mais prosperidade e menos sacrificios. Exigirão, nem que seja com manifestações "espontâneas" diárias, que o governo de Passos dê lugar o mais depressa possivel ao novo salvador da Pátria, eivados do sebastianismo que sempre moveu este povo de crédulos e de ingénuos úteis.
          Mas será que Costa (ou outro qualquer) conseguirá devolver aos portugueses a independência de espírito e de movimentos a que 40 anos de abrilismo os habituaram? Sinceramente não creio. Com a Banca entregue aos espanhois e as decisões importantes às instituições comunitárias em Bruxelas, o que restará a Costa fazer? Tapar os buracos nas ruas, organizar a recolha dos lixos, montar espectáculos populares. Mas não é isso o que ele faz há anos?

                                   ALBINO ZEFERINO                    28/09/2014

terça-feira, 16 de setembro de 2014

O FIM DO CAMINHO


          Com a inesperada demissão da recentemente empossada nova administração do BES, chefiada por um crâneo que afinal não é crâneo nenhum, nem sequer para fazer a liquidação dum banco falido, aproximamo-nos perigosamente do precipicio que constitui a entrega total à estranja do sistema bancário nacional.
          Só angolanos e espanhois se interessam verdadeiramente por aquilo que se passa neste cantinho à beira-mar plantado (como dizia o poeta) embora por razões distintas. Aos espanhois interessa controlar Portugal (e quem controla o dinheiro dos outros controla os outros) por uma questão prática que radica naquilo que prosaicamente se chama o mercado ibérico. Os angolanos querem controlar Portugal, pois assim se tornam eles próprios portugueses, que é como quem diz europeus, membros da UE, com todas as vantagens que isso traz e sem os inconvenientes que continuarão a sobrar para nós (crise, austeridade, reformas, etc.), os verdadeiros, os legitimos portugueses, cidadãos europeus. Diria mesmo que, se não são duas vinganças históricas, assim parecem.
          Ora esse interesse no controle da banca portuguesa reflete-se no interesse, quer do BPI (maioritariamente angolano) quer do Santander (totalmente espanhol), em ficar com os despojos do que outrora era o ultimo reduto da soberania economico-financeira deste país de grandezas passadas e de penas presentes. Provavelmente o BES acabará dividido por estes dois bancos estrangeiros, confirmando a politica salomónica que tem caracterizado este governo liquidatário.
          Dir-se-á que a partir de agora deixaremos de decidir por nós próprios as nossas vidas. Não seria já um pouco assim? Deixará de ser encapotadamente para passar a ser às claras e com maior vexame para nós. Mas não foi assim durante os 80 anos em que os espanhois por cá mandaram? E nós não pusemos e dispusemos dos angolanos durante séculos? Agora vem o refluxo. Ainda podemos fingir que mandamos em Portugal através da UE, mas isso é outra história. Habituemo-nos a aceitar para nosso bem e dos nossos filhos aquilo que outros decidirão por nós. Talvez assim nos possamos endireitar e quiçá um dia possamos (nós já não, mas os nossos descendentes) voltar a gozar duma independência perdida por décadas de arbitrariedades e de má conduta governativa. Haverá motivo para fazer alguma estátua a qualquer dos nossos governantes da actualidade?

                                            ALBINO ZEFERINO                                      16/9/2014

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

O REFERENDO ESCOCÊS


          Muito se tem falado das consequências funestas para a UE do resultado do referendo que os escoceses vão realizar no próximo dia 28. O que acontecerá à Europa depauperada pela crise que teima em persistir agora que já se notam efeitos dela na própria Alemanha, é o que os portugas receiam no caso do referendo escocês ser positivo. Eu diria que, mesmo que o desfecho seja esse, o que eu sinceramente não creio ( à Escócia não interessa desligar-se do Reino Unido, pois perde os financiamentos que o Whitehall lhe manda, agora que as receitas do petróleo estão em queda) nada de extraordinariamente preverso acontecerá à UE.
         A UE é uma união de países (eu diria de povos organizados em países) com o objectivo de fomentar o desenvolvimento economico e social dos cidadãos europeus enquanto tais, através da adopção de procedimentos comuns (ou até de politicas comuns) prosseguidos pelos governos desses países. A existência de Estados soberanos no seio da UE é uma circunstância meramente formal ou instrumental que diz respeito aos próprios Estados que dela fazem parte. Se determinado Estado se desmembra noutros Estados, ou se dois ou mais Estados decidem unir-se soberanamente entre si constituindo um mesmo Estado, é negócio que não interfere directamente no sistema da UE. É claro que a UE teria que adaptar-se às modificações institucionais que se verificassem no seu seio (renomeação de comissários, adaptação de estruturas em função da nova fisionomia comunitária, reafectação das verbas concedidas a título de subsidios, etc., etc.) mas tudo sem afectar a essencia dos tratados constitutivos da União. Nada disto afectaria o funcionamento da UE como organização supranacional destinada a prosseguir o seu caminho no sentido do desenvolvimento dos seus povos (sejam eles quais e quantos forem).
          No caso da Escócia se tornar independente (como o foi durante séculos), o Reino Unido ficaria mais fraco e a libra estrelina deixaria de circular livremente na nova Escócia. Modificações substanciais ocorreriam no Reino Unido, isso sim, mas apenas afectando o próprio R.U. (na nacionalidade dos seus cidadãos, nos procedimentos juridicos, económicos e sociais britânicos e até na sua idiossincracia), mas nada disto afectaria substancialmente o normal funcionamento da U.E. nem seria necessariamente negativo sob o ponto de vista da politica comunitária.
          Mal fosse declarada a independência, a Escócia seria admitida como novo membro da U.E., eventualmente adoptando o euro e passando a fazer parte do eurogrupo, e nomeando os seus representantes nos órgãos comunitários, à custa naturalmente do Reino Unido (que veria diminuida a sua influência nos órgãos da U.E. na medida da quota preenchida pela Escócia independente). Como se vê, deste exercicio resultaria uma diminuição do poder britânico na U.E. à custa da divisão do poder hoje detido pela Grã-Bretanha.
          Não creio, assim, que nada de desastroso pudesse acontecer para a integração europeia, caso a Escócia se tornasse independente do R.U. no próximo dia 28. Bem pelo contrário. Com o enfraquecimento dum Estado maioritariamente eurocéptico, a U.E. enfrentaria menos obstáculos do que hoje enfrenta na prossecução das politicas integracionistas necessárias para atingir os seus objectivos comuns.
         O mesmo se poderá dizer de outras manifestações autonómicas latentes, como por exemplo, na Catalunha, na Ucrânia (que não sendo ainda membro da U.E., para lá caminha) ou nos Balcãs (cujos países, mais tarde ou mais cedo, se unirão à U.E.), pois a União europeia, baseando-se num processo unificador global, não se preocupa com as opções étnicas ou culturais dos vários povos que a constituem, antes fomentando uma integração politica e economica supranacional, deixando aos seus povos inteira liberdade na escolha dos diversos modos de vida a que a história de cada um deles os habituou, assentes nas multiplas culturas de cada um e na escolha individual e democrática dos seus respectivos representantes locais, regionais, nacionais e comunitários.

                                           ALBONO ZEFERINO                                15/9/2014
         

domingo, 7 de setembro de 2014

O REGRESSO DO REGABOFE


          As últimas declarações do presidente do banco Central europeu cairam como um maná do céu sobre os pobres espíritos levianos dos perdulários lusitanos, que julgaram tratar-se do tal milagre de Fátima que sempre os protege de todos os males do mundo e que muitos aguardam com ansiedade bacoca. Pensa esta gente que, a partir de agora, voltarão os bons tempos do Sócrates, onde não havia restrições quanto aos gastos nem austeridades para ninguem.  Desenganem-se porém esses pobres de espírito que milagres não existem, nem protectores contra os males do mundo tambem não.
          O que realmente procupa Draghi e os seus europeistas é a saude do euro, que tem estado sob fogo cerrado, quer de americanos, quer de asiáticos, que aplaudem de pé as vicissitudes que a ausencia de politicas comuns europeias têm provocado nas economias dos seus membros enquanto países soberanos, ou seja, cada um faz o que quer, quando quer e como quer. Ora é esta a circunstancia que proporciona as crises que se propagam de país para país. Enquanto os países europeus não se convencerem de que só unidos (ou seja, obedecendo às mesmas regras ao mesmo tempo) terão capacidade para enfrentar os desafios da globalização, a Europa não sairá da crise nem se fortalecerá. Todos estão de acordo que é com o crescimento económico que se combate o flagelo do desemprego e da exclusão social. O que ainda não interiorizaram é que, sem sacrificios, isto não é possivel. Em todo o lado se vêm greves e reivindicações sectorias contra as medidas de austeridade que são indispensáveis para pôr a máquina europeia em velocidade de cruzeiro. Sem uma consciencialização colectiva e profunda deste fenómeno nada se poderá fazer, nem em Portugal, nem nos outros países europeus mais atrasados.
          Foi esta a razão pela qual Draghi resolveu dar um empurrão valente (como nunca ninguem ousara) ao euro, para lançar definitivamente a união bancária europeia que será o esteio dum aprofundamento integrador europeu. O anuncio de que o BCE irá passar a comprar divida publica dos Estados mais carenciados, não significa mais do que um maior controle das contas dos bancos e portanto das economias nacionais. A austeridade terá que continuar por muitos e bons anos até que todos os países europeus marchem ao mesmo ritmo e com a mesma passada. De contrário a UE não faz sentido, nem é util para ninguem.
          Tanto faz quem esteja no poder. Alguem tem que lá estar. Mas quanto menos poder tiver para fazer asneiras melhor. Quanto mais soberania for transferida para as entidades europeias (onde os nossos devem ter cada vez mais capacidade de intervenção - viva Barroso, viva Constâncio) melhor para o nosso desenvolvimento. Enquanto não nos virmos livres dos caquéticos juizes que condicionam e limitam o nosso desenvolvimento com  pretextos pueris e desenquadrados da realidade em que hoje vivemos, bem como deste desassossego popular de reivindicar eleições a toda a hora só porque não gostamos da cara do primeiro-ministro, nunca mais nos endireitamos nem deixaremos de estar cada vez mais na cauda da Europa. Hoje já ficamos contentes se superamos a Eslováquia ou a Roménia. Longe vai o tempo em que nos comparávamos com a Republica checa e com a Hungria. Qualquer dia só a Albânia ou a Bósnia-herzegovina estarão ao nosso nível.

                         ALBINO ZEFERINO                   7/9/ 2014

terça-feira, 29 de julho de 2014

O DESMEMBRAMENTO DE PORTUGAL


          Portugal está-se desmembrando. Depois duma intervenção internacional falhada da qual saimos com mais problemas do que quando entramos, os portugueses enfrentam hoje a sua fase final como país soberano e independente com a queda do ultimo bastião do Portugal capitalista.
          Quando da recuperação do banco que vilmente lhes tinha sido confiscado pelos abrileiros de 74, os Espirito Santo decidiram vingar-se da afronta que representou a nacionalização abrupta daquilo que representara a sua ascenção financeira e de classe como familia possidente do regime deposto em Abril de 74. Prometendo a si mesmos nunca mais deixar-se cair numa esparrela daquelas, os Ricardos, os Manueis, os Manuel Ricardos, os amigos deles e os amigos dos amigos, resolveram construir uma fortaleza inexpugnável à volta do banco devolvido, criando uma teia de interesses, tanto visiveis como ocultos, de tal forma interligados entre si que eles próprios escondiam uns dos outros as suas origens, proveniências e finalidades. Usando as mais sofisticadas engenharias financeiras, os Espíritos (como ficaram conhecidos no milieux) dedicaram todo o seu conhecimento e saber a "vingar-se" de tudo e de todos da afronta que para a familia tinha representado o 25/4. Transformando o BESCL (antiga casa de cambios) no BES (conglomerado financeiro com ramificações em todo o mundo) e depois no GES (onde reuniram a créme de la créme da socialite portuguesa), a familia dos Espiritos tinha interesses em todos os ramos do negócio em Portugal e fora dele.
          Só que a maldita crise deu cabo do plano. A exigencia do BCE no aprofundamento da regulamentação dos bancos europeus tendente à instalação da união bancária europeia trouxe à superficie não só as debilidades estruturais dum grupo financeiro com pés de barro (o mesmo dinheiro - que nem era deles - servia para fazer vários negócios em simultâneo - ou em cascata - para beneficio deles próprios - ou só de alguns deles) com contabilidades escondidas ou obscuras, mas tambem toda uma trama de negócios ocultos que - à sombra dum nome honrado feito com trabalho honesto há mais se 150 anos - envolveu milhares de pessoas de várias nacionalidades que acreditarm neles e no seu nome. A crise do BES arrastará consigo o país e o que resta da sua credibilidade e obrigará a novas intervenções estrangeiras e à perda progressiva da nossa capacidade de resolver democraticamente o nosso devir colectivo.
          Não se pense porem que o desmembramento de Portugal será apenas da responsabilidade duma só pessoa ou mesmo duma só familia. Tal como 1580 representou a abdicação colectiva da soberania perante a evidencia da posse iminente do poderoso Filipe e dos direitos dinásticos que detinha sobre Portugal, tambem a queda do império ES será o culminar dum processo degenerativo iniciado em 1974, com todas as vicissitudes conhecidas e desconhecidas ocorridas desde então, que encerrará um ciclo da nossa vida colectiva para dar inicio a outro, mais centrado na busca do bem-estar pessoal e menos no futuro dos amanhãs que cantam. Só ainda não sei como será.

                                     ALBINO ZEFERINO                                  29/7/2014

terça-feira, 22 de julho de 2014

EM NOME DO ESPIRITO SANTO


          Decididamente Portugal não consegue sair das crises onde se mete ou onde o metem. Crise após crise, lá vamos conseguindo sobreviver, porém cada vez mais pobres, mais limitados nas nossas opções de vida e mais angustiados. Após a crise do Sócraes, a que prosaicamente se chamou crise financeira (na tentativa de limitar os seus estragos aos bancos), passamos alegremente e sem dar por isso à crise social, com o aumento exponencial do desemprego resultante das tentativas (as mais das vezes bacocas) de Passos e do seu Portas de reduzir a despesa publica e finalmente à crise económica, da qual teimamos em não sair (quem mandou a estas alimárias prescindir dum programa de apoio europeu apenas para mostrar à estranja que Passos e Portas tinham conseguido dar a volta à pista, quando ainda nem sequer tinham chegado a meio do percurso?).
          Já começavamos a andar por nós próprios, embora tropegamente, quando, de repente, desaba o Espírito Santo sobre nós, qual tempestade imprevista e indesejada no rescaldo do temporal furioso que finalmente dava mostras de acalmar. Começou com uns chuviscos que molharam apenas os mais próximos, para se ir alargando progressivamente à generalidade do país, afectando praticamente toda a gente. Parece que os estragos do mau tempo não se limitam às regiões fora de portas, mas que, à medida que se vão fazendo balanços, se vai verificando que o temporal é grosso e que não irá deixar ninguem seco e imune à molha. E de outro modo não se esperaria que acontecesse. Já se viu delimitar os efeitos dum furacão antes que ele deixe de soprar, ou mesmo já depois disso, antes de se constatarem in loco os estragos causados pelo vendaval?
          O centro do desastre situa-se, não nos suburbios como nos querem fazer crer, mas no coração da cidade, onde trabalham para cima de 25 mil pessoas, a maioria das quais vai ficar constipada para a vida inteira, tal será a molha. Os furacões constituem um processo meteorológico uno e indivisivel, que, como uma lombriga, vão de um lado para o outro, arrasando tudo por onde passam sem dó nem piedade. Enquanto não termina a sua viagem destruidora, o furacão tende a concentrar a sua energia no seu miolo, no centro, onde roda com mais força e onde destroi com mais violencia. E o centro deste furacão Espirito Santo está em Lisboa, na capital do antigo império, agora já só ruinas de tempos gloriosos onde os nossos maiores proclamavam o seu orgulho na portugalidade e na civilização dos povos. Não creio ser possivel separar, como os nossos responsáveis vêm proclamando, as consequencias nefastas deste furacão inesperado, entre os estragos provocados na periferia e os que fatalmente se vão reflectir na sede. E que estragos serão esses? Em primeiro lugar aumentará o numero de desempregados a juntar à horda dos já existentes, que suga os poucos recursos que o Estado surripia aos que ainda vão tendo alguma coisita. Depois vai secar definitivamente as fontes de financiamento nacionais que muito dependiam da acção da central, base e inspiração de negociatas escuras e dubias provocadas pelo furacão. E finalmente vai ter um factor sistémico sobre toda a meteorologia nacional, que é débil e influenciável por alterações climáticas maiores e absorventes. Os americanos chamam a estes fenómenos as tempestades perfeitas, porque são arrasadoras e não deixam nada nem ninguem de pé.
          Aguardemos pacientemente (não temos outro remédio) o desfecho de mais esta tragédia que nos caiu em cima, e que os anjos e os santos que protegem esta terra de Nossa Senhora nos ajudem a ultrapassar mais esta provação. Em nome do Espirito Santo. Amén.

                                        ALBINO ZEFERINO                                   22/7/2014

 

sexta-feira, 18 de julho de 2014

SENT OF WAR


          O cheiro a guerra paira no ar poluído deste mundo de contradições e de conflitos. Por todo o lado se vêm e ouvem focos de discórdia entre os homens, sejam de natureza politica ou religiosa, social ou étnica, económica ou financeira. Discórdia entre os homens existe desde que há humanidade. Mas para combater esse flagelo inventou-se a concertação e a negociação. Sem estas, as discórdias entre os homens conduzem ao confronto e à guerra. Verifica-se porém, neste principio de século, que a intransigencia instalada nos espíritos dos homens vem dificultando cada vez mais o uso da moderação e da inteligencia para dirimir os conflitos que constantemente afluem nas relações entre as pessoas, as sociedades, as nações, as etnias ou mesmo os extractos sociais e económicos donde provêm os contendores.

          À constituição de grandes grupos de Estados em organizações internacionais destinadas à prossecução de interesses comuns, como a União europeia por exemplo, esteve subjacente a ideia de concertação ou negociação permanente entre os seus membros como forma de se evitarem as guerras e os confrontos entre as nações e as socieedades. Do mesmo modo, o nascimento da NATO, como organização militar internacional, no rescaldo das duas mais mortíferas e destruidoras guerras mundias do século passado, obedeceu a intenção semelhante. Hoje, porém, mais de 70 anos decorridos sobre esses trágicos acontecimentos, parece que as gerações que não os viveram se esqueceram (ou nunca aprenderam) que não há outra forma de dirimir pacificamente os conflitos entre os homens que não seja pela negociação e pela a concertação dos interesses em confronto.

          O eterno conflito no Médio-Oriente, as escaramuças territoriais na Ucrânia, o impassse na federalização indispensável da Europa, o aumento do fosso entre ricos e pobres no mundo, a "invasão" pacífica dos muçulmanos em França e nos países limitrofes, o desaire das primaveras árabes na África do Norte, o descalabro étnico e social no Iraque e na Síria, o alastramento do negócio da droga no México, a desilusão de Dilma no Brasil e a de Obama nos EUA, o crescimento economico assustador da China, o regresso aos métodos sovieticos de Putin na nova Russia, a transferencia dos grandes negócios mundiais para o eixo Hong-Kong, Singapura e Xangai, em detrimento de NovaYorque, Londres e Frankfurt, etc. etc. tudo isto são sinais de que as relações entre os homens e as nações experimentam hoje perigosa viragem prenunciadora de conflitos regionais passiveis de se transformarem num conflito mundial de incalculáveis consequencias.

          E nas grandes cidades europeias? Como vivem hoje as pessoas? Ao progresso científico indiscutivel verificado nestes ultimos anos desde a viragem do século, quer na informática, quer na medicina ou na robótica, quer no ambiente ou na energia, não correspondeu um acréscimo na qualidade de vida das pessoas. Pelo contrário, o que se nota é uma cada vez maior "guetização" das populações urbanas, que se agregam por classes (já não sociais no sentido vitoriano do termo, mas mais pelo nível de vida de que disfrutam) empurrando os chamados imigrantes (e equiparados) para os suburbios das grandes cidades, onde vivem pior do que os seus progentitores viviam no século passsado, no campo tratando das couves e das galinhas. Será que este equilibrio instável, que gera incompreensões e injustiças, acirrando invejas e vinganças recalcadas, não degenará num conflito de natureza social e economica, impulsionado pelos sucessivos escandalos financeiros que a comunicação social engrandece na sua ânsia de procurar audições, e poderá vir a ser o prenuncio do fim desta civilização que conhecemos e que está dando sinais de evidente derrocada? Queira Deus que não!

                              ALBINO ZEFERINO                                 18/7/2014

segunda-feira, 14 de julho de 2014

AS PREMONIÇÕES CAETANISTAS


          Do seu exilio doloroso, Marcello Caetano escreveu há anos: "Em poucas décadas estaremos reduzidos à indigência, ou seja, à caridade de outras nações, pelo que é ridiculo continuar a falar de independência nacional. Para uma nação que estava a caminho de se transformar numa Suiça, o golpe de Estado foi o principio do fim. Resta o sol, o turismo e o servilismo de bandeja, a pobreza crónica e a emigração em massa. Veremos alçados ao Poder analfabetos, meninos mimados, escroques de toda a espécie que conhecemos de longa data. A maioria não servia para criados de quarto e chegam a presidentes de Câmara, deputados, administradores, ministros e até presidentes da Republica."

          Marcello Caetano foi um ilustre professor de Direito, insigne mestre de muitos dos nossos herois da democracia, da esquerda à direita do espectro politico portugues, que, naturalmente, assumiu o lugar proeminente ocupado por Salazar 40 anos antes, quando este foi obrigado, por razões de saude, a demitir-se de chefe do Governo de Portugal. Na altura vivia-se numa "democracia orgânica", eufemismo salazarista que escondia uma ditadura de luva branca, apenas não tolerada por extremistas comunistas e proto-comunistas, perseguidos regularmente pela policia politica do regime.

         A chegada de Caetano ao poder efectivo (tinha sido antes colaborador próximo de Salazar tendo ocupado lugares da maior relevância politica) trouxe para o anquilosado regime, instalado 40 anos antes através do golpe militar de 28 de maio de 1926, uma certa frescura, prenunciadora duma abertura politica a que alguns chamaram a "primavera marcelista". Só que essa primavera cedo se foi pelo medo de Marcello em enfrentar a resistencia salazarista enfeudada por detrás do presidente da Republica que, de fantoche de Salazar, se tornou em simbolo do salazarismo, já sem o ditador. A esperança que a "evolução na continuidade" trouxera a alguns dos críticos do regime dissipava-se como um fogo fátuo aos olhos da maioria dos portugueses, desejosos duma evolução do regime no sentido duma negociação equilibrada para o fim da guerra em África e duma democratização à europeia do regime politico portugues. Desta timidez resultou aquilo que Marcello tão bem soube definir anos depois, já no exilio brasileiro, mas do que não pode deixar de ser considerado como primeiro responsável. A revoluçao dos cravos rebentou por incapacidade do governo marcelista em reformar Portugal no sentido duma modernidade que Salazar e os seus sucessores espirituais não conseguiram compreender e que, pelo contário, não aceitaram e se prontificaram a combater. Ganharam a Marcello, mas perderam com os abrileiros. Só que as consequencias dessa vitória estão a ser pagas hoje pela geração seguinte.

                       ALBINO ZEFERINO                                    14/7/2014